Pilantra

O Segundo Ato

O restaurante era exatamente o que se esperava de um estabelecimento frequentado pela a nata da elite jurídica: elegante, com uma decoração sóbria careta que remetia a Coreia Republicana, possuía músicos incríveis, uma visão de tirar o fôlego da cidade e, claro, homens de terno e paletó extremamente babacas.

O ponto alto da noite para Yoongi foi ver o plano de Taehyung ricochetear de volta na cara dele. Eles não podiam declinar do convite alegando que estavam casados, e também não podiam demonstrar desinteresse pelas atividade pós-escritório. Precisavam imergir na farsa do divórcio. Agora era difícil dizer qual dos dois estava odiando mais tudo aquilo.

Se fosse apostar, diria que houve um empate técnico. Ele também não estava exatamente soltando fogos de artificio pelos colegas que tinha a tiracolo. Alguns flertavam desinibidamente consigo, outros eram abertamente homofobicos.

E ele queria esmurrar todos, mas se conteve. Estava naquela arena selvagem há muitos anos, e já havia aprendido a digladiar com os leões.

—Então, como é trabalhar todo dia com o seu ex-marido, senhor Min? — Um dos estagiários perguntou, com um sorriso divertido.

Taehyung remoeu a vontade de chutá-lo por baixo da mesa e bebeu um gole do seu vinho. Precisou recitar mentalmente para si mesmo, diversas vezes, que o fim justificam os meios, mas a cada investida suicida dos demais funcionários no seu marido, ele vinha sentindo menos e menos confiança naquele plano para desmascarar o chefe abusivo. Estava começando a considerar o plano B: quebrar a cara de todo mundo, talvez até a de Yoongi, que estava claramente se divertindo com os olhares e sorrisinhos lançados na sua direção.

Que os céus o ajudassem. Ele não servia para um remake de Senhor & Senhor Kim, era um verdadeiro amador.

Ou ele era o amador? Taehyung entornou a taça em um só gole e respirando fundo, voltou a enchê-la, bebendo-a rapidamente e virando em um único gole antes de respirar fundo. Do outro lado da mesa, com um sorriso gengival irritantemente lindo e simpático demais, Yoongi ria e conversava com um dos estagiários cujo nome o Kim ainda não havia memorizado.

Ah, quem dera que ele tivesse um Death Note nas mãos...

Nesse exato momento, sentiu o celular vibrar dentro do bolso e o pegou rapidamente, o desbloqueando.

Princesinha dos Papais: Uma amiga da minha sala disse que vocês se divorciaram. É verdade?

Princesinha dos Papais: FOI POR MINHA CAUSA? EU JURO QUE VOU APRENDER A AMAR MATEMÁTICA

Princesinha Dos Papais: EU JURO QUE NÃO VOU MAIS BOLAR AULA AS QUINTAS-FEIRAS PARA IR JOGAR NO FLIPERAMA

Princesinha dos Papais: Eu vou ter que morar com os vovôs enquanto vocês não decidem sobre os fins de semana???? Eles estão tentando me obrigar a comer cenoura com gergelim!

Princesinha dos Papais: Me diz que não rolou traição, juro, não vou suportar. Eu vou raspar minha cabeça e fugir para a Coreia do Norte!

Taehyung: 1) Não faça provas contra si mesma. 2) Nós conversamos assim que chegarmos em casa. 3) Finja que comeu a cenoura com gergelim e quando não estiverem olhando, vá para o banheiro e cuspa na privada e dê descarga. 3) Nós nunca iriamos trair um ao outro. 4) Estamos em um jantar importante com os colegas da firma, por favor, não mande mais mensagens.

E em seguida ele bloqueou o celular, voltando a guarda-lo no bolso superior do paletó e voltando os seus olhos castanhos para Yoongi, que também estava lendo as mensagens no celular. Julgando pela forma com que ele crispou bem as sobrancelhas, o Kim apostava que ele estava revoltado com o lance da cenoura e segurou uma risada.

Yoongi queria estapeá-lo sempre que o via ensinando como burlar os alimentos saudáveis, mas em sua legítima defesa, Taehyung também não comia e não achava justo obrigar sua filha a comer aqueles vegetais e legumes horríveis. Os olhos escuros do civilista cruzaram-se com os seus e, com um sorriso sarcástico, Taehyung propôs um brinde ao marido que revirou os olhos. Ele claramente iria surtar por causa da cenoura mais tarde.

Entre um suspiro e outro, Yoongi pegou seu celular e digitou rapidamente uma resposta para a filha que com certeza deveria estar chorando descontroladamente com a remota possibilidade de acabar indo morar com os avós.

Yoongi: Se você entrar na onda do seu pai e cuspir os legumes e vegetais, pode sim acabar morando um tempinho com os seus avós. Curtiu?

Hyelin: PAPAI

Rindo, Yoongi enviou um emoji chorando de rir para ela e então a tranquilizou dizendo que era apenas uma brincadeirinha inofensiva. Por fim, ele bloqueou o celular novamente, sabendo que aquela discussão poderia durar a noite inteira. A filha, assim como ele, não desistia até vencer nos argumentos. Uma mini-advogada em potencial.

—Doutor Min? — O estagiário lhe chamou, tirando-o de seus devaneios e ele pigarreou, desculpando-se em voz baixa.

Após beber mais um gole do vinho, respondeu.

—Trabalhar com Taehyung é muito fácil. Deve ser difícil para ele trabalhar comigo e resistir à tentação, no entanto.

A mesa irrompeu em fortes gargalhadas enquanto, do outro lado da mesa, o marido estreitava os olhos na sua direção e meneava a cabeça indignadamente. Em partes porque era verdade, e em outras, porque ele também tinha seu orgulho irretocável. Mas não disse nada para contra-atacar, estava mais concentrado em outra questão.

—Na verdade, Doutor Min, eu estava pensando na nossa filha. Lembra-se dela, certo? — Ele o encarou raivosamente e Yoongi deixou de rir imediatamente, devolvendo a encarada. — Nós havíamos combinado que você ficaria com ela hoje à noite.

—Você deve estar com amnesia, querido, já que foi você quem concordou de ficar com ela hoje à noite! — Rebateu o Min, elevando a voz nervosamente. Ele empurrou a cadeira para trás, completamente puto. — A menos que você tenha esquecido ela, de novo, na casa dos seus pais.

—Eu pensei que você fosse busca-la! — Taehyung disparou alterado, também se levantando da cadeira e pegando a sua carteira. Yoongi o encarou raivosamente e então deu as costas para ele, marchando para fora do restaurante, sendo seguido rapidamente pelo outro Kim. — Yoongi, eu estou falando com você, volta aqui agora!

—Fale com as paredes, eu estou indo buscar a minha filha!

—Nossa filha e você não vai me fazer parecer um imbecil na frente de todas essas pessoas, Min Yoongi, volta aqui agora! — Gritou escandalosamente.

Yoongi continuou andando a passos rápidos, o ignorando por completo, até avistar o elevador. Ele adentrou o mesmo e Taehyung adentrou logo em seguida, apertando o botão. Já dentro do elevador, Tae bocejou e então encostou-se na parede atras de si.

—Será que eles acreditaram?

—É claro que acreditaram. Você é um excelente ator. Deveria ter investido no curso de artes cênicas. — Rebateu Yoon, que também bocejou e se espreguiçou. — E pare de incentivar a garota a cuspir os legumes e vegetais!

Rindo, Taehyung concordou, fechando brevemente os seus olhos. Ele estava fisicamente e mentalmente cansado. Já não tinha mais o mesmo pique de quando era solteiro, e piorava mais ainda na presença daqueles caras arrogantes e detestáveis com quem trabalhava. Ele estalou o pescoço e voltou a bocejar, fechando os olhos por um momento. Felizmente tinham a desculpa da Hyelin para fugirem mais cedo daquele jantar. Uma pena, no entanto, que o plano para desmascarar o seu chefe teria de ser novamente adiado, já que ele ficara estranhamente reservado naquela noite. Taehyung estava ansioso para enviar aquele idiota diretamente para atrás das grades e esperar era sufocantemente angustiante.