Capítulo 4: O plano

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O dia mal havia amanhecido e já estava de pé, as queimaduras da tarde anterior, resultantes do contato direto com o energon de Jazz não a deixaram pregar os olhos, doía muito e as trilhas de lágrimas saíram somente depois do banho. Emy não se ressentiu, a pomada que passou aliviou um pouco a queimação lancinante, que engoliu o resto sem reclamações, vestindo-se em jeans e um casaco xadrez sob uma blusa de mangas.

Jazz estava em descanso quando o conferiu no celeiro, depositando um pouco mais de gasolina no sintetizador e verificando as válvulas cauterizadas, ele devia sentir muita dor com todo o estrago em seu corpo, tanto pelas cauterizações caseiras, quanto pelos danos causados pelos Decepticons. No combate contra três Cons armados, a sorte esteve ao lado dele, e considerava um milagre Jazz ter ficado vivo até o presente momento, embora reconhecesse seus próprios esforços de noites sem dormir para mantê-lo vivo e estável. Porém, todo esse sofrimento teria fim no mais tardar, iria atrás do tal Jack e tiraria a prova de que a motocicleta dele era ou não uma cybertroniana, e se fosse, arrancaria informações sobre o paradeiro do CMO médico Ratchet, ou qualquer outro médico Autobot a disposição.

Tudo podia ter o preço de sua vida insignificante de humano, mas por Jazz iria até o fim do mundo.

Ligando a caminhonete velha, dirigiu até a escola de ensino básico de Jasper, localizada próxima ao centro, perto do semáforo onde o viu e a moto azul pela primeira vez. Era um palpite e torcia para ser o correto, caso não fosse, iria até a outra escola verificar e esperar, mas com toda certeza Jack estudava em uma delas, pois sua face denotava a idade de um adolescente em crescimento.

Emy estacionou no meio fio, observando o fluxo de alunos começar a se tornar mais forte, o vai e vem a deixava um pouco tonta, pois olhava de um lado a outro na busca de Jack e uma moto azul em detalhes rosas.

Moto azul... moto azul...

Os minutos passaram de forma torturante, e o suor começou a tomar conta das palmas que escorregavam, grudadas no volante da caminhonete quando o viu, o tal do Jack.

O adolescente que devia ter sua altura, estacionou ali perto, a moto azul era a mesma do dia anterior. Porém, ele apenas desceu, tirou o capacete e saiu andando na direção da escola, os lábios não abriram para dizer ou murmurar alguma coisa, nada. E o estômago de Emy caiu um pouco.

Okay, ele não pode se comunicar com uma moto em plena luz do dia num lugar cercado por pessoas, não posso pensar que aconteça uma coisa dessas. Agora preciso aguardar.

A espera foi ainda mais torturante, com a atenção fixa na moto azul, que não se moveu um centímetro do lugar, as horas se passaram num tamborilar de dedos que enchia pouco a pouco a bexiga numa vontade absurda de ir ao banheiro, a garrafa de água ao lado foi esvaziada e a pressão a deixava tonta, mas não ousou sair do carro, a fim de manter os olhos fixos na motocicleta suspeita.

Duas horas se passaram e nada, o sol refletiu nos espelhos da moto, mas nada. Emy gemeu, fincando os dentes nos lábios, ela realmente precisava ir ao banheiro. Havia uma sorveteria do outro lado da rua, no qual alguns alunos usaram o recreio para se encherem de sorvete e refrigerante, devia ter um banheiro e era relativamente próximo, a moto não iria se mover nos poucos minutos que passaria ausente, certo?

Vencida pela bexiga cheia, saiu do carro e trotou na direção da sorveteria, utilizou menos de dez minutos e quando voltou, a motocicleta continuava ali, o que estranhou e levantou um ar odioso de dúvida.

Será que eu imaginei tudo?

A motocicleta de cor azul escuro e alguns detalhes róseos não parecia suspeita, nem de longe. Parada sob o pedal, a luz do sol a banhava e fazia as cores vibrar num polimento perfeito, não havia nada fora do lugar, muito pelo contrário.

Droga...

Será que apenas estava sofrendo de alucinações devido às noites sem dormir e as enxaquecas infernais? Pois sonhava acordada e dormindo nas poucas horas de sono que corria ao encontro de um Ratchet, e ele parecia uma cópia sem sentido e mal feita de First Aid, moldado nas cores vermelha e branco. Emy vomitava seu desespero aos pés dele, mas Ratchet desaparecia de seu alcance e suas pernas de humano pesavam o suficiente para não conseguir correr até ele.

Alucinações.

Trincando os dentes, a dúvida ameaçou a borda da mente outra vez, o desespero de seus esforços não resultarem em nada e ter que lidar com seu amigo definhando até a morte dentro de um celeiro decrépito. Caso First Aid voltasse, o que diria? Como explicaria que deixou seu estimado companheiro morrer, deitado nos próprios rejeitos alienígenas?

Emy nunca conseguiria lidar com a culpa que tal coisa traria.

Ajeitando-se outra vez no banco, as lágrimas escorreram amargas pelas bochechas recheadas de pontos sensíveis de queimadura. Aquela moto era sua única pista de Ratchet. Tinha que ser ela.

Seu choro cessou eventualmente no passar das horas, uma música ribombou pelos altos falantes da caminhonete até o sino da escola soar, e o mar de alunos desesperados para ir embora mergulhasse o campus num ninho de formigas agitadas. Seus olhos travaram na entrada da escola, e viu Jack descendo as escadas, porém não só, junto a ele havia duas crianças, uma menina de visual punk, com algumas mechas de cabelo coloridos de rosa gritante e um garoto menor, com os cabelos entupidos de gel e um óculos de aros grossos escorregando pelo nariz.

O trio peculiar parou por breves momentos na escada, antes de se despedirem e cada um caminhar numa direção, não soube o porquê, mas se sentiu atraída por essas figuras peculiares. Jack parou outra vez para conversar com uma garota ruiva, então acabou seguindo a garota punk com os olhos, a vendo adentrar um suv verde militar e partir, o garoto de óculos seguiu o mesmo ritmo, embora ele tenha desaparecido em um carro modelo esportivo amarelo e preto.

De todos os dias que passou em Jasper, aqueles dois modelos de carro eram os mais diferentes que viu em relação aos outros que circulavam pela cidade, pareciam até mesmo, meio deslocados no ambiente.

"Você saberá que são eles no momento que os vir, Autobots sempre se destacam em qualquer lugar". A voz de Jazz perfurou os tímpanos como se ele estivesse sentado bem ao lado, e sacudiu a cabeça. Estava ficando paranoica.

Jack se despediu, enfim, de seus amigos e seguiu caminho, logo atrás o acompanhava de uma distância relativa, ele parou no semáforo normalmente, depois dirigiu até a lanchonete do dia anterior e desapareceu no estacionamento. Emy não ousou segui-lo até lá, escolhendo ficar na rua adjacente para não levantar suspeitas de que estava o seguindo. Aparentemente Jack trabalhava no fast-food, ele não demorou a aparecer uniformizado no drive thru, atendendo alguns clientes.

Dentro da caminhonete, Emy bolou um plano, porém, por mais que tenha dito para Jazz que tomaria cuidado, não tinha como entrar em contato com a suposta cybertroniana sem correr riscos. Primeiro pensou em abordá-la sozinha no estacionamento, mas após vê-la saindo do local com uma pessoa na garupa, a mesma holografia de ontem, pensou melhor e decidiu fazê-lo com Jack presente, desta forma a colocaria contra a parede e ele junto, agora com a certeza que definitivamente a motocicleta era um robô senciente.

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⏰ Última atualização: Oct 21 ⏰

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