Capítulo 3

2 0 0
                                        


Por algum motivo imaginou que a delegação seria pomposa e que seus membros estariam vestidos como lordes europeus medievais. Eram elegantes de fato, mas elegantes como qualquer humano que trabalhasse em um escritório de classe média alta, como se um portal da Faria Lima tivesse se aberto, nada fora do comum, nada que tivesse saído de contos de terror.

Chegaram em alguns grupos, não passavam dos 60. Pelo que viu, nenhum humano, apenas vampiros puros, todos, sem exceção, com olhos avermelhados. Aprendeu com o tempo que a cor característica poderia significar inúmeras coisas, mas em maior parte era sede. O que fazia muito sentido.

Luís havia lhe explicado algumas regras básicas que tinha estabelecido para a presença deles. Primeira coisa, sem caça humana. Zero e isso era inegociável. Dado que o território de domínio da Fortaleza se estendia quase por São Paulo inteira, provavelmente faziam alguns dias que não se alimentavam.

O salão usado para a recepção era ovalado, com pé direito alto e aberturas para as estrelas. O inverno seco de São Paulo havia presenteado com uma noite sem igual. Luís fazia sala de forma natural, conversando carismático. Diana segurava junto a si uma taça de vinho, os olhos atentos observavam os novos convidados.

Na Fortaleza era normal a convivência entre humanos e vampiros. Sabia que não tinha sido assim desde o começo, mas as décadas tinham atingido a harmonia. Naquele salão as coisas não poderiam parecer mais diferentes. Sentia-se jogada em outra época. Era palpável o desprezo dos vampiros. Tinham se certificado de não deixarem humanos estarem presentes no primeiro encontro, mas os olhares não passavam batido.

O gole desceu suave na garganta inquieta. Os olhos captavam tudo, tentando observar o maior número de informações possíveis, mas nada parecia fora do lugar, apenas viajantes cansados e com fome, era isso que pareciam. Viajantes, cansados, com fome e esnobes. Quase todos pelo menos.

Endireitou a coluna quando viu Luís se aproximar com um olhar diferente. Em seu encalço seguia três vampiros, dois homens altos com cabelos curtos, poderiam até mesmo ser gêmeos em aparência, eram pálidos como a lua, sobrancelhas grossas e não pareciam passar dos 40 anos. Junto caminhava uma mulher, as feições eram angulosas, a pele era negra retinta, mas também pálida, o cabelo crespo estava preso em um penteado alto que lhe entregava uma postura ainda mais de poder. Conhecia os rostos de conversas nas semanas passadas, mas as fotos não faziam jus à realidade, Luís parecia quase humano perto das figuras.

- Diana, deixe-me apresentar Victor, Hélio e Esmeralda. Os três são parte dos representantes da comissão que estaremos hospedando no próximo mês.

A mulher soltou uma risada sem humor.

- Ainda não me acostumei com o jeito coloquial de vocês de conversar. É tão sem etiqueta, tão humano. - Tinha nojo em cada palavra.

Luís segurava a taça na mão de forma casual como se estivesse em qualquer outra conversa em sua vida. Esmeralda estalou a língua como se lembrasse de Diana a sua frente e saísse de seus devaneios sobre o país onde estava.

- Diana! Luis tem nos contado bastante sobre vocês, será interessante integrar nossas forças. Victor, lembro que tínhamos planejado realizar treinos juntos, chegamos a mandar os planos, certo? - A mulher disse olhando para o colega que apenas assentiu com a cabeça.

Diana forçou o sorriso e levou a taça novamente à boca olhando para Luís com o canto dos olhos.

- Claro, Esmeralda, já temos tudo aqui. Diana está encarregada de organizar o treino.

A vampiresa sorriu. Diana engasgou com o vinho que tomava. As presas eram longas, longas como nunca havia visto antes.

- São lindas, não? - Abriu ainda mais o sorriso - Você só vai encontrar presas assim na Europa querida, presas que não atrofiaram porque ainda são úteis.

- Úteis?

- Claro! Caçamos ainda! - Gargalhou.

O vinho revirou no estômago. Sentiu Luís colocar uma palma em suas costas em um gesto apaziguador condescendente. A raiva subiu até a garganta dando forma a palavras.

- Mas, senhora, achei que o motivo de vossa visita era exatamente esse. Tornar as vossas presas inúteis assim como as nossas. Ou estou errada e estamos por algum motivo estamos com objetivos diferentes? - Fez questão de fazer um cara de confusa e ingênua.

Victor e Hélio que até o momento estavam como ouvintes deram um passo à frente. Diana sentiu seu superior se aproximar, evidenciando a tensão em seu corpo. Carregava em seu rosto uma expressão de desapontamento e irritação.

- Luís, você pode até saber um pouco mais sobre equilíbrio humanos e vampiros do que a gente, mas não sabe sobre hierarquia, ou pelo menos não passa isso para os subalternos. Nós sabemos, e nosso método de ensino não é o dos mais prazerosos. Não nos faça ter que ensiná-los. - Não olhou para Diana por um segundo.

Novamente sentiu a palma da mão nas costas.

- Claro, Esmeralda. Fiquem à vontade, irei me juntar a vocês em um minuto. - Apontou para o salão de forma corteza.

- Um prazer, Diana. Espero que o treino amanhã seja proveitoso.

O trio saiu como um só, se movimentando em conjunto, lentamente desaparecendo no mar de convidados no salão.

- Eu não tenho tempo e nem paciência para lidar com você agora.

- Você ouviu o que eles disseram?! - A voz saiu um pouco mais alta do que planejou fazendo dois garçons virarem para olhar.

- Diana eu vou repetir só mais uma vez: eu não tenho tempo e nem paciência para lidar com você agora! Perto do amanhecer passe na minha sala e a gente conversa melhor.

Luís já tinha sumido no mar de vampiros quando abriu a boca para responder.

- Que saco hein. - A voz veio de trás de si.

Teve que segurar o corpo para não pular com susto.

- Prazer, Darius! - A figura estendeu a mão.

Estava sendo uma noite de muitas apresentações, Diana pensou consigo.

- Prazer, Diana! - Deu um meio sorriso.

- Não parece muito um prazer para você.

Viu que o líquido da taça que balançava tão pretensiosamente não era vinho. O meio sorriso desapareceu.

- Realmente não é um prazer conhecer vampiros estrangeiros que se espreitam pela noite e escutam conversas alheias.

- Olha só, quem disse que vocês não caçam mais? Direto na jugular.

O sorriso parecia ser feito de marfim. Era impecável, não parecia passar dos 30 anos de idade, o cabelo preto como petróleo estava preso em um rabo de cavalo no topo da cabeça.

- Mas peço desculpas, meu bem. - Diana fez careta ao ouvir as últimas palavras - Estava de passagem e acabei escutando parte da bronca que você fez seu chefe levar e depois a bronca que você levou.

- Meu bem?

- Sim?

Virou a taça com o resto de sangue, aproveitou o garçom passando e puxou mais uma outra.

- Pois então, sou da comissão europeia. Na verdade a outra comissão. A comissão mais legal se eu puder pontuar assim, meu bem.

Diana não sabia se era vinho ou se aquilo estava de fato acontecendo. Não tinha sido informada sobre outra comissão.

- Não me chame assim.

O sorriso de Darius aumentou conforme abaixou o rosto para que os olhos se alinhassem com o da mulher a sua frente.

- Sem problema algum, eu posso mudar. Que tal eu te chamar de querida?

O nariz explodiu em sangue. Diana tinha experiência de primeira classe em como quebrar um nariz com elegância, fosse ele humano ou vampírico. 

Você leu todos os capítulos publicados.

⏰ Última atualização: Sep 12, 2024 ⏰

Adicione esta história à sua Biblioteca e seja notificado quando novos capítulos chegarem!

SublimeOnde histórias criam vida. Descubra agora