Faz cerca de um ano desde que me mudei. Caramba, meu, e olha que me mudei pode ser interpretado de várias formas, não apenas geograficamente falando. A correria de "Essepê" nunca me deixa sentir que estou andando nos trilhos. É sempre uma ansiedade desenfreada e uma sensação de estar perdendo algo, um FOMO (Fear of Missing Out) absurdo! Eu juro que estou tentando pensar lá na frente, me planejar melhor... mas o presente é tão insano e avassalador, que a sensação de ficar para trás é inevitável. É preciso escolher as batalhas. E, neste primeiro ano de faculdade, a batalha escolhida foi fazer novas amizades.
Outra mudança é o meu visual. Confesso que ainda me sinto meio "caipira" perto dos jovens que viveram suas vidas inteiras em uma cidade que respira moda, cultura, entretenimento e mercado financeiro. O sotaque também me entrega de cara. Mas aprendi a usar minha essência como um charme, um diferencial. E não vou mentir que venho atraindo mais olhares de admiração do que o esperado. Olhares de desejo. Não mais percorrendo todo o meu corpo, dos pés a cabeça, com expressões de desdém. Agora parecem reparar mais na minha boca, um olhar fixado e direcionado, como se estivessem aceitando um convite para explorar os meus lábios.
São Paulo é uma cidade que, com toda certeza, me despiu. Enquanto alguns já arrancaram minhas roupas, outros tentam arrancar o meu coração. Meus sonhos também andam na corda bamba. Eu já disse que tudo isso só tem um ano? Ah, tem como olhar pelo outro lado também. Pensar que ainda tenho muitos anos pela frente para dar vazão ao meu imaginário insensato.
Imaturo. Ninguém quer se enxergar dessa forma. Mas eu decidi aceitar e ressignificar o seu conceito. Eu sou fraco, frágil e estúpido para falar de amor. Inexperiente. Iludido. Passional. Eu sei que posso, e vou melhorar. Ainda tenho muito a amadurecer. Parece que só temos até os trinta anos para concluir todas as etapas de "uma vida padrão". Nascer, brincar, estudar, se apaixonar, casar, trabalhar, ter uma casa própria... e morrer? Qual a melhor ordem? E se eu pular alguma etapa? Toda nossa juventude corre pelas veias. É muita vontade de fazer mil coisas ao mesmo tempo. Aí bate a culpa por descansar. É como se todos os dias precisassem ser produtivos. Como um checklist abstrato para que, ao fim do dia, quando nossos corpos estiverem cansados e a exaustão nos preencher, possamos orgulhosamente dizer 'Ufa, mais um dia. Tá pago!'.
Eu sempre me pego em meio a reflexões. Cérebro, você não desliga? A fumacinha que sai da cabeça dos personagens de desenhos animados fica disfarçada na vida real, em meio a tanta poluição sonora e visual, mas não tenho dúvidas de que meus neurônios queimam como carvão. O meu corpo está em constante combustão. Eu me sinto um astro solar, com o brilho ainda escondido, mas capaz de expandir raios eletrizantes e contagiantes.
Mas agora é hora de desligar. Hoje à noite tem social na casa da Ana. Quem será que eu vou encontrar? Confio que a rua vai me proteger!
----------
Acompanhe outros contos no meu perfil, e no YouTube. Até o próximo capítulo!
VOCÊ ESTÁ LENDO
Meninos e Meninas: Jão em 'Histórias de uma Playlist'
Storie breviUm conto inspirado na música "Meninos e Meninas", do cantor Jão, com referências de outras músicas do artista e personagens estritamente fictícios. Jota é um garoto do interior que se muda para São Paulo, cheio de sonhos, inseguranças e muita vontad...