CONTOS SECRETOS

5- TROCA JUSTA

Foi uma troca justa, apenas isso e nada mais. Confesso que fiquei relutante quanto ao que estava acontecendo depois de um tempo, mas, ingênua como era, pensei que nenhum mal ocorria — e aquela sombra maligna apenas crescia.

Nossa amizade começou de maneira inesperada. Não havia encontros casuais na escola ou laços familiares compartilhados. Foi através de uma sala de bate-papo online que nos conhecemos e conversamos pela primeira vez, num dia qualquer de outubro, quando o clima frio começava a descer pelas ruas. Acho que entendi bem o que nos fez ser amigas tão rapidamente. Tínhamos algo em comum: aquela sensação de deslocamento, como se não pertencêssemos a lugar nenhum.

Aquela sensação de rejeição...

Conversávamos sobre banalidades no início — filmes, músicas, a frustação com a escola, aliás, fora por conta dessa sala de bate-papo sobre filmes que nossos caminhos se cruzaram — até que, aos poucos, as sombras de nossas vidas começaram a se revelar nas palavras trocadas no silêncio da madrugada.

Melissa era seu nome, era encantadora, engraçada, gentil e bela. Ela dizia: "Lara, você precisa acreditar nos seus sonhos, você merece o mundo. Tem talento de sobre para virar uma grande artista", e aquelas palavras me acalentaram. Gostava de pintar quadros, escrever poesias e curtir a natureza. Melissa foi a única amizade que tinha e a única pessoa que me apoiava quando queria decidir sobre algo. Os dias passavam e nossa amizade só aumentava.

Perguntei uma vez sobre os motivos de nunca a ter visto na escola e ela me disse que se tratava de questões de saúde. Tinha acabado de se recuperar de uma leucemia e estudava em casa, seus pais sentiam medo de que ela pudesse ter uma recaída a qualquer momento e por isso preferiam deixá-la de repouso por mais um ano.

Havia dias em que ela desaparecia e voltava alegando que voltara para o hospital. Eu sentia pena dela, havia se mudado para cá para ficar mais perto do Centro de Tratamento do Estado e nunca recebia visitas. Seu mundo era fechado, cheio de fantasias e repleto de dor e angustia. Melissa nunca foi uma garota normal, podemos dizer. E nunca seria mesmo.

Embora essa estranha distância, nós duas nos entendíamos. Era como se, através das telas brilhantes de nossos computadores, pudéssemos sentir a dor uma da outra.

Eu, Lara, vivia dias turbulentos. Separação de pais, relacionamentos que nunca duravam, um coração enorme que era fácil e manipulável por todo tipo de garoto. Isso ainda me faz sentir enjoo quando penso nos garotos que deixei entrar em minha vida fantasiados de homens. Aprendi que excitado, nenhum garoto é sincero. Nunca tive um corpo bonito, meus cabelos eram emaranhados e minhas olheiras terrivelmente visíveis, para mim não existia essa de que devia se amar do jeito que era. Isso foi inventado e dito por alguém que não precisava passar pelo o que eu passava. Amizades? Nenhuma. Sabe quando você faz de tudo para que uma pessoa fique e mesmo assim ela vai embora, sem nenhum motivo aparente? Essa é a minha vida. Uma vida de merda e que eu devia aturar, afinal, eu pedi para nascer?

Não que a jornada de Melissa também não fosse triste e sufocante, mas, às vezes, eu a invejava de não ter que sair de casa e conviver com pessoas que não ligam para você. Com tudo, eu fiquei observadora, comecei a pintar o que via e me chamava mais a atenção. Passei de paisagens coloridas para a natureza morta, o tempo, espaço e as pessoas, claro. É incrível como você vê tudo quando o mundo não te vê.

Com o passar das semanas, a conversa se tornou mais sombria. As mágoas que compartilhamos alimentavam um desejo silencioso por justiça — ou vingança. Começamos com uma estupida brincadeira, imaginando em nossas pequenas cabeças, a ideia de retribuir aos que nos fizeram sofrer na mesma moeda, de devolver ao mundo o que havíamos recebido. Aos poucos, o tom da conversa mudou, e a ideia que antes era uma piada se transformou em algo mais sério.