𝟎𝟏

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— O que acha de uma Coca grande? Está quente como o inferno hoje — Kenneth Lancaster argumenta com seu forte sotaque britânico, enrolando as mangas de seu suéter Colcci totalmente inapropriado para um passeio num parque às 2h da tarde.

Clara Price o ignora, perdida em meio a pensamentos distantes e inconstantes. Ela tem pego a si mesma vagando nas sombras de sua mente quase que constantemente, sendo engolida pelas garras de sua própria insanidade.

E é uma droga.

Caminhando não muito longe de onde Clara se encontra, ela avista seu recente e injusto tormento rodeado por seus — capangas — por assim dizer. Blake Adams. Sorrindo para Clara com escárnio.

O idiota lhe causa arrepios.

O estômago de Clara dá voltas nervosas com a perspectiva de se encontrar novamente com o cara e seus parceiros criminosos, sozinha e vulnerável, sem qualquer chance de defesa a favor de si mesma.

— Mel?

Blake some de vista, e fica para trás apenas o puro constrangimento de ouvir Kenneth lhe chamar desta forma tão estúpida e ridícula.

Respirando fundo e tentando de alguma forma áspera ganhar de volta o controle de seus músculos flácidos demais, Clara olha para o homem pelo qual sua mãe tanto a quer ver casada, e sorri secamente.

— Uh... sim, parece uma boa.

— Legal.

Ela sorri estreitamente e não se move quando Kenneth se inclina para deixar um beijo casto em sua bochecha, próximo demais de seus lábios contraídos e firmes.

É incrível como o cara adora mostrar carinho em meio ao público, tocá-la, acariciá-la, ele é o típico namorado que qualquer uma gostaria de ter, o problema é que Clara não sabe se isso é real, ou apenas uma fachada muito bem construída para conseguir o que quer.

Apesar de evidentemente lindo com seu sotaque inglês característico, seus olhos azuis elétricos e sua educação excepcional vinda de berço, Clara não pode deixar de esperar que o sapato caia, e que o monstro finalmente se revele.

Afinal, Clara costuma atrair coisas desse tipo para si mesma, e o mundo não é cor-de-rosa como alguns tendem a acreditar.

Kenneth se afasta e Clara observa total e completamente em silêncio. Seus dedos apertados aos seus lados enquanto sente o vento balançar seus cabelos castanhos.

Deixando seus olhos escuros vagarem por todos os lados, ela morde o lábio e brinca com um fiapo solto de sua jaqueta, ao mesmo tempo em que vê um papel anunciando algo de seu interesse pregado numa árvore.

É um anúncio da 38° edição anual de um dos maiores eventos de exposição de motocicletas Harley Davidson do estado do Michigan. Kansas dará vida ao evento.

As pessoas podem acreditar que Clara opta por ouvir Beethoven ou talvez Frédéric Chopin em seu tempo livre, mas elas não poderiam estar mais erradas.

Clara ama rock clássico e tem um amor pela boa música desde que aprendeu o seu real significado. Ama as notas e a letra que muitas vezes conseguem tocá-la onde ninguém mais consegue.

E é incrível.

As motocicletas por sua vez lhe transmitem ousadia, liberdade e rebeldia, a fazem crer que quem senta em uma delas, pode chegar em qualquer lugar, sem jamais temer.

Claro, ela nunca sentou em uma moto na vida, e realmente não entende muito sobre elas — Clara apenas tem uma memória fotográfica e bom gosto, modéstia a parte — mas isso não a impede de apreciar cada pequena peça que compõe o monstruoso veículo.

𝐕𝐎𝐀𝐍𝐃𝐎 𝐁𝐀𝐈𝐗𝐎 +𝟏𝟖Onde histórias criam vida. Descubra agora