Capítulo 3

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— O que você está fazendo? — perguntei, brava, afinal minha cabeça havia batido no chão e estava doendo, mas ele não respondeu. Apenas continuou me segurando.

— Saia de cima da minha filha! — Ouvi a voz de minha mãe soar como uma ordem ao nosso lado.

Aodh a olhou e depois olhou para o rei.

— Solte-a, Aodh! — Cedric falou.

Aos poucos e relutante, ele foi saindo de cima de mim. Ainda pude reparar em seus olhos e, se os sentimentos pudessem escorrer literalmente pela face, ali a mágoa seria vista. Também pude sentir seu cheiro doce e reconfortante, parecia com olíbano, um incenso que eu usava em meu quarto.

— Ela é uma bruxa! — Aodh soltou com desprezo, ainda olhando para baixo, para mim, como se ali fosse meu lugar. Bateu as mãos em sua roupa para tirar o pó e, talvez, meu odor.

Sacudi a cabeça com sua declaração e levantei-me com a ajuda de Cedric.

— Uma o quê? — perguntei, incrédula.

— Vamos entrar, por favor, isso não é assunto para tratarmos em meio a todos. — O rei indicou a casa e olhou, incisivo, para Aodh.

***

Na proteção da residência do rei, o elfo que tanto me atraía parecia perdido em seus pensamentos. Cedric, por sua vez, apenas me encarava como se esperasse uma explicação, mas eu não sabia de nada, muito menos aclarar o que Aodh havia colocado em questão; que eu era uma bruxa.

— Eu a vi — Aodh começou franzindo a testa, tentando recordar-se dos fatos. — Vi quando sussurrou para as chamas e fez com que aumentassem. Observei enquanto movimentava as mãos fazendo com que o fogo se alimentasse da vida que encontrava em seu caminho, e se eu não a tivesse impedido — ele engoliu em seco —, ela teria queimado tudo e todos.

Cedric olhou para seu guerreiro e arregalou os olhos. Em seguida, os fechou e coçou as têmporas como quem prevê um problema.

— Calma, meu amigo, se ela é o que você diz, nem ela sabia. — O rei apontou para mim. — Nós a testamos para magia quando chegou e nada se manifestou.

— Bruxas não são de confiança, meu rei, sabemos disso melhor do que ninguém. — Aodh estava com o rosto inexpressivo. Não parecia sentir ódio, mas era como se um filme de terror passasse em sua mente. Estava com os olhos arregalados para o nada e, às vezes, franzia a testa, como quando lembramos de algo ruim.

De repente, a conversa foi ficando distante. Meus ouvidos foram tampados pela pressão do ar que parecia ter baixado minha pressão também. Atordoada e com um pouco de falta de ar, virei a cabeça procurando minha mãe e, na porta do salão, como um fantasma, eu a vi.

A ruiva esticava os braços para mim com a ternura de uma mãe que reencontra o filho depois da escola e, repetidamente, sussurrava "somos uma". Calafrios percorreram meu corpo, fazendo-me estremecer. Meu coração disparou e eu o sentia batendo forte quase como se estivesse em minha garganta. Minha visão ficou embaçada e a fraqueza me venceu. Não consegui me segurar de pé e desabei, batendo os joelhos com força no chão.

— Tayara! — Ouvi minha mãe gritar. Senti suas mãos em minhas costas e braços, amparando-me enquanto tentava me manter lúcida.

***

— Ela não iria nos fazer mal, Aodh, a mãe dela é uma de nós! Não sei explicar como uma elfa pode gerar uma bruxa, se é que ela é isso mesmo. — Ouvi alguém dizer pausadamente, mostrando controle e preocupação.

Lembro-me de ter sido levada até o quarto novamente. Em meio a espasmos de dor, visão embaçada e apagões, me vi sendo carregada até a cama. Senti a presença de minha mãe ao meu lado o tempo todo. Assim como acontecia todas as vezes em que eu ficava doente, ela nunca me deixava só.

As Faces da LuzOnde histórias criam vida. Descubra agora