GABRIEL ALVES
Então ele acordou.O suor fazia a camisa fina grudar em sua pele. A dor de cabeça três vezes pior do que antes fazia o sentir como se seu crânio estivesse sendo esmagado. Ele sentiu o frio comprimir suas entranhas, ao mesmo tempo que sua pele ardia em fogo e seu fôlego encurtava como se tivesse corrido uma maratona.
Me ajuda.
A voz quebradiça ressoou na mente de Gabriel.
Me ajuda. Me ajuda. Me ajuda.
Não existia mais nada além da dor e do pedido desesperado. A cabeça dele zumbiu, seu sangue correu até os ouvidos, suas mãos agarraram o estofado do sofá e a apertaram. Frio e calor pareciam competir para ver quem tomaria seu corpo primeiro. Suas veias queimavam em meio ao frio, congelaram em meio ao calor.
E então, tão rápido quanto veio e mais veloz que um relâmpago tudo se foi. O calor, o frio, a falta de ar. Gabriel levantou seu corpo e sentou no sofá, inalando o máximo de ar que conseguia. Ele ficou parado até sua respiração se regular.
Ele nem percebeu que sua vista estava escura até ela clarear e ele poder vislumbrar a sala novamente. As cortinas balançavam conforme o vento atravessava as grades e passava pela janela aberta. Lá fora já estava escuro.
Passando a mão pelo rosto, seus dedos se sujaram com um líquido escarlate. Seu nariz estava sangrando novamente. Gabriel correu até o banheiro e lavou seu rosto, levantando o olhar, ele encarou seu próprio reflexo.
Algumas gotas de sangue pingaram em sua camiseta, a sujando. Debaixo de seus olhos de cores diferentes, duas olheiras se sobressaiam. Sua imagem era a clara representação de alguém cansado.
A casa ainda estava vazia, sua mãe não tinha voltado. Verificando a hora ele viu que a noite caiu a pouco tempo. Gabriel seguiu para o seu quarto e deitou mais uma vez a cabeça no travesseiro, encarando o teto branco. O cansaço percorria seu corpo. Ainda podia sentir o sol em sua pele, a areia embaixo de si. Temia fechar os olhos e quando abri-los estar dentro d'água outra vez. Até suas piscadas se tornaram espaçadas.
Tinha sido apenas um sonho, pensou consigo mesmo. Apenas isso, não era nada demais, todo mundo tinha sonhos. Foi só um sonho real demais.
Gabriel não pregou o olho naquela noite.
Depois de algumas horas deitado sem dormir, ele ouviu a porta abrir e a voz de seu irmão. Quando a porta do seu quarto foi aberta pelo pequeno Nicolas ele fingiu estar dormindo, o garoto foi embora depois de dar boa noite.
As horas se passaram como minutos e não demorou muito para os primeiros raios de sol invadirem o seu quarto. Antes que se desse por si, ele já estava vestido com o uniforme da escola. Ao entrar na sala, Gabriel se deparou com sua mãe terminando de organizar algumas louças.
Vendo o filho entrar no cômodo ela falou:
— Eu fiz alguns sanduíches, é só esquentar mais tarde — depois de enxugar as mãos em um pano ela foi até o cabideiro e pegou sua bolsa e estendeu a mão, pegando as chaves em cima da mesinha.
— Tudo bem — Gabriel respondeu enquanto enchia um copo de chá e pagava um sanduíche.
— Seu pai não vem hoje, então tranque bem a porta quando sair — ela continuou dando instruções que o garoto tanto conhecia — Nicolas, vamos que é pra hoje!
Nicolas saiu do quarto correndo com a mochila nas costas. Com a mente absorta, Gabriel nem viu o momento que os dois saíram pela porta. Ele pegou seu prato e sua xícara e se sentou sozinho no balcão. Estava quase terminando seu sanduíche quando sentiu arrepios percorrerem seu braço como se uma pena tivesse o cutucado alí.
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O Mar Do Tempo
RomanceO que aconteceria se um dia você acordasse e se deparasse com seu vizinho na sua porta? Esse cujo o enterro foi a poucos dias? Foi isso que aconteceu com Gabriel. Ele havia visto Carlos, seu vizinho, colega de classe e aquele que deveria estar mort...