Capítulo 1: O Vento do Norte

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A brisa suave da manhã parecia prometer um dia radiante, mas para Emília, tudo o que restava eram sombras. A primavera havia chegado à pequena cidade de Veredinha, mas ela não conseguia sentir a alegria que costumava acompanhar a estação. As flores coloridas desabrochavam nos jardins, mas em seu coração só havia um vazio profundo, como um buraco negro que sugava toda a luz.

Era a primeira primavera sem sua avó, Clara, uma figura que sempre trouxera calor e amor à vida de Emília. Clara adorava cultivar flores; suas mãos, mesmo desgastadas pelo tempo, eram delicadas e cuidadosas. Emília lembrava-se de como, nas tardes ensolaradas, a avó a levava para o jardim e ensinava a cuidar das plantas, contando histórias sobre cada uma delas. Agora, a mesma terra parecia estar marcada pela ausência.

Sentada na varanda, Emília olhava para o jardim em frente à casa, repleto de flores que sua avó havia plantado. Os girassóis se inclinavam em direção ao sol, como se soubessem da beleza que representavam, enquanto as violetas se aglomeravam em um canto, tímidas e reservadas. Emília suspirou, lembrando-se de como a avó sempre dizia que cada primavera era uma nova chance de renascimento. Mas para ela, esse renascimento parecia distante.

Ela se levantou, sem saber ao certo o que fazer. O silêncio era ensurdecedor, e os sussurros do vento pareciam carregar a voz da avó. Emília caminhou até o canteiro de flores e começou a retirar as ervas daninhas, um trabalho que antes era feito com risadas e conversas. Agora, era apenas um ritual solene, uma tentativa de se conectar com as memórias que ainda eram frescas, mas doídas.

No fundo, Emília sabia que precisava seguir em frente, mas a dor da perda era como um peso que a impedia de avançar. Seus amigos não entendiam; a vida na escola continuava, cheia de risos e promessas de futuro, enquanto ela se sentia paralisada, presa em uma estase de tristeza. Ela frequentemente se pegava olhando para o céu, esperando encontrar alguma resposta, algum sinal de que sua avó ainda estava ali, de alguma forma.

Com o passar do dia, o sol começou a se pôr, tingindo o céu de tons laranja e rosa, uma paleta que uma vez teria encantado Clara. Emília sentou-se novamente na varanda, seus pensamentos perdidos em lembranças, quando ouviu uma batida suave na porta. Era sua amiga Laura, que sempre tentava puxá-la para fora da concha em que se encerrara.

- Emília, você vem comigo? A cidade está cheia de vida, e eu trouxe sorvete! - Laura disse, tentando iluminar o semblante de Emília.

- Não sei, Laura... - Emília hesitou, olhando para o horizonte, onde as últimas luzes do dia estavam se apagando. - Estou meio cansada...

- Cansada de quê? - Laura insistiu, sua preocupação evidente. - Você precisa se distrair, pelo menos por um momento.

Emília forçou um sorriso. Laura era a única que ainda tentava alcançar seu coração, mas era difícil explicar que cada riso, cada momento feliz, era uma lembrança de algo que ela havia perdido. Ela queria se permitir ser feliz, mas a culpa a segurava firme.

- Tá bom, vou só por um tempo - respondeu, finalmente se levantando. O gesto era pequeno, mas em sua mente, representava um passo rumo ao desconhecido.

Enquanto caminhava ao lado de Laura, sentia o peso de sua tristeza diminuindo um pouco. O ar fresco da noite carregava os aromas da primavera, e, por um breve momento, Emília imaginou que sua avó estava ali, a observando com um sorriso terno. Mas a realidade logo a envolveu novamente, e ela percebeu que a jornada ainda era longa.

As flores do jardim balançavam ao vento, como se dançassem em homenagem a Clara, enquanto Emília seguia em frente, em busca de sua própria primavera.

A última PrimaveraOnde histórias criam vida. Descubra agora