Capítulo 1

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Scarlett Hale

Nortéon 1697

Agarrei-me as hastes firmes do portão, e as balancei com força, na esperança de que alguém pudesse me deixar entrar, eu ainda podia ouvir os gritos dos soldados procurando por mim em meio a floresta, eles estavam me caçando, para fazer tudo o que proferiram antes que eu fugisse e então me matar.

Ergui meu corpo e me debrucei sobre as grades, que se abriram a minha frente, agarrei-me ainda mais a minha capa vermelha enquanto caminhava por aquele jardim escuro e coberto pela neve, o frio fazia com que meus dentes batessem tão rapidamente que eu tinha a impressão de poder ser ouvida a quilômetros dali.

— O que faz aqui? — uma voz rouca e grossa rompeu o silêncio noturno, embora a penumbra dificultasse enxergar de onde vinha o som e quem falava.

— Desculpe-me, não tive para onde ir. — Respondi, minha voz trêmula denunciando minha aflição. A figura permanecia envolta em sombras, uma presença sinistra no interior da escuridão.

— Os soldados reais estão à sua procura. Você é fugitiva? — a voz soou mais próxima agora, carregada de desconfiança.

— Sim... eles, eles querem me matar, atearam fogo na cabana em que eu morava — murmurei, sentindo um arrepio percorrer minha espinha. A sensação de perigo iminente se intensificava a cada segundo.

Um breve silêncio se seguiu, apenas o som do vento sussurrando entre as árvores quebrava a quietude. Então, a figura emergiu das sombras, revelando os contornos de um homem alto e imponente, seu olhar penetrante fixando-se em mim com intensidade.

— E por que acredita que estará segura aqui? — questiona-me o homem, seu olhar penetrante buscando respostas.

— Nada em particular — confesso —, mas pareceu-me preferível estar aqui dentro do que à mercê daqueles homens.

Uma risada ecoa pelo ambiente.

— Pobre garota, refugiando-se no inferno, ao lado do diabo. Quem é você, afinal?

— Scarlett — engulo em seco — Scarlett Hale.

— A neta da bruxa — ele diz, fitando meus olhos.

— Minha avó não era uma bruxa!

— Mas foi queimada na fogueira não foi? As pessoas gritaram em praça pública que ela era uma bruxa, atiraram pedras nela e a condenaram ao inferno, no entanto, é você quem está aqui.

Contenho as lágrimas que ameaçam cair dos meus olhos. Recordar minha amada avó amarrada e consumida pelo fogo faz minha alma sangrar.

— Essas pessoas são cruéis.

O homem me encara por alguns segundos.

— O que me impede de expulsá-la daqui?

— Por favor, tenha piedade. Posso ser útil de alguma forma. Esta casa é espaçosa; posso ajudar na limpeza, na cozinha, qualquer coisa — imploro.

— Piedade... Não há piedade no inferno. Poderá ficar por enquanto, mas saiba que esta não é uma casa para os desesperados encontrarem refúgio. Aqui, preferimos a noite e as sombras. Tem coragem para enfrentar o que habita este lugar?

— Qualquer coisa é melhor do que estar lá fora — baixo meus olhos para as minhas mãos, que ainda seguram com força a capa rubra.

— Venha comigo — ele diz, e eu o sigo, observando ao meu redor. As estátuas, que deveriam ser de anjos, são formas demoníacas que parecem me acompanhar com seus olhos escuros.

A casa corresponde à minha imaginação; a construção de pedra é sombria e gélida, e nem mesmo a grande lareira acesa consegue aquecer o ambiente.

O homem percorre um corredor longo, iluminado por algumas velas, e abre uma porta de madeira, revelando uma espécie de cela, com uma cama no canto.

— Passará a noite aqui — ele decreta, observando-me. Vira as costas, caminhando com elegância sob suas botas, ele tem cabelos negros e olhos azuis que parecem ler a minha alma.

Respiro fundo quando ele sai e me aproximo da pequena janela, de onde posso ver o clarão das chamas que ainda consomem o lugar que chamei de lar.

Sinto as lágrimas escorrendo pelo meu rosto. Toda a minha vida foi destruída, e agora eu estava no lugar que minha avó tanto me alertara para evitar: a casa da colina.

O silêncio da cela é rompido apenas pelo crepitar das chamas ao longe e pelos soluços que escapam de minha garganta. Encaro a capa vermelha, um último elo com minha avó, agora empoeirada e manchada pelas agruras da fuga.

A noite avança, e os sons soturnos da casa tornam-se mais evidentes. Passos arrastados ecoam pelos corredores, como se sombras inquietas dançassem entre as paredes frias. Observo as estátuas demoníacas, cujos olhos parecem acompanhar cada movimento, alimentando a sensação de que este lugar é habitado por entidades sombrias.

Acomodo-me na cama rústica, ciente de que, mesmo neste lugar enigmático, as feridas emocionais não podem ser esquecidas. As lágrimas continuam a rolar, agora misturadas à incerteza que permeia meu futuro.

O que seria de mim agora? Sozinha... Sem esperança de um futuro.

O crepúsculo de sombras se intensifica, e as sombras da casa da colina se transformam em testemunhas silenciosas de uma história que está apenas começando e que eu não sei como vai acabar.


Nas Garras do LoboOnde histórias criam vida. Descubra agora