Capítulo 6

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ATENÇÃO: Este capítulo contém partes que podem dar gatilho

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TW: Uso de drogas, agressão doméstica, uso de bebidas alcoólicas.

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Arthyom
2001, Criméia - Ucrânia

Criméia, inverno de 2001. A neve caía em flocos grossos, cobrindo o chão do vilarejo com uma camada espessa e fria. A casinha de madeira onde vivíamos rangia sob o peso da tempestade. A cada rajada de vento, o gelo se acumulava nas frestas das janelas e o ar frio se infiltrava, tornando impossível esquecer que ali, naquela casinha isolada, o inverno não era a única coisa que deixava o ambiente pesado.

Eu estava no meu quarto, enrolado em um cobertor fino, olhando para a janela onde a neve se amontoava. Era um alívio encarar a escuridão lá fora e ouvir o som abafado da tempestade, porque logo depois, os gritos abafados da sala tomavam conta de tudo, arruinando qualquer tranquilidade que o silêncio poderia me oferecer.

Minha mãe e meu pai discutiam outra vez. Eu podia ouvi-la pedindo, suplicando para que ele parasse, mas ele nunca parava. Quando meu pai bebia - o que, naquela época, era quase toda noite - ele voltava para casa como uma tempestade, trazendo com ele toda a fúria e frustração de uma vida mal resolvida. Ele sempre encontrava algo para gritar, um motivo qualquer para descontar o que guardava lá dentro. Eu já sabia, mesmo com apenas onze anos, que ele usava mais do que álcool para escapar, mas nunca ousava mencionar isso.

Um som seco atravessou a porta fina. O coração me deu um salto, e um arrepio de medo percorreu meu corpo. Era a voz dela que, mesmo em meio à discussão, tentava se manter calma, tentando proteger a si mesma e, de certa forma, a mim. Mas nada parecia contê-lo. Ele vociferava coisas que eu não compreendia completamente, mas conhecia bem o tom - sempre raivoso, sempre tentando diminuir qualquer esperança que pudesse nascer naquele lugar.

Fui até a porta do meu quarto e encostei o ouvido, uma tentativa inútil de saber o que acontecia, ainda que uma parte de mim preferisse não saber. No fundo, eu queria abrir a porta e fazer algo, qualquer coisa, para ajudá-la. Mas eu sabia que me colocar no meio seria arriscado, que um garoto de onze anos não tinha como enfrentar um homem que se tornava tão monstruoso.

Outra batida, um grito abafado da minha mãe, e eu senti um nó apertar no peito.

Em algum ponto, a casa voltou ao silêncio. Por um momento, tudo ficou tão quieto que eu me perguntei se ela estava bem. Hesitante, abri a porta e olhei pelo corredor. Ela estava lá, sentada na cozinha, um braço segurando o outro, o rosto marcado por uma expressão de cansaço e dor que eu jamais conseguiria esquecer. Ela me viu e tentou sorrir, mas seu sorriso era triste, quase como um pedido de desculpas.

Naquele instante, eu prometi a mim mesmo que um dia sairia dali, que a tiraria daquela vida, daquele ciclo de medo e violência. Eu não sabia como, nem quando, mas algo dentro de mim - uma raiva silenciosa, uma determinação que não sabia nomear - começou a crescer. Eu não era grande o bastante para enfrentá-lo, mas um dia seria.

Até lá, eu só podia me manter quieto e esperar.

Minha mãe estendeu a mão para mim, e eu fui até ela, sem hesitar. Havia um corte pequeno em sua testa, perto do olho, e uma leve mancha escura se formando no lado esquerdo do rosto. Ela tentou esconder, passando a mão sobre a pele machucada, como se pudesse apagar o que havia acontecido. Eu sabia que ela queria proteger meu olhar do que eu já entendia, mas algo dentro de mim endurecia um pouco mais toda vez que via aquela expressão dela.

-Está tudo bem, Arthyom-ela disse com a voz baixa, quase um sussurro.-Ele... não quis. É só o cansaço.

Aquelas palavras não tinham o menor efeito. Eu já conhecia seu discurso de desculpas, de suavizar o inaceitável, e também sabia que ela as repetia mais para ela mesma do que para mim.

Dei um passo à frente, determinado, e estendi a mão para tocar o rosto dela, os dedos hesitantes, quase com medo de machucá-la ainda mais. Ela segurou minha mão, e aquele toque era o único consolo que tínhamos naquele momento. Era como se aquele simples gesto de estarmos juntos, de ainda termos um ao outro, fosse a única coisa real ali.

-Um dia, a gente vai sair daqui, mãe-eu sussurrei, minha voz firme apesar da pouca idade.-Um dia, eu vou te tirar daqui.

Ela fechou os olhos, uma lágrima escorrendo silenciosa pelo rosto. Eu sabia que ela não acreditava, que aquela promessa soava como um sonho impossível, mas, dentro de mim, eu tinha certeza. Um dia, eu seria grande o bastante para protegê-la, para enfrentar qualquer coisa que tentasse nos prender naquela vida de dor e medo.

-Vamos limpar esse machucado-murmurei, tentando fazer algo, qualquer coisa, que me desse a sensação de que estava cuidando dela, ainda que fosse só um pequeno gesto. Peguei um pano úmido e limpei suavemente o corte. A cada toque, eu sentia uma mistura de raiva e tristeza se formando, um peso que parecia grande demais para um garoto da minha idade, mas que, de alguma forma, me fazia sentir mais forte.

Ela continuou em silêncio, apenas me olhando com um orgulho triste. Era como se, naquele momento, houvesse algo nos ligando que palavras não poderiam descrever - uma promessa mútua de que um dia tudo aquilo ficaria para trás.

Depois que terminei de limpar seu machucado, ela pegou minha mão novamente, segurando-a com mais força desta vez. -Você é forte, meu menino-ela disse, com a voz trêmula. -Mas não deixe que isso endureça seu coração. O mundo lá fora ainda tem coisas boas, e você merece conhecê-las.

Eu queria acreditar nela, queria imaginar um mundo onde a vida não fosse cercada por medo e dor. Mas, naquela noite, a promessa que eu fiz a mim mesmo se solidificou. Eu não sabia o que o futuro traria, mas sabia que, de alguma forma, eu encontraria um caminho. E, enquanto isso, cuidaria dela como ela cuidava de mim.

Assim, eu voltei para meu quarto e fiquei em silêncio, ouvindo o som da neve caindo lá fora. A raiva e a determinação queimavam no meu peito, um lembrete constante de que um dia, quando estivesse pronto, faria qualquer coisa para que minha mãe nunca mais tivesse que passar por aquilo.

 A raiva e a determinação queimavam no meu peito, um lembrete constante de que um dia, quando estivesse pronto, faria qualquer coisa para que minha mãe nunca mais tivesse que passar por aquilo

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Véi, tô com muita pena do arthyom 😭😭
Ele era só uma criancinhaaa

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