Capítulo 3 Uma jornada até a farmácia

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Ah caro viajan... leitor!
Concentre-se Oliveira!
Perdão você ainda está aqui, digo, é claro que está...
De todo o modo, eu quero pedir perdão se os comentários atrapalharam a imersão acho que estou um pouco enferrujado sobre como os livros funcionam porém prometo que vou me conter.

O dia dele estava sendo péssimo, apesar de ser um sábado ensolarado com temperatura amena, uma brisa suave e ainda ser 8:00 da manhã, o mundo em volta dele estava vivendo, as crianças gritavam brincando no pátio do condomínio, parecia que a vizinha de baixo estava tendo um dia de paz porque ela estava rindo ao telefone na varanda, os vizinhos de cima também pareciam felizes porque uma música romântica vinha do apartamento deles e até o vizinho do 307 parecia muito feliz lavando seu carro velho lá embaixo.
O rapaz no entanto não conseguia sentir essa leveza que o mundo estava proporcionando, não era como se houvesse algum problema o incomodando ele só não conseguia sentir nada, era como se todos estivessem dançando com o mundo e ele não conseguisse ouvir a música, sempre foi assim, desde que ele era criança.
Aliás quando era criança ela lembrava que seus sonhos eram mais tranquilos, apesar de não se encaixar ao mundo havia algo reconfortante nos seus sonhos até começarem a virar pesadelos, talvez tenha sido aí que tudo parou de fazer sentido ou não, até alí nenhum psicólogo tinha chegado perto de responder as perguntas dele, era difícil diagnosticar ele; não era ansioso apesar da falta de sono e não era depressivo apesar de tudo indicar que sim, parecia que todas as doenças podiam se encaixar nele ao mesmo tempo que não podiam então a melhor das soluções naturalmente era medicar ele! (Será que a ironia fica perceptível pelo ponto de exclamação?)
Enquanto estava anestesiado ele conseguia conviver em sociedade e parava de pensar sobre a vida, sobre o que tinha de errado com ele ou por que ele devia sentir alguma coisa, ou sobre esse vazio que existia na sua alma e na sua mente, sobre seus sonhos estranhos e todas as outras peças que nunca se encaixavam na realidade.
Mas naquela manhã ele estava sentindo sua cabeça leve, leve e confusa de um jeito que milhares de pensamentos surgiram e todos conseguiam fugir, talvez porque ele não tivesse tomado seu calmante na noite anterior, dormiu muito mal e acordou muito tarde perdendo uma dose importante de outro remédio.
Foi então que ele lembrou que seu calmante havia acabado por isso ele não havia tomado, o rapaz foi até o armário da cozinha destinado a guardar seus medicamentos e logo notou que era virada de mês e suas doses controladas estavam todas acabando, ele teria que ir a farmácia.
Ele sequer teria pensado em comer alguma coisa se seu estômago não tivesse roncado, era assim que ele vivia por instintos primitivos que o impediam de morrer, basicamente, para ele o sabor e o odor da comida não importavam por isso ele sempre optava por comida instantânea e enlatada, uma torrada sem nada e um copo de água eram mais que suficiente para sua jornada até a farmácia.
Você deve imaginar que pouco importava o que ele vestia para sair de casa mas, independente da ocasião ou do lugar ele optava por terno e gravata mesmo vivendo naquele lugar chamado Brasil, no verão, então talvez seja até compreensível os vizinhos acharem ele um pouco esquisito. Enfim ele desceu pelas escadas do apartamento, literalmente parecendo uma mancha cinza num quadro colorido, ele saiu do condomínio onde vivia e atravessou a rua, caminhou um pouco e entrou na pequena farmácia da esquina, o farmacêutico muito gentil tentou conversar com ele mas novamente foi um esforço em vão, o rapaz muito raramente desenvolvia alguma conversa, veja você mesmo;

- Bom dia Pedro! Estava me perguntando quando você ia vir. - Saudou o farmacêutico, um velhinho de cabelo branco que usava um jaleco e um óculos retangulares.
- Bom dia. - Respondeu Pedro friamente, curiosamente se alguém não dissesse o nome dele às vezes ele até esquecia que tinha um nome.
- Puxa vida que calor! Parece que cada ano piora. - Comentou o farmacêutico, aumentando a potência do ar condicionado principalmente porque seu Sérgio, o farmacêutico, temia que Pedro estivesse passando muito calor.
- ... - Pedro simplesmente não sentia vontade de responder e um silêncio pairava sob o porcelanato da farmácia porém aquele senhor munido de muita empatia já estava acostumado com isso, no fundo ele insistia porque tinha esperança de ter respostas diferentes;
- Não sei como você aguenta de terno, não tá com calor?
- Não.
- Tá trabalhando hoje?
- Não.
- É... você gosta disso né? - Por fim seu Sérgio desistiu, não era hoje que Pedro ia apresentar alguma melhora.
- Sim.
- Mesmo de sempre?
- É. - O rapaz entregou uma receita com dóis remédios que eu mero narrador sem conhecimento de farmacologia não me arrisco a dizer quais são.
- Poxa vida Pedro, passou no médico esse mês? - Perguntou Sérgio indignado, ajustando os óculos.
- Passei.
- E aí?
- Ele me deu essa receita.
- Mas não mudou nada? Não melhorou, nem um pouquinho?
- Não.
- Você devia tentar a terapia viu, esse tanto de remédio controlado...
-...
- Não faz bem Pedro.
-... - O silêncio constrangedor dançava entre as prateleiras de fraldas e escovas de dentes.
- Eu vou buscar. - O velho farmacêutico sumiu atrás do balcão numa salinha cheia de remédios e Pedro ficou esperando no longo silêncio tedioso da farmácia quebrado somente pelo som do ar condicionado trabalhando, a brisa poderia ser um alívio para uma pessoa comum mas ela não significava nada para o rapaz, como o tédio, o constrangimento e até a empatia alheia, talvez essa seja a definição de ser vazio, de ser cinza. E então seu Sérgio voltou - Tá aqui.
- Obrigado.
- Tchau, se cuida Pedro.
Pedro saiu da farmácia a deixando em silêncio novamente, apesar da frieza algumas pessoas se importavam com o rapaz e esperavam ver ele melhorar algum dia só que isso não ia acontecer.

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