— Vamos começar pelo início, pode ser? — O senhor agente que está à minha frente diz, calmo e sem pressa, enquanto se senta com dois cafés: um para mim, outro para si.
— O que fazia antes de tudo acontecer?
— Eu estava em digressão com o meu grupo de músicos; sou cantor — começo, dando um gole no café quente que me aquece por dentro.
— Tudo começou quando recebi uma simples carta de uma fã. Parecia inocente, como todas as milhares que recebo por dia.
— De quem?
Olho para o senhor Parker, sem medos e sem rodeios. — Da minha stalker... da sua filha.
O seu olhar permaneceu o mesmo: calmo e sem sentimentos. Claro que ele já sabia que a sua filha era a minha stalker, mas será que sabia de tudo o que se passou? E do que continua a acontecer naquela mansão?
— O senhor sabia? — pergunto, mantendo o meu olhar fixo no dele, à espera de uma reação, uma mudança, qualquer sinal de que esta conversa o afetava.
Ele pousa a chávena de café na mesa, sem desviar os olhos dos meus.
— Sim, sabia. Mas não tudo.
— Então, o que sabia exatamente? — pergunto, agora mais interessado no que ele tem a dizer do que no meu próprio café.
— Sabia que a minha filha estava obcecada contigo. Mas não tinha ideia de até onde isso iria. Pensei que fosse apenas uma fase, uma admiração exagerada. — A sua voz permanece calma, quase fria, como se estivesse a falar de algo trivial.
— E quando percebeu que não era apenas uma fase? — pergunto, tentando manter a minha voz estável, mas sentindo o peso das suas palavras.
— Quando as cartas começaram a chegar com mais frequência. Quando ela começou a desaparecer por dias, e quando vi o seu nome escrito por toda a parte no quarto dela. — Ele faz uma pausa, como se estivesse a ponderar as suas próximas palavras. — A minha esposa queria que procurássemos ajuda, mas pensei conseguirmos lidar com isso sozinhos.
— E agora? Acha que ainda consegue lidar com isso sozinho? — A minha pergunta sai mais agressiva do que eu pretendia, mas já não consigo disfarçar a tensão que cresce dentro de mim.
O senhor Parker respira fundo e, pela primeira vez, vejo uma pequena mudança na sua expressão. Uma sombra de incerteza atravessa-lhe o rosto.
— Já não sei.
O silêncio instala-se entre nós, pesado e denso, enquanto cada um de nós reflete sobre o que foi dito e, talvez mais importante, sobre o que ainda não foi dito.
23 de Junho de 2023( 1 ano atrás)
O pior de andar em digressão pela Europa é que não consigo descansar como deve ser. Chego a uma cidade, ensaio, faço o concerto, encontro-me com os meus fãs, tiro fotos, falo com eles e vou embora. A rotina é de loucos, mas trocaria esta vida por outra? Não.
Há algo de viciante na energia das multidões, na adrenalina de estar em palco. Cada cidade tem a sua própria vibração, e é fascinante sentir a forma como a música conecta pessoas tão diferentes. Contudo, nem tudo são rosas. Às vezes, sinto que estou apenas a passar pelos lugares, sem realmente os viver. É como se estivesse a ver tudo através de uma janela, sem poder abrir a porta e entrar.
Mas, no final, é o preço que se paga por fazer o que amo. A música sempre foi o meu refúgio, a minha paixão, e estar em digressão é uma extensão disso. Sim, há momentos de cansaço, de solidão até, mas basta subir ao palco e ver os rostos sorridentes e os olhos brilhantes do público para tudo valer a pena.
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Não me procures
Mystery / ThrillerAlexandre, um jovem cantor de 25 anos, adora sua vida na estrada. Ele vive para as turnês, os amigos, a música, as viagens, e claro, o amor das fãs. Tudo parece perfeito, até que uma stalker o sequestra e o leva para uma antiga mansão em um local re...