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O trem chacoalha ao virar e preciso me agarrar com mais firmeza na barra acima da minha cabeça, enquanto me esforço para abrir o WhatsApp e retornar a ligação de Love, e tudo isso com a mão esquerda.

Após três toques a minha melhor amiga finalmente me atende.

“Oi!” Digo me erguendo nas pontas dos pés para ver qual é a próxima estação.

É a minha.

“Code”, ela grita do outro lado da linha. Fecho os olhos e afasto o celular dos meus tímpanos, “amanhã é o seu aniversário!”

“Eu sei.”

“Eu ando tão atarefada com o estágio e a faculdade que me esqueci completamente dele”, ela se joga no que parece ser uma cama, “precisamos comemorar, vamos comprar bebida e um bolo no mercado e vamos lá para casa.”

“Pode ser, chamamos os Gemini e Fourth?”

“Óbvio!” Ela se remexe, “vai ser tudo, vou mandar todos detalhes pelo grupo.”

“Tá bom, vou desligar.”

“Tá no trem?”

“Sim, beijos”, digo pressionando o dedo no botão vermelho e guardando o aparelho na minha bolsa transversal, “dá licença”, me abaixo para passar por baixo do braço de um senhor que parece ter uns quarenta anos, “deixa eu passar rapidinho”, passo por trás de uma garota que não parece ser tão mais velha do que eu, “obrigado” a agradeço antes de deixar o trem.

Solto um suspiro pesado me agarrando a alça da minha bolsa.

Após beber um gole de água, caminho até a escada que me leva para fora da estação.

Um vento gelado sopra o meu cabelo descendo por minha nuca e adentrando em minha camiseta, me fazendo virar.

Sinto que no breu da noite há alguém me observando, olho para direita e para esquerda. Com medo termino de subir os degraus e corro para fora da estação.

Graças as constelações minha casa não fica longe da estação, só destranco o cadeado em volta da minha bicicleta e pedalo até a moradia que cresci. Lembro-me que antes de completar nove anos, minha família se mudava constantemente, até que vinhemos para o interior e meus pais decidiram que aqui estaríamos seguros.

Com uma sensação similar a da estação, entro na escuridão que a minha casa se encontra.

Tudo normal, Barcode, ninguém vai querer sequestrar um pobre como você, repito em minha mente enquanto caminho pelo jardim.

Mamãe foi para a cidade vizinha ficar com vovó que adoeceu há algumas semanas e papai trabalha no exterior, então estou sozinho na véspera do meu aniversário.

Tranco as portas e janelas, acendo todas as luzes e com uma faca olho cada cômodo para ter certeza que estou só, e graças a mercúrio não há nenhum bandido aqui.

Sentado na beira da cama abro o grupo no WhatsApp para ver se dissipa a sensação de estar sendo observado.

Poclândia

Love sem amor 💔: Code faz dezoitão amanhã!!!!

Love sem amor 💔: Precisamos comemorar!!!!

Gêmeos: Na sexta feira 13??!

Gêmeos: Não vou nem sair de casa.

Gêmeos: E o Fot também não, foi mal Code.

Gêmeos: Alguém pesquisa no Google se dá azar fazer festa de aniversário na sexta feira 13.

Gêmeos: Tô na faculdade.

Vem de 4️⃣: Calma Gem, é só ficar longe de gatos pretos, escadas e essas coisas.

Gêmeos: O Code tem a Luf Luf, que é uma linda gata preta!!!

Love sem 💔: Não surta Gem, é o aniversário do seu amigo de infância você vai sim!!!

Love sem amor 💔: Aliás, tava pensando em fazer uma festa temática na sexta-feira 13.

Love sem amor 💔: Vou usar a minha fantasia de bruxa do Halloween passado.

Vem de 4️⃣: Você usou uma fantasia de abóbora no Halloween passado.

Love sem amor 💔: Eu jamais usei uma fantasia de abóbora.

Gêmeos: [foto]

Gêmeos: Essa aqui não é você?

Vem de 4️⃣: [vídeo]

Vem de 4️⃣: E essa no vidro girando com uma fantasia de abóbora não é você??!

Com uma risada que sai do fundo da minha garganta, o medo de estar sendo vigiado se esvai e deixo o celular de lado indo até a área de serviço e pegando uma toalha e indo até o andar de cima tomar um relaxante banho de banheira.

Com todas as luzes acesas e com a fumaça de incensos flutuando pelo ar, deito a minha cabeça na borda da banheira e fecho os meus olhos aproveitando a água quente.

A mesma sensação de antes na estação volta junto a barulhos de passos no andar a baixo, junto ao frio eu dou um pulo saindo da banheira me agarrando na toalha. Deixo o banheiro aos tropeços e corro para dentro do meu quarto trancando a porta.

Por todas as estrelas mortas, ainda bem que eu deixei as luzes acesas. Pego o meu celular que descansava na beira da cama e disco o número de emergência - da minha mãe.

“Oi, Code aconteceu algo?” Ela tende no primeiro toque.

“T-tem alguém aqui... tem alguém aqui mamãe!”

“Respire fundo, o papai já está indo para aí, se tranque no seu quarto e deixe as luzes apagadas.”

Antes que eu possa responder qualquer coisa as luzes piscam antes de se apagar de vez, as janelas trancadas todas se abrem em um baque junto às portas.

“Barcode, filho…” são as últimas coisas que escuto antes do sinal cair e a ligação se encerrar.

Os passos se aproximam, corro em direção ao closet que se fecha na minha cara, corro pra porta que dá em direção ao corredor, talvez eu consiga derrubar quem quer que seja, mas no entanto a porta volta a se fechar e a minha única saída é a janela onde corro me apoiando até o batente antes de recuar após ver a minha casa cercada por homens usando roupas pretas.

Que porra está acontecendo aqui?!

“Olá, Barcode”, diz a voz do homem que entrou em meu quarto.

Me and the Devil Onde histórias criam vida. Descubra agora