caos mental

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Estamos com o castanho dos olhos fixos um na alma do outro

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Estamos com o castanho dos olhos fixos um na alma do outro. Talvez, nossa maior descoberta seja que nós dois temos lágrimas nos olhos. Porém, para mim o inesperado é que as minhas costas doem com o tanto que me arranjei em uma postura cada vez mais torta, e que meu braço direito está doendo como nunca doeu quando estive aqui sozinha.

Bebemos água da mesma boca de garrafa. O observo bebendo, e sinto vontade de beber a água da boca dele, que não consegue evitar de sorrir quando me percebe, ali do lado, o observando bem de pertinho.

Sorrimos por mais tempo, agora nos olhando muito de perto. Como é possível a existência de uma conexão tão genuína? Me sinto apavorada com a possibilidade do que pode acontecer depois. E se alguém decidir me visitar esta noite?

- O que tem na mochila?

- Eu pego.

Sua resposta indica ação imediata, e até isso me faz pensar demais, não de forma ansiosa ou preocupada, mas sim contemplativa e buscadora de algo para delirar sobre.

- Não, eu vou.

Me levanto somente para sentir aquele pouco de tontura e fraqueza nas pernas. Estou sorrindo, com uma sacola de coisas comestíveis nas mãos, e um garoto grande está enrolado nos meus lençois, me olhando para além da minha nudez, como se fosse mágico.

Respiro fundo uma única vez e jogo meus braços em cima da cabeça, assim, com os mamilos escuros, de seios quase inexistentes sendo iluminados pela meia luz amarela.

- Você acha que outras pessoas são assim?

- Como?

Ranger da cama, algo não notado e que, aparentemente, acontece cada vez que Felipe se move. Quanto barulho fizemos?

- Eu olho para outras pessoas e, às vezes, isso faz com que eu me sinta doente. Talvez, seja esperado de você essa desenvoltura sexual, mas eu me sinto estranha.

- Um pouco de julgamento?

Questiona colocando um gomo de tangerina na minha boca. Continuo falando enquanto mastigo.

- Parece que todos estão bem e controlados com as próprias emoções, enquanto eu continuo surtando e sendo uma criatura maliciosa.

- Culpa cristã?

- Nunca fui cristã.

- Mas, a gente foi pra igreja quando era criança.

Felipe provavelmente escreve "agente" junto, mesmo quando se trata de "nós".

- Eu não lembro de ter ouvido nada sobre isso na igreja.

- Pode ser uma questão feminina.

- E qual é a questão masculina?

Giro mais em direção a ele.

- Eu me sinto um lixo quase toda vez que faço sozinho. Mas, não me senti assim hoje.

Claramente um "mais" quando deve ser "mas". Estou contabilizando o que devo relevar.

- Acho que eu também.

Mastigação quase silenciosa, mas molhada. Estamos mentindo.

- Como você aprendeu sobre isso?

Sexo.

- Não sei. Não acho que aprendi, eu só anseio por isso.

- Anseio.

Felipe repete, mastigando a segunda tangerina, tal qual alguém que come muitos gomos de uma vez. Agora, estamos famintos de comida.

- Eu anseio.

Repete novamente.

- Você é uma pessoa muito interessante, Aracelly.

A sensação de ouví-lo dizer meu nome, me faz morder meu sorriso e lentamente me virar de costas, tão boba.

- Ei.

Ouço um sussurro quente deslizando pelos pêlos da minha nuca. É diferente quando uma amiga mexe no meu cabelo, não tem faísca.

- Posso te falar uma coisa? Não quero que você fique brava.

Minhas sobrancelhas se franzem cada vez mais, enquanto me viro de volta, assim podendo olhá-lo. Estou pronta para ouvir qualquer coisa que seja dita? É claro que não. Que tipo de emoção vai preencher esse lugar?

- Já te vi antes.

Estudamos na mesma escola há anos, como não teria visto? Minhas sobrancelhas estão segurando uma na mão da outra.

- Eu já gostava de você desde o primeiro ano.

O verbo gostar é bom, muito bom mesmo, para manter relações. No entanto, como gostar de alguém que nem conhece, e por tanto tempo?

- Eu tentava me aproximar quando vocês, seu grupo com aquela sua amiga, faziam jogos no intervalo. Acho que você nunca me percebeu, porque não disse nada. Você até segurou na minha mão uma vez, sem querer, lá no palco, no dia daquela apresentação de meio de ano que todo primeiro ano faz. Às vezes, eu ficava olhando você, na arquibancada, quando tinha jogo, ou quando eu chegava mais cedo. Sempre te vi na sala, mas nunca tive coragem de falar com você.

Seguro as palavras no ar, e observo o sorriso dele que, teoricamente, olha para o teto banhado de ouro, pura luz amarela. Minha respiração está chegando até os meus ouvidos. Isto é um caos mental.

Gosto da palavra "caos" porque as pessoas costumam usar quando se sentem confusas dentro da própria cabeça, e as organizadas usam para qualquer coisa. Não sou muito organizada, e também já disse que gosto de pessoas honestas, mas talvez não esteja preparada para caos mental, e nem para honestidades.

- São três horas, você precisa ir.

Não sei se são três horas, ou onde meu celular está. Não tenho relógio, pois não gosto de pensar no tempo, e esse tempo demorado dos segundos está me apavorando.

- Eu preciso que você vá, tudo bem?

Felipe me olha, procurando por algo, e eu desvio o olhar, não querendo mostrar qualquer coisa agora, pois sei que me odiaria se não tomasse decisões antes de agir.

Depois de vestir o resto da roupa, pega a mochila e se aproxima devagar da cama onde permaneço.

- Tchau.

Digo antes que me faça alguma pergunta gentil em tom doce.

- Tchau.

A conclusão, com cheiro e gosto, o preocupa, coisa que é difícil de esconder, e que eu mesma iria supor se ele não deixasse tão claro.

A conclusão, com cheiro e gosto, o preocupa, coisa que é difícil de esconder, e que eu mesma iria supor se ele não deixasse tão claro

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💜

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