Velocidade

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             A noite parecia rasgar ao nosso redor enquanto o carro cortava a estrada em alta velocidade, com o vento forte uivando e o som do motor ressoando pelos meus ossos. O mundo ao nosso redor era um borrão de luzes, um contraste entre as faíscas de adrenalina e o ritmo furioso do coração.

Eu me segurava firme no banco do passageiro, mas meu olhar estava em Kyler.

             Kyler dirigia como se fosse invencível, um sorriso presunçoso nos lábios, enquanto suas mãos seguravam o volante com precisão e desprezo pelo perigo. Ele tinha um rosto marcado e uma expressão quase cruel. Seus cabelos pretos caíam em desordem pela testa, e os olhos negros como aquela noite eram profundos, cheios de um mistério sombrio e sedutor que fazia qualquer garota perder o fôlego.

A jaqueta dele, de couro surrado, tinha frases anarquistas rabiscadas em tinta branca: "Liberdade ou nada", "Caos e poder". Ele era o tipo de cara que parecia um desafio, uma promessa de algo errado e irresistível.

             Eu sabia o que todos pensavam dele — e de mim. “Daphne, filha do pastor, andando com o bad boy da cidade”, era o que os cochichos diziam. Mas eu não me importava. Eu era a garota escolhida, a garota que ele queria ao seu lado nas noites escuras e secretas como essa.

Nunca imaginei que fosse conhecer Kyler daquele jeito. Na verdade, nem sabia que alguém como ele podia existir.

            
           
                             × × ×

             Foi em uma tarde qualquer, logo depois de sair da igreja. Eu estava com algumas sacolas de doações, andando pela praça de volta para casa, sempre ajudava quem necessitava, fui criada assim, quando ouvi uma voz rouca e ligeiramente arrastada atrás de mim:

— Hey, garota da igreja, tem água aí?

             Me virei e dei de cara com ele, deitado despreocupadamente em um dos bancos, como se o mundo ao redor simplesmente não importasse. 
A primeira coisa que notei foi a jaqueta de couro, cheia de frases rabiscadas, como se ele próprio tivesse pintado palavra por palavra ali, proclamando sua visão de um mundo caótico.

Era um contraste completo com o ambiente tranquilo e pacato da praça e, sinceramente, comigo.

             Não vou mentir que eu hesitei, mas havia algo nos olhos dele, um cansaço ou, quem sabe, um tipo de tristeza escondida, que me fez entregar a garrafinha de água sem nem pensar. Ele se levantou devagar, pegou a garrafa e sorriu de um jeito inesperado, como se estivesse surpreso que alguém tivesse realmente parado para ajudar.

— Valeu — ele disse, tomando um gole e me encarando com aqueles olhos intensos, como se estivesse tentando me entender. Entrando na minha alma.

— Não há de que... — murmurei, completamente fora de mim.

O que eu estava fazendo ali, com um estranho, o tipo de cara que meu pai certamente me diria para evitar?

              Mas Kyler me observava de um jeito que fazia com que todos os alertas da minha mente simplesmente se calassem. E minha calcinha molhasse sozinha. Jesus Cristo! E antes que eu pudesse fugir, ele começou a falar comigo, um papo casual totalmente improvável, sobre o calor insuportável do dia, sobre o tédio que sentia na cidade pequena, e até sobre como ele não se encaixava em lugar nenhum.

Me vi rindo de coisas que nem eram tão engraçadas assim, presa por uma curiosidade quase magnética.

             Não sei ao certo como, mas em pouco tempo ele me envolveu naquele jeito dele, entre um sorriso despreocupado e uma provocação despretensiosa. Quando percebi, já tinha esquecido de tudo: das sacolas, da minha vida previsível, do que era certo ou errado. Naquele dia, sentada ao lado dele, eu me senti viva como nunca antes.

 ғᴏɢᴏ ᴇ sᴏᴍʙʀᴀ: contos Dark Romance Onde histórias criam vida. Descubra agora