dois

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— Ai, que chatice isso de viajar pra fora quando eu queria mesmo era ficar em Nova Primavera com vocês — Petra resmungou.
Estavam sentados na arquibancada durante a aula de educação física, que era mais treino do time de futebol do que a aula propriamente dita.
Os terceiros anos eram divididos em várias turmas. Petra e Daniel eram da mesma turma, mas não da turma de Kelvin. Então, a aula de educação física era realmente como o grande encontro dos amigos, mesmo que tenham se visto no início da manhã e fossem se ver depois da aula.
Kelvin desviou o olhar do campo e encarou Petra, que estava de olhos fechados, com a cabeça jogada para trás, aproveitando o sol matinal que batia neles.
— Nossa, é realmente muito triste passar as férias fora do Brasil. Uma pena mesmo, Petra — Kelvin fingiu lamentar.
— Justiça por Petra — Berenice juntou as mãos como se estivesse fazendo uma oração.
— Pobre menina rica — Nando completou, fazendo um carinho no ombro de Petra — Tira essa faca do pescoço, Petra!
O grupinho começou a rir e Petra demorou a pegar um ar pra falar.
— Como vocês são bobos, né? A parte ruim não é ir pra Itália, é ficar sem vocês, mas agora tô reconsiderando
— Não adianta, agora tá dito — Berenice negou.
— Não, gente, é sério mesmo. A única pessoa da minha idade que vai ter lá é o Daniel e, Deus me perdoe, mas tô de saco cheio dele. O cara me persegue desde a barriga da minha mãe!
— Eu não reclamaria — Kelvin murmurou bem baixinho, mas alto o suficiente para Petra escutar.
— Você nem disfarça mais — Petra sussurra para Kelvin enquanto Berenice e Nando brigam por uma coisa qualquer.
— Hum?
— Você é muito afim do meu irmão, né?
— Quem disse?
— Quem disse? Ninguém disse, Kelvin Santana, tá muito na sua cara
— Não, não — ele negou, mas as bochechas avermelhadas o entregaram, assim como o sorrisinho.
— Tá, sim, você tá afim do meu irmão! — Petra falou animada, empurrando o ombro de Kelvin com seu próprio ombro.
— Para, não é nada de mais
— Aham, nada de mais, sei bem — Petra deu um sorrisinho, olhando Kelvin de soslaio — Eu ia curtir muito, sabia?
— O quê?
— Que você fosse meu cunhado
— Que nada — Kelvin tentou não explodir e virar confetes bem ali.
Desviou o olhar para o campo, seguindo Daniel correndo pelo campo.
— É sério mesmo. Imagina ter meu amigo em casa direto, nos eventos de família, nossas famílias comemorando o Natal juntas... Ai, que sonho!
— Nossa, você é pior que eu — Kelvin deu risada da imaginação da moça.
— Se for pra imaginar, que sejam coisas legais
— E definitivamente impossíveis de acontecer, né? Seu pai jamais ia aceitar isso
— Meu pai é um careta — Petra franziu o nariz — Mas quem manda nele é a minha mãe, então tá fácil
— Tá, sim, tá bem fácil, Petra. Só falta acontecer… hum, deixa eu ver aqui na minha lista: tudo!
Petra deu risada.
— Se você não tentar, nunca vai saber
— E arriscar levar um fora do seu irmão? Não, valeu. Além disso, eu frequento demais a sua casa, que também é a casa dele
— Você é muito negativo
— Você que é positiva demais, passa da normalidade
— A vida tá aí pra gente correr riscos, Kelvin
— Esse risco é realmente algo que não quero correr sem nenhuma garantia de que vai valer a pena
Petra pensou na fala de Kelvin por alguns segundos.
— Pior que você tá meio certo
— Eu tô completamente certo. Eu jamais falaria pro seu irmão que gosto dele sem que eu soubesse se: 1- ele gosta de meninos e 2- ele gosta de mim — Kelvin enumerou nos dedos.
— Queria poder descobrir isso
— Como assim você não sabe por meio da telepatia de gêmeos?
— Eu mandei o Daniel desligar o dele porque ele pensa demais — Petra brincou, fazendo Kelvin rir
— Qual o assunto? — Berenice perguntou.
— Garotos gatos dos terceiros — Petra respondeu rapidamente, deixando Kelvin aliviado por não ser exposto por gostar de Daniel.
— Ah, eu tenho uma lista gigante — Berenice sorriu.
— Deus me livre — Nando revirou os olhos, negando com a cabeça.
— E quem tá no topo da sua lista? — Kelvin perguntou.
— Com certeza, o Ramiro
— Da sua lista e de um monte de gente na escola, né? — Petra ergueu as sobrancelhas ao questionar.
— Fazer o quê? O cara é simplesmente o maior gatinho — Berenice se defendeu e os três olharam para Ramiro no campo, que levantava a barra da camisa para limpar o rosto — Caraca… — Berenice falou devagar, babando no jogador.
Kelvin elogiou mentalmente o rapaz, pois seus pensamentos já tinham um dono, mas não podia negar que Ramiro era realmente muito atraente.
E era um cara legal também. Era o melhor jogador do time e tinha direto um monte de gente lhe bajulando, mas sempre se mostrou humilde e gentil com as pessoas.
Ramiro e Kelvin haviam trocado poucas palavras nos dias de jogos, mas nunca passaram disso.
— E você, Petra? — Berenice perguntou.
— Ah, o Ramiro é bonitinho, mas não acho que ele mereça ser o primeiro na minha lista só por isso. Na verdade, eu nem tenho uma lista
— Não tem ninguém na escola que chame sua atenção? — Berenice franziu a testa.
— Claro que tem, mas é só isso mesmo. Ninguém que desperte em mim um interesse genuíno
— Você é romântica — Kelvin comentou.
— Ah, eu sou — Petra concordou, orgulhosa.
— E você, Kelvin? — Nando perguntou, imitando a irmã.
Petra arregalou os olhos na direção do ruivo e o som do sinal, que indicava o fim da aula, interrompeu a conversa.
— Salvo pelo gongo — Berenice riu.
Os quatro se levantaram, recolhendo seus celulares e garrafas de água para voltarem às suas respectivas salas de aula.

Até o verão terminarOnde histórias criam vida. Descubra agora