Capítulo 26

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Abigail

Rafael queria reconstruir a casa das nossas avós — era assim que a chamávamos desde que eu soube sobre as duas — com as próprias mãos, o que nos atrasava bastante, porque mais fazíamos sexo sobre o piso novo do que focávamos em trocar o azulejo manchado do banheiro por porcelanato. Mas, para o Fire, ele mandou uma equipe de instaladores da sua loja, mesmo que pequena, porque eu o ouvia designando a maioria das pessoas para as prioridades de Serena.

Algumas noites eu tinha Vicenzo no colo e Valentina adormecida ao meu lado na cama de Rafael quando eu escutava seus passos e sussurros no corredor. Eram coisas como:

— Quatro mil e quinhentos a estrutura elétrica por cada casa? Ótimo. Comecem com as que são chefiadas por mulheres. Elas estão sem conseguir manter os alimentos na geladeira, muitas delas dando banho frio nas crianças, isso me mata.

Eu encolhia na cama e abraçava os nossos pequenos. Não era justo que algumas pessoas estivessem passando por tudo aquilo. Muitos eram tão indefesos ainda.

Ele lutou internamente quanto a dispender tempo e dinheiro no Fire, mas fez pelos meninos do Comando, pela cidade, pelos meus irmão. O que mostra que as coisas estão melhores é a liberdade que um minuto de diversão pode trazer. Não é o luxo ou a vida cotidiana. É poder rir de uma bobagem, ver os amigos e fazer coisas simples como dançar. Estava apoiando Rafael em relação ao Fire, não apenas por ser uma coisa boa para os meus irmãos. Serena precisava disso de novo.

Quando ele me disse que estava tudo pronto, que a licença saiu e conseguiram um carregamento, mesmo que mínimo, de mantimentos e bebidas, nós nos juntamos no sofá para olhar a previsão do tempo para os próximos dias. O frio estaria presente, mas o sol também, mais estável, como um prenúncio de dias melhores. A chuva prevista antes, tinha sido levada para longe pelo vento, para nossa alegria. Era o momento certo para a inauguração.

Arrumei as crianças, e gostava muito de brincar disso. Valentina tinha um guarda-roupas fofo cheio de conjuntos com estampas coloridas. Não era fascinada por vestidos, mas gostava das cores nos tecidos, nas histórias que eles contavam.

Vicenzo gargalhava quando eu suava para vestir seus macacões, porque uma perna saía quando eu finalmente encaixava um braço. Eu chegava a achar que ele fazia de propósito, apenas para rir da minha cara, mas eu deixava, porque sua risada banguela era linda. A propósito, na última troca de roupa antes da inauguração do Fire, eu vi o seu primeiro dentinho.

A caminho da festa, depois de descermos do carro e eu o ajudar a colocar o pequeno no canguru, Rafael me deu a mão, e eu para Valentina, nós quatro atravessando o estacionamento de chão batido, lotado de carros no fim do dia, já ouvindo a melodia da música.

Rafael parou de repente, me assustando. Olhei para ele, que estava com o rosto contraído, mas rindo.

— Ah, não — falou.

— O que foi?

— Essa música...

Tentei aguçar o ouvido. Ouvi um pedaço da letra:

Estou perdido de desejo, apaixonado, afogueado, o coração magoado, mas não tem jeito, eu quero ter você.

Não entendi bem o resto, mas Rafael começou a cantar, fazendo Valen rir.

Preciso! Preciso de você aqui. — Ele me puxou e enlaçou minha cintura. Olhou nos meus olhos, prosseguindo: — Amor, eu sou seu dependente, coração carente, vai me enlouquecer.

— Rafael... — falei, tímida.

— Eu ouvia Saudade Bandida dia e noite quando você se foi.

Reconstruindo o AmorOnde histórias criam vida. Descubra agora