A ponta da agulha já era algo costumeiro para Beverly.
Ela não devia se assustar com isso, nem dar um pequeno suspiro ao sentir a dor fina da injeção, mas ainda assim, continuava a não se acostumar com esses furos em seus braços.
Na verdade, nunca conseguiu se acostumar com a sua vida, afinal, seu corpo inteiro é tão frágil quanto vidro. Ele se quebra em milhões de pedaços com qualquer força a mais do que o comum, ou seja, abraços mais animados, pular de um sofá, esbarrar em algum lugar sólido de uma maneira um tanto intensa... Isso pode quebrar seus ossos, que podem perfurar algum órgão, que por consequência, podem fazer com que ela morra, ou fique paraplégica.
Beverly descobriu a doença aos dez anos, porém, sua mãe sabe desde que ela era apenas um bebê. E escondeu até que seu braço direito quebrou pela primeira vez, depois de tanto tempo te cuidado, mantendo-a em uma espécie de redoma.
Depois daquela tarde, descobriu sobre sua doença, e o por quê de nunca poder brincar na rua com outras crianças, de seus estudos terem sido dentro de casa e sair apenas para "exames de rotina" como dizia sua mãe, ou para o Central Park... Acompanhada de sua mãe e dois seguranças.
- Está se sentindo bem, Beverly? - Questionou Doutor Arnold.
- Sim, estou bem. Meu braço têm se recuperado, os remédios estão sendo tomados nos horários certos... - Continuou, sua voz saindo como um murmúrio.
- Isso é muito bom, Florzinha. - Ele sorriu de maneira gentil.
Doutor Arnold era um dos poucos no círculo social que a fazia se sentir liberta. Foi ele quem convenceu sua mãe a deixá-la morar sozinha, ter sua vida e se cuidar, sem contar que é como uma segunda figura paterna para si.
- Obrigada, Doutor Arnold. - Ela retribuiu ao sorriso fracamente.
O Doutor suspirou, sentando-se ao lado da cama de hospital em que ela estava sentada, tirando seu par de óculos redondos de seu rosto, massageando sua testa.
- Escute, Beverly... - Ele a olhou, sua voz arrastada, depois, seu olhar foi para o chão. - Isso está sendo mais difícil do que pensei...
Beverly apenas o observou, sua testa franzindo lentamente. A postura de Arnold parecia tensa, a calvície mostrando-se mais clara em cima de sua cabeça, com apenas alguns fios brancos de cabelo nas extremidades da cabeça. Sem contar a sua altura. Beverly é bem mais alta, e de cima, era fácil ver que ele tinha algo que o incomodava profundamente.
- O que há, doutor Arnold...?
- Florzinha... Eu vou me aposentar. - Contou, segurando a mão esquerda de Bev, alisando-a com o polegar. - E dizer isso está doendo muito...
- Se... Aposentar...? - Seus olhos azuis o encararam. - Mas... Mas o senhor me trata desde que eu era pequena! Eu só confio no senhor, não pode...
- Beverly. - Chamou. - Eu tenho 65 anos. Tenho quase quarenta anos de doutorado, mas preciso descansar. E sobre confiança, sei de um médico que pode cuidar bem de você! Especializado na área e... Pode se tornar seu amigo.
- Não confio facilmente assim... - Beverly encostou a cabeça no travesseiro.
- Sua mãe já falou com ele. Disse que achou o rapaz excepcional. - O Doutor se levantou, a olhando. - Veja, está me doendo ter que deixar a minha paciente favorita para trás, mas... Estou cansado, Beverly. Já perdi três aniversários do meu neto mais novo, não quero perder mais um, me entende? É melhor para me cuidar também.
Beverly sabia as razões. Doutor Arnold sempre foi dedicado em seu trabalho, principalmente quando começou a cuidar dela. E ela via isso no jeito em que ele sempre cuidou de si. Ele merece descansar, ir para casa, ou se mudar para o campo.
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Vidro
RomanceBeverly é diagnosticada com uma doença raríssima desde bebê. Acostumada a confiar cegamente em seu médico de longa data, ela se sente desamparada quando ele se aposenta, deixando um vazio em sua vida. Mas, quando um novo médico jovem e ambicioso ass...