IV

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E nas profundezas do abismo, ao estender a sua mão, quem te socorrerá?

— Ei — Tsukishima chamou — você sabe que eu me preocupo com você, certo?

Aproveitou que o sinal estava vermelho para poder encarar Yamaguchi.

— Sim…

— Então… se qualquer coisa acontecer, pode contar comigo. E não deixe que ninguém te trate mal!

Aconselhou por fim e então se despediu, atravessando a rua.

Yamaguchi sabia do que Tsukishima estava falando, mas não queria pensar sobre aquilo. Apenas teve a infelicidade de ser visto com Terushima durante suas costumeiras mãos bobas, o rapaz já estava até se acostumando àquilo. De certa forma, gostava da sensação de sentir-se desejado.

Então, afastando as preocupações de Tsukishima, que julgava desnecessárias, de sua mente, ele seguiu o seu caminho de volta.

Quando já estava em seu apartamento, observou a tela em branco, esquecida no canto de seu estúdio, que na verdade era um improviso, que ocupava a maior parte da sala de estar. Passava da hora de arrumar suas coisas, organizar suas bagunças, mas o rapaz não tinha coragem de começar aquilo. Ao invés disso, preferia pegar um travesseiro e uma coberta e jogá-los no chão, dormindo junto de sua organizada - desorganização.

Eram desleixos como esses que faziam Yamaguchi sentir as consequências depois, como o cansaço a mais e o corpo dolorido, mas também eram coisas como essas que o davam ideias e ajudavam em sua criatividade.

Assim, após sua soneca, ele acordou, sentindo dores nas costas e uma vontade imensa de escrever. Precisaria correr, antes das palavras fugirem de sua cabeça ou estarem longe o suficiente do alcance de suas mãos, para que pudesse passar para o papel o que acontecia ali dentro de si.

Passar para o papel, aproveitando o mar de letras que se formava de tempos em tempos em seu consciente, pois a sua melhor época era aquela, onde as ondas gigantes aconteciam. Aproveitar porque ele era como um surfista, em plena adrenalina, que esperou o ano inteiro por aquilo, a emoção do momento de usar o que a natureza lhe dá.

O que a água era para o surfista solitário, as palavras eram para ele, seu presente da natureza era o poder de criar seu próprio mundo, seu refúgio - e de muitos -. Lugares onde tudo pode ser melhor, onde tudo pode se resolver.

O problema era que, para Yamaguchi, esses lugares estavam fugindo. As frases que escorregaram entre seus dedos pela caneta, não eram de refúgio ou alegria, eram de dor, de angústia, eram as palavras de quem não conseguia sorrir por si só, que tinha vergonha do que se tornava a cada dia e sentia decepção por si, apenas por ser quem era e estar onde estava.

Como o surfista, em plena adrenalina, que se enfiou em uma onda gigante e não soube como acompanhá-la, o mar de letras o sufocava cada vez mais, com seus parágrafos tempestuosos o puxando para baixo, impedindo o oxigênio de entrar em seus pulmões. Ele luta para tentar respirar e entra em pânico quando a dificuldade aumenta, sentindo seu nariz arder e a cabeça ficar em branco. Os braços e pernas se contorcem, tentando o puxar para cima, mas com toda aquela dor, com todo aquele desespero, ele entende que o melhor é parar, parar de tentar lutar e apenas se entregar a realidade, ao fundo do abismo.

Então ele se afastou do manuscrito, com medo do que se passava por sua cabeça, porque tinha noção do que estava acontecendo. Ele estava na beira do precipício, prestes a pular de cabeça em direção a perdição.

E, ainda assim, preferia ignorar, fingir que estava tudo bem, mesmo quando sabia que não. Mesmo quando seu peito doía, a respiração falhava e os olhos enchiam de lágrimas. Preferia ignorar. Porque, em sua cabecinha ingênua, se ele ignorasse o que lhe fazia mal, só sentiria o que lhe faz bem.

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⏰ Última atualização: Oct 04 ⏰

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