VINTE E UM

Capítulo 5

(Shade)

Aperto o couro do volante com força, tenso com o silêncio do carro. Sempre amei o silêncio, não há algo que ache mais reconfortante do que não ouvir a voz de outro ser humano. Até com os meus irmãos, que consigo aturar e ter algum laço de amizade, acho extremamente cansativo ficar perto por mais do que algumas horas direto. Às vezes quando saio do clube, vou direto para a minha cabana e fico horas sem ouvir um único som que não seja da floresta ao meu redor. E é maravilhoso.

Porém, agora com ela ao meu lado, tudo o que queria é continuar a ouvir a sua voz. Ela tem uma voz tão melódica e suave, poderia ouvi-la para o resto da vida. Não sou um homem de muitas palavras, mas com ela vejo que serei obrigado a aprender a conversar, para instigá-la a falar. Gostaria de ouvir tudo e qualquer coisa que ela tenha a dizer, tenho certeza que a mente dela deve ser fascinante. Assim como todo o resto.

Arrisco um olhar para ela e sorrio quando a vejo com uma carranca encarando a paisagem pela janela. Acho que sorri mais nesses últimos minutos do que em toda a minha vida. Queria fazê-la continuar a falar, mesmo que seja para brigar comigo, mas não sei como. Nunca precisei ou quis fazer amizade, muito menos conquistar uma mulher. Em geral faço o contrário, tento manter qualquer pessoa bem longe. O que tenho de sobra em habilidades para matar, me falta em socializar. E me vejo frustrado pela primeira vez na vida em não conseguir expressar o que eu quero.

Estalo o meu pescoço e respiro fundo tentando me acalmar. Que porra está acontecendo? Tenho tentado racionalizar que merda eu estou sentindo, ou o que estou fazendo e não consigo. Simplesmente sei que tenho que pegá-la para mim antes que ela suma da minha vida. Agora, porque e para que, não faço ideia.

A desejo, é óbvio que a quero como nunca quis nada antes. E isso em si já é uma surpresa, já que o sexo oposto para mim sempre foi um aborrecimento para um fim. Nunca nem mesmo transei com uma mulher a encarando de frente, sempre me enervou ter contato visual durante uma foda. Em geral as viro de quatro, faço o que tenho que fazer e saio do quarto antes que precise dizer uma única palavra. Serve muito bem para mim, e para as mulheres que querem um tempo selvagem na parte ruim da cidade, também.

Entretanto, essa mulher ao meu lado me faz querer coisas que não sei como alcançar. Ela está entrando sob a minha pele como hera venenosa, se espalhando como se começasse a fazer parte de mim. Desde que a vi pela primeira vez não sei mais quem sou, porque tenho certeza que estava incompleto até então, e agora que a encontrei, serei um novo homem.

Isso é fodido e assustador pra caralho. Quando era uma criança indefesa, mesmo quando estava machucado ou me escondendo, eu nunca sentia medo. Sentia ódio, raiva, nojo, mas medo sempre foi algo que me faltou. Talvez porque achasse uma perda de tempo, já que eu sempre soube o que aconteceria quando eles me pegassem. Ou porque há alguma merda errada no meu cérebro e eu simplesmente não tenho nenhum sentido de autopreservação.

Mas ela me fez ter medo, essa mulher linda e delicada me apavorou de um jeito que nem mesmo a morte conseguiria. Ela acordou alguma coisa dentro de mim e sei que preciso estar ao seu lado para me curar. Preciso dessa luz que ela irradia, preciso que ela ilumine a minha escuridão, mesmo que eu a leve para as sombras no fim.

Nunca quis me aproximar de ninguém, e agora que não só quero como preciso, não faço ideia do que fazer. O que caralhos eu sei sobre mulheres? Sei que a mulher ao meu lado é perfeita, que tudo nela parece suave e bonito. Enquanto eu sou a porra de uma aberração. As palavras se repetem na minha cabeça com a mesma voz estridente de quando eu era uma criança.

- Fale. - digo com uma voz baixa e agressiva.

Posso sentir ela se virando para me encarar, mas não ouso tirar os meus olhos da estrada para encará-la de frente. Ela é como medusa, quando olho nos seus olhos eu me torno outra pessoa. Eu fico incontrolável e imprevisível, e esse não sou eu. Eu não perco o controle ou deixo sentimentos nublarem o meu julgamento.