Foi numa primavera, lembro-me perfeitamente. Um final de tarde sereno, banhado de brisas com o aroma das cerejeiras que rodeavam o jardim da mansão Wright. Eu era apenas uma pequena criatura de seis anos de idade, sentada na grama fresca com meu vestido repleto de pregas rosadas, perguntando-me o quão enorme e laranja o sol poderia ser antes da lua se revelar.
- Você - uma voz impregnada de superioridade chamara-me, sendo um tanto fina. - Você é a tal Cristal?
Virei-me, fitando o garoto de cabelos negros e olhos assustadoramente azuis que franzia o cenho para mim. Usava uma bermuda da cor dos olhos acima dos joelhos esguios, uma camisa social sem mangas e um laço curioso na gola bem dobrada.
"Parece um marinheiro emburrado."
- Sou Cristal. Você é...?
O garoto baixinho dera uma bufada violenta, cruzando os braços. Franzi o cenho, desaprovando sua reação.
"Que garoto..."
- Não acredito que não sabe quem sou - rira, como se eu fosse obrigada a saber seu nome. Bufei mais uma vez.
"... Desagradável!"
- Ainda bem que não conheço você - murmurei, levantando-me, batendo na saia do vestido comprido, corrigindo a postura como a Sra. Brigs me ensinara.
- Sou Aquiles - rolou os olhos, abanando a mão pelo ar, esbanjando ignorância. Os nós dos meus dedos clarearam enquanto eu segurava meus pequenos e quase inúteis punhos raivosos, tentando não derrubá-lo na grama.
"Não me importa se você é Aquiles, ou 'aquilo', só sei que não importa o que você faça, sempre serei melhor que você, bobão!"
- Sabia que você é muito pequena, grão de arroz? - debochou, segurando a risada. Me vi vermelha de raiva, inchando as bochechas quentes.
"Quem é o grão de arroz aqui, seu marinheiro babão?!"
- Eu sou o filho dos Allen - dissera, pondo a mão no peito, orgulhando-se do título.
- E eu sou filha dos Wright - resmunguei. Ele riu fraco de mim, ainda tendo uma aura ameaçadora. - O quê você veio fazer aqui?
- Nossos pais estão criando uma empresa idiota - murmurou, passando a evitar contato visual. O garoto de pele pálida grudou os olhos nas minhas cerejeiras preferidas, descansando os olhos lá.
"Resolveu parar de me olhar só agora?"
- Mas isso é normal - sussurrei. - Eles trabalham nisso, por isso têm dinheiro.
- Meus pais me enviaram aqui - ele suspirou pela primeira vez, demonstrando desgosto da situação. Relaxei a expressão por um instante, baixando a guarda.
"O que ele viu nas minhas cerejeiras? Elas são minhas, eu as plantei."
- E daí? - Sussurrei, fitando a ponta das minhas sapatilhas.
- Eu também não sei - resmungou irritado, ainda fitando minhas cerejeiras. Franzi o cenho.
- Ei - murmurei. - Pare de olhar pras minhas cerejeiras.
- Está com ciúme delas? - Perguntou, olhando-me por cima do ombro. Engoli em seco.
"E se eu estiver? Que garoto chato."
- Certo, já vou indo - dissera, dando as costas rapidamente. - Só vim aqui conferir se tinha ganho alguma concorrência.
"Concorrência?"
- Perdeu seu tempo, posso ganhar de você em tudo - ri, debochando. Meu estômago revirava de fome. Agarrei as mãos atrás das costas, acalmando-me.
- Isso é o que veremos, seu grão de arroz - disse, retirando-se. Bufei, dando as costas.
- Não me chame de grão de arroz! - Ralhei, indo até a cozinha mais próxima.
Eu era mimada, respondona e apaixonada por liderança. Por incrível que pareça, era super dotada, sendo boa em qualquer matéria escolar, atividade extracurricular ou seja lá o que for. Podia tocar qualquer instrumento, escrever e ler todo tipo de gênero, absorvendo cada palavra, gravando-a para sempre. Mas, para a minha desgraça e irritação, Aquiles Allen também era um super dotado, porém competitivo e cheio de si, capaz de arranjar briga por qualquer coisa. Competimos a vida toda, por qualquer coisa, de ver quem chega primeiro à esquina, até o conhecimento geral de plantas carnívoras encontráveis na América Central. E para piorar tudo, eu nunca, uma única vez se quer ganhei, encadeando numa série imutável e frenética de brigas e competições. Onze anos após nossa primeira e irritante conversa, não consegui afastá-lo, ou se quer fugir dele. Acabávamos nos encontrando em alguma rua, viagem, ou até mesmo cemitério. Era assustador ver aquele rosto por toda parte, mesmo odiando-o com todas as forças. Aceitamos o fato de que no final acabaríamos nos vendo novamente, voltando à estaca zero, impondo uma única e fundamental regra: "Não crie gosto pelo seu rival."
___...___...___...___...___...___...___
NOTA: Olá! Quero agradecer a você que leu até aqui ( pq sinceramente, esse capítulo ainda está sem graça). Quero lembrar que todo tipo de opinião e crítica são aceitas. Elas são muito importantes para o desenvolvimento da história, assim como o seu voto também, ok? *-* Nos vemos no próximo capítulo ( que já está em desenvolvimento!) Ass. Grott.
VOCÊ ESTÁ LENDO
Os Benefícios do Ódio.
AcakDuas crianças destinadas uma a outra, se posso dizer assim. Os fatos, no final das contas, acabavam resultando numa fuga que só podia ser corrida em círculos, fazendo com que os dois acabassem reencontrando-se novamente. Eram como o pólo negativo e...