A morte.

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Heroísmo trágico: Vendedor de amendoins morre ao salvar mulher de sequestro na Lapa

No dia 4 de dezembro de 1992, a senhora Lídia Albuquerque, 45 anos, passeava pelos Arcos da Lapa quando foi violentamente abordada por seu ex-companheiro, que, armado com uma faca, tentou sequestrá-la. O que parecia o início de uma tragédia mudou de rumo graças à intervenção inesperada de José Cândido da Silva, 65 anos, um vendedor de amendoim conhecido da região.

Seu José do Amendoim, como era carinhosamente chamado pelos frequentadores da Lapa, não hesitou em agir. Ao ver a mulher em perigo, ele enfrentou o agressor sem pensar duas vezes. Embora tenha conseguido salvar a vida de Lídia, o corajoso vendedor foi fatalmente ferido durante o confronto e veio à óbito no local.

Conhecido por sua simpatia e presença constante na Lapa, seu José do Amendoim deixa um legado de bravura e altruísmo. Sua morte não apenas comoveu a população local, como também transformou o humilde vendedor de amendoins em um herói, cuja coragem será lembrada muito além das ruas onde trabalhava todos os dias.

No dia seguinte não se falava de outra coisa. Os tabloides não mostravam outro assunto, todos os jornais e revistas queriam falar dele, o herói improvável da Lapa: José Cândido da Silva. Muitos descobriram ali seu nome de verdade. Ninguém de sua família apareceu no IML para retirar seu corpo, mas sua família da rua estava lá em peso. Ele foi levado ao bar do Juca, onde foi velado em cima da mesa de sinuca, houve samba, risadas e lágrimas. Despediram-se da forma que achavam que ele ia gostar.

Em cima da mesa de sinuca estava seu caixão de madeira vagabunda e seu Zé deitado, vestido sua melhor camisa do Flamengo, sua bermuda jeans e nos pés uma sandália de couro. Se todos não soubessem que tinha ido dessa para uma melhor, poderiam dizer que ele estava somente dormindo após uma longa noite de farra.

— Nunca achei que o Zé ia morrer. — lamentou-se Juca, amigo de longa data, fitando o defunto.

— E não vai, o corpo pode ter ido, mas o Zé vai tá sempre aqui com nós.— consolou Marcelão. — toda vez que a tampinha de um litrão tilintar no chão o espírito dele vai sentado com a gente.

Mais tarde naquele dia seus amigos, que já estavam tonteando, levantaram seu caixão nos ombros e o levaram em uma caminhada cambaleante até o cemitério local. Era um buraco simples na terra preta, ainda não tinha uma lápide, talvez nunca tivesse, era caro a beça. Havia um padre e uma mãe de Santo no local, ambos encomendaram seu corpo, seu Zé sempre atirou para todos os lados e os amigos acharam melhor garantir que todo mundo estivesse preparado para receber o Zé do outro lado.

No momento de baixar o corpo a terra bateu o desespero. Até aquele momento a ideia do amigo ter morrido ainda não tinha sido completamente absorvida, mas no momento em que o caixão foi fechado e baixado ao fundo daquele buraco lamacento, Joca e Marcelão caíram aos prantos, abraçando-se.

Esperavam ter cumprido com todos os requisitos que Zé solicitava vez ou outra quando o assunto da roda era a morte. Ele dizia "quando eu me for, quero ser enterrado no caixão mais barato, só não quero ir como indigente!". E não foi. Todos ficaram sabendo quem era José Cândido da Silva. Seus títulos não eram poucos: pior marido, péssimo pai, o melhor amigo e agora, o herói da lapa.

Aos poucos as pessoas foram indo embora, o tempo ficou cinza e ameaçava chover. Muitos deixaram copinhos americanos com cerveja e cachaça ao lado da cruz de bambu que cravava seu local e algum tempo depois algumas pessoas juravam que ao fazer pedidos e deixar um copinho de cachaça para Seu Zé o pedido era realizado e a cachaça era misteriosamente bebida. Os mais céticos preferiam acreditar que a bebida somente evaporou.

Verdade ou não, a lenda estava viva. 

Seu ZéOnde histórias criam vida. Descubra agora