PROLOGUE.

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: A noite caía densa sobre a cidade antiga, envolvendo as ruas de pedra em uma névoa espessa que parecia emanar do próprio solo. O ar tinha um peso ancestral, como se a terra abaixo de seus pés guardasse segredos tão antigos quanto o tempo. Rio Vidal, uma mulher de olhar penetrante e postura austera, passava pelas vielas estreitas de Edimburgo, o som de seus sapatos ecoando pelas pedras molhadas pela garoa. Ela tinha em mãos um convite peculiar, um bilhete entregue anonimamente em sua residência alguns dias antes. O papel, envelhecido e de textura áspera, trazia apenas um endereço e uma inscrição em latim: "Tempus est revelare."

Rio não era facilmente impressionada. Como historiadora de renome, já havia viajado para lugares em que a história e o mito se entrelaçavam, investigado manuscritos perdidos e artefatos cuja existência muitos questionariam. Ainda assim, aquele bilhete havia mexido com algo em seu âmago, uma curiosidade que ela não conseguia conter. Havia algo de irresistível na promessa de desvendar o passado que permanecia oculto ao longo dos séculos.

Quando finalmente chegou ao local indicado, um prédio de fachada gótica escondido entre construções mais modernas, Rio hesitou por um instante. A porta estava entreaberta, e uma leve luz alaranjada escapava pelas frestas. O lugar exalava mistério, e, por um segundo, ela considerou a possibilidade de estar caminhando em direção a uma armadilha. Mas seu intelecto logo afastou tal pensamento. Era o desconhecido que sempre a motivara. E ali estava ela, à beira de mais um enigma.

Ao cruzar a porta, o cenário que encontrou à sua frente fez seus olhos se arregalarem por um momento. A sala estava repleta de artefatos que, a princípio, pareciam pertencer a diferentes épocas e culturas. Máscaras tribais, vasos gregos, amuletos egípcios, todos arrumados de forma quase caótica, como se tivessem sido deixados ali apressadamente. No centro da sala, uma grande mesa de madeira suportava o que parecia ser o objeto mais intrigante: um livro grosso, encadernado em couro, com uma fechadura dourada que pulsava uma energia incomum.

Rio se aproximou com cautela. Seus dedos quase tocaram o fecho quando uma voz feminina e rouca ecoou pela sala.

"Eu não faria isso se fosse você."

Ela se virou bruscamente, o coração disparado. Na penumbra, emergiu uma figura envolta em um manto púrpura. Seus cabelos castanhos caíam em ondas soltas sobre os ombros, e os olhos de um verde penetrante observavam Rio com uma mistura de curiosidade e desdém. A mulher tinha uma aura que imediatamente fez Rio perceber que estava diante de alguém... ou algo... muito além de qualquer relato que já tivesse estudado.

"Quem é você?" Rio perguntou, a voz firme, embora seu corpo estivesse em alerta.

A mulher sorriu de forma enigmática, dando um passo à frente. "Você sabe exatamente quem eu sou. Ou pelo menos, já ouviu falar de mim. Meu nome ecoa nas lendas que você tanto estuda. Agatha Harkness." Ela parou a alguns metros de Rio, os olhos fixos nela, como se estivesse avaliando cada movimento.

A mente de Rio rapidamente conectou o nome aos fragmentos de história que havia encontrado em suas pesquisas. Harkness. O nome de uma bruxa que supostamente viveu por séculos, uma figura envolta em mistério e medo. Mas aquelas histórias eram lendas, fantasias que, até aquele momento, Rio acreditava serem fruto da imaginação popular.

"Bruxa?" A palavra escapou de seus lábios antes que pudesse se conter. "Isso é absurdo. Não há evidências concretas que provem—"

"Ah, as evidências," Agatha interrompeu, com um sorriso malicioso. "Vocês, acadêmicos, sempre tão obcecados com elas. Mas o que você não entende, minha querida, é que algumas verdades não podem ser quantificadas, catalogadas ou analisadas. Algumas verdades apenas... são."

Rio estreitou os olhos, sua mente racional lutando contra o que estava sendo apresentado. No entanto, havia algo em Agatha que não podia ser facilmente descartado. A mulher emanava uma sensação de poder. Não era apenas sua presença física, mas a forma como o ar ao redor dela parecia vibrar, como se o próprio espaço estivesse sintonizado com sua energia.

"Se você não quer que eu toque o livro, o que exatamente você quer de mim?" Rio perguntou, tentando recuperar o controle da situação.

Agatha cruzou os braços, seu olhar nunca deixando o de Rio. "Eu quero que você entenda o que está em jogo. Esses artefatos, todos eles, não são apenas pedaços de história. Eles carregam poder, poder que pessoas erradas não deveriam possuir. E você, com toda a sua curiosidade insaciável, está muito perto de algo que não entende."

Rio deu um passo à frente, desafiadora. "Então, me faça entender."

Por um momento, o silêncio preencheu a sala. As duas mulheres, tão diferentes, mas igualmente teimosas, se encaravam como se estivessem participando de um duelo não declarado. Finalmente, Agatha suspirou, embora o brilho em seus olhos não se apagasse.

"Você não vai desistir, não é?" A pergunta soou mais como uma constatação do que uma dúvida.

"Eu nunca desisto," Rio respondeu, a voz baixa, mas determinada.

Agatha sorriu novamente, dessa vez com um toque de admiração. "Muito bem. Mas lembre-se, historiadora, algumas portas, uma vez abertas, não podem ser fechadas."

lights and shadows. Onde histórias criam vida. Descubra agora