A vida da mulher guerreia

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   A bolsa presa ao corpo
   Um canivete no bolso
   Fiz até um acordo
   Que eu mataria qualquer moço
   Que em mim tocasse sem a minha permissão
   Que se aproximasse e fizesse coisas mesmo eu dizendo "não"

   O medo é real
   O mundo é tão mau
   Quando se é uma mulher
   Viver tranquila pode ser letal

   Não da pra na rua sair
   Sem sequer pros lados olhar
   É que alguns certos homens podem até nos matar

   Não são todos
   Eu repito e repito que não são todos
   Mas como eu posso saber quem vai me tocar de novo?
   Pelo tranporte público, um dia de parada cardíaca eu morro
   Porque quando se é mulher qualquer olhar pode ser escroto

   Chego no trabalho e é aquela sensação
   Que minha presença é forte mas por confiança não é não
   Sento na minha mesa
   Calada e fico quieta
   Até converso com alguns
   Só que o chefe só fala merda

   Com um aumento de salário e todos dizem
   Que pro patrão eu dei e por isso, a mais, ganhei
   Ninguém se importa com o quanto eu me esforcei
   Eles só arregaçam as mangas e criticam sem pudor
   Até tentei ignorar as piadinhas
   No entanto, é tudo tão desestabilizador

   Mais tarde, na faculdade então
   As coisas não são diferentes
   O mundo é babaca pra cacete
   O meu futuro está em minhas mãos
   Porém ele escorrega quando alguém diz merda
   E em mim nasce a vontade de viver em completa solidão

   O professor me lança olhares
   E ele é casado, que maldito
   O cara ao meu lado fala comigo
   Se inclinicando para na minha perna tocar
   Agora eu quero é pro abrigo, esse cachorro mandar

   Nem obra de arte num museu é tão tocada
   Porque é estritamente proibido, você tem que se manter afastada
   Se um cara vier e te perguntar "tem namorado?"
   Diga que "sim, olha, ele tá vindo lá do outro lado"
   Pela rua deserta, incoberta e escura
   Eu volto para casa com a minha armadura

   Spray de pimenta na bolsa
   A bolsa presa ao corpo
   O corpo retrai quando eu passo perto de um moço
   Desculpe se você nunca maltrataria uma mulher
   É que eu não tenho bola de cristal pra saber se mau você é

   A moto desacelera
   Meu coração acerela
   Vou ser roubada, assassinada ou sequestrada por uma fera?
   Ela passou reto e eu segui o meu caminho
   Mas só consigo respirar ao chegar no meu destino

   No banho o peito dói
   As palavras nojentas reverberam em minha mente
   Ao ligar a tv, o que vejo me destrói
   No jornal está passando sobre uma mulher que morreu cruelmente
   E pro 190 ela tentou ligar
   Mas o cara levantou a arma e começou a atirar

   Desligo a televisão
   Respirando bem fundo
   Agradeço ao meu Deus por a vítima não ter sido eu
   Vou dormir me sentindo incapaz
   Sabendo que amanhã tem mais
   Com essa sociedade insana
   Acho que nunca vou viver em paz

   Quer saber como é meu próximo dia?
   Arraste a tela para cima
   Tudo se repete de novo
   Essa é a vida de uma mulher guerreira, meu povo

- Ciclo infinito num mundo perigoso
31 de março de 2024, 11:44

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