CAPÍTULO 1 - CONSOLO

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POV GABI

O apartamento 408 estava o puro suco da depressão depois da derrota contra os Estados Unidos. Thaisa estava inconsolável e Carol não tinha falado nada desde que voltamos pra vila olímpica. Eu estava segurando as pontas das minhas emoções, mas não sei até quando conseguiria fazer isso. Estava difícil dormir, sentir fome ou vontade de fazer qualquer coisa.

Fiz o movimento de pegar meu celular, mas desisti no meio do caminho ao perceber que aquele seria o pior momento para abrir qualquer rede social. O baque já foi grande, não estava preparada para a enxurrada de críticas que eu sei que estavam prontas para mim e para o time.

Decidi tomar um banho e chamar as meninas para conversarmos.

Depois que conversamos, liberamos tudo o que estava engasgado e voltamos mais leves para o quarto.

"Gabriela, você não vai chorar não? Te conheço e sei que deve estar se culpando" Carolana me conhece bem.

"Não tá na hora ainda". respondi.

Quando estava todo mundo dormindo e as chances de me verem saindo de fininho eram mínimas, fugi pro meu esconderijo na vila. Ninguém sabia dele. Pelo menos, não até agora porque acabei de avistar alguém sentada naquele banquinho no escurinho. Me aproximei porque queria olhar bem nos olhos de quem não teve piedade de uma sofredora olímpica depois de perder uma vaga na final.

Quando eu estava chegando bem perto, ela virou e me deu o sorriso mais doce que eu já vi na vida. Fiquei meio que paralisada.

"Eu sabia que você viria aqui hoje".

"Re - Rebeca"- a gagueira tomou conta e eu nem sou gaga - "o que você tá fazendo aqui?"

" Eu te vi algumas vezes se escondendo aqui. Achei que especialmente hoje você viria. Resolvi aparecer pra te dar um abraço. Não deve ser fácil ser capitã nesses momentos".

Ela abriu os braços e me deu aquele sorriso de novo, me chamando para um abraço. Alguém consegue negar alguma coisa a ela?

O abraço quente, o aconchego, a sensação de lar. Que negócio difícil de descrever. Nuuu... como eu iria sair dali?

O abraço foi longo o suficiente para que eu finalmente conseguisse chorar. Tentei, desajeitadamente, enxugar algumas lágrimas e senti o toque quente dela no meu rosto.

Não consegui evitar, estava encarando a boca dela enquanto ela falava algo que agora eu nem lembro o que foi. Só percebi que estava demais quando ela parou, me olhou e perguntou "o que foi?"

Era impressão minha ou ela estava tremendo quando perguntou isso?

POV REBECA

Opa, opa, opa. O que tá rolando aqui? Eu só vim dar um apoio pra ela e vou sair apaixonada? que isso? Sou hétero, meu amor.

A pergunta, na verdade, é: por que eu senti necessidade de vir consolar ela? Nossos contatos anteriores sempre foram breves, algumas interações em redes sociais quando uma de nós conquistava algo. Sempre tive muito carinho e admiração por ela. Não tinha percebido que era algo tão forte até ver as reações dela após o jogo. Era nítido que a culpa estava consumindo ela e me preocupei demais com isso.

Por que diabos eu tô tremendo vendo ela olhar fixamente para os meus lábios?

REBECA DO CÉU - gritei pra mim mesma, dentro da minha própria cabeça.

Vamos fingir normalidade.

"Gabriela, por que você tá me olhando assim? Tô achando que tu tá querendo me beijar."

Esqueci que não sou muito normal. Não tenho muitas papas na língua e, pra completar, meu cérebro não raciocinou rápido o suficiente.

"Por que talvez eu queira mesmo" - Eu me tremi todinha. A tensão podia ser cortada até com uma faca de serra naquele momento.

Eu nunca beijei uma mulher em toda a minha vida. Tô meio que em pânico agora.

"Eu não sei fazer isso não"- respondi rapidamente e fiz uma careta.

"Não sabe beijar?" ela riu e eu acabei rindo junto. "Desculpe, Rebeca. Não sei onde eu estava com a cabeça. Acho que você é hétero e não quero ser desrespeitosa".

Ela se afastou um pouco e confesso que fiquei incomodada com isso. Sentei no banco e bati no canto ao meu lado pra ela sentar junto. Ainda estava tentando acalmar minha respiração. Estou muito curiosa com o que acabou de acontecer e queria que ela soubesse disso.

"Eu acabei de tremer todinha na base. Seria isso normal pra uma hétero?" Virei meu corpo para ficar de frente pra ela.

"Nuss... quem tremeu agora fui eu" Ela virou o corpo pra ficar de frente pra mim.

Eu conseguia ouvir a respiração pesada dela e a expectativa do que eu iria fazer em seguida.

"E-e-e u acho que é de frio. Tá frio aqui né?" falei desajeitada mesmo estando morrendo de calor.

"Não, na verdade não tá não."- Ela me deu um sorriso safado. Dizem que mineiro tem um jeitinho conquistador, né? Tô confirmando isso agora. "Mas já que você tá com frio, posso te ajudar a se esquentar" mais uma vez aquele sorrisinho de canto de boca.

CANALHA - pensei

"Dizem que eu flerto naturalmente e não tenho autocontrole quando falo com mulher bonita. Vai me perdoando" - agora a canalha me deu uma piscadinha

Sem eu esperar, ela, do tamanho de uma electrolux duplex inverter, me abraçou de um jeito que quem visse de longe ia pensar que era uma pessoa só. Me aconcheguei, encaixando minha cabeça no seu pescoço e escutei ela dizer "Obrigada."

Quando eu assisti o jogo da semifinal, eu só conseguia olhar pra Gabriela, ver o quanto ela tinha ficado mal com a derrota fez doer em mim. Eu não sei explicar. Eu sempre acompanhava ela com o olhar. Até o dia de hoje, eu achei que era somente pela admiração enorme que eu tenho por ela. Achei que era algo de atleta pra atleta. Achei que a vontade de abraçar e ser um apoio pra ela nesse momento tão difícil era somente a vontade de criar uma amizade sincera com ela.

Agora eu percebi que não. Tudo isso era porque ela é a Gabriela. A pessoa Gabriela. A mulher Gabriela.

Levantei lentamente o meu rosto para encará-la ao mesmo tempo em que ela abaixou a cabeça para me olhar. Estávamos tão próximas que eu conseguia sentir a respiração dela em mim.

Eu sabia o que estava prestes a acontecer. Eu estava pronta pra isso? O que eu faço?   


Nosso Primeiro Beijo 🩵Onde histórias criam vida. Descubra agora