~Capitulo 3:O Abismo e as memórias do Passado⛰️

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Capítulo 3: O Abismo e as Memórias do Passado

A noite caiu rapidamente sobre o acampamento, e a fogueira estalava com o vento frio. Ayathzla, Valkyr e Eryka se sentaram em volta da chama, as sombras dançando sobre seus rostos. O treinamento de Hope havia terminado por aquela noite, e ela estava descansando em uma tenda próxima, exausta mas determinada.

Valkyr, com a lâmina ainda presa nas costas, olhava para a fogueira, mas seu olhar estava distante, como se estivesse revisitando algo do passado.

- A menina tem fogo, não posso negar. - Valkyr disse, quebrando o silêncio. Sua voz, normalmente áspera, estava mais suave agora, mas ainda carregada de algo que parecia... dúvida. - Mas não sei se é o suficiente para atravessar o abismo. Não basta querer. O abismo exige mais do que coragem. Exige alma.

Eryka, a mais calma e serena das três, tocou levemente a ponta dos dedos na lâmina da espada ao seu lado, sua expressão pensativa.

- Você não acha que é cedo para duvidar dela, Valkyr? Ela está aprendendo rápido, mesmo sem um treinamento formal. É claro que ela não tem as habilidades de um guerreira como nós. Mas, o que ela tem não se vê com os olhos. A determinação dela é diferente. - Eryka disse, seu tom suave, mas cheio de uma sabedoria difícil de ignorar.

Ayathzla permaneceu em silêncio, sua postura imperturbável enquanto observava o fogo. Mas, dentro de si, ela sabia que, em parte, Eryka estava certa. Hope tinha algo mais do que as habilidades de uma guerreira. Mas Ayathzla também sabia que não era o suficiente. O abismo era implacável.

- Ela tem algo, sim. Mas não sei se é o suficiente para sobreviver ao que vem depois de atravessar o abismo. - Ayathzla falou finalmente, sua voz carregada de uma melancolia quase imperceptível. - Eu... eu sei o que é atravessar o abismo. E o que ele tira de você.

Valkyr, que sempre foi direta, virou-se para Ayathzla, seus olhos fixos, inquisitivos.

- O que o abismo fez com você, Ayathzla? Você já atravessou antes. O que o abismo levou de você? - Valkyr questionou, seu tom desafiador, mas com um toque de preocupação.

Ayathzla fechou os olhos por um momento, como se estivesse se lembrando de algo distante. Ela puxou a capa em volta de si e, por um momento, parecia estar sozinha, de volta ao lugar sombrio que o abismo a havia levado.

- ... Ele não leva só o corpo. Ele leva tudo o que você é. Quando eu o atravessei pela primeira vez, fui uma jovem muito parecida com Hope. Cheia de sonhos, de fé, achando que poderia resolver tudo com minha espada e meu espírito indomável. Mas o abismo se alimenta de nossas fraquezas. Ele nos testa em maneiras que não podemos imaginar.

Valkyr olhou para Ayathzla, agora com uma expressão mais suave, mais contemplativa.

- E o que aconteceu com você? O que ele levou de você? - Valkyr repetiu, mais suave agora, talvez compreendendo a dor implícita nas palavras de sua amiga.

Ayathzla respirou fundo, como se estivesse sentindo o peso da memória. Ela olhou para o fogo, a luz refletindo nos seus olhos.

- O abismo não me tirou minha vida. Mas ele levou algo que eu nunca mais recuperei: a certeza de quem eu era. Ele me forçou a enfrentar meus maiores medos, minhas maiores inseguranças, e a lutar contra eles, até que eu me perdesse de mim mesma. Quando você atravessa, você não volta a ser a mesma pessoa. O abismo... ele muda tudo.

Eryka, com a sabedoria que vinha de uma vida de tranquilidade e paciência, deu um leve sorriso.

- O abismo não é só dor, Ayathzla. Ele também revela força. É preciso encontrar uma maneira de se reinventar. Hope pode não ser como nós, mas ela tem algo que talvez nenhuma de nós tenha tido na primeira vez que atravessamos: ela tem um propósito. E talvez seja isso que a mantenha de pé onde outras cairiam.

Valkyr olhou para Eryka, avaliando suas palavras. Depois, seu olhar foi novamente para Ayathzla.

- Se Hope realmente for capaz de atravessar, será porque encontrou uma razão mais forte do que qualquer espada ou força bruta. O abismo não perdoa, mas ele não pode matar o espírito humano. - Valkyr disse, agora com mais convicção.

Ayathzla permaneceu em silêncio, mas havia uma tensão em seus ombros, como se a luta dentro de si ainda estivesse longe de terminar. Ela sabia que o abismo era uma força muito maior do que qualquer uma de suas habilidades poderia imaginar. Mas o olhar de Hope, a jovem determinada, a fazia sentir que talvez houvesse algo mais em jogo. Algo que ela não poderia ignorar.

- Então, vamos prepará-la para o pior. Porque o abismo exige tudo. E não podemos deixar que ela entre nele sem saber exatamente o que está enfrentando. - Ayathzla concluiu, com um tom de resolução, como se tivesse tomado uma decisão difícil, mas necessária.

As três guerreiras ficaram em silêncio por um momento, refletindo sobre suas palavras, e sobre o peso que sentiam ao ensinar Hope sobre o que elas mesmas haviam vivido. O abismo não era apenas uma travessia física. Ele era a prova do que você estava disposto a perder.

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O dia estava caindo, e Hope subiu até um dos pontos mais altos da cidade. O vento batia forte contra seu rosto, e ela observava o horizonte, a vastidão do abismo à sua frente. As palavras de Ayathzla ainda ressoavam em sua mente, e o peso do treinamento parecia ter se instalado em seu corpo, tornando os músculos tensos e doloridos. Mas havia algo mais que pesava em seu coração.

Ayathzla apareceu ao seu lado, silenciosa como sempre, olhando para o abismo com uma expressão difícil de ler. Por um momento, as duas ficaram em silêncio, apenas ouvindo o som do vento e o estalar distante de galhos nas árvores.

Finalmente, Hope não aguentou mais o silêncio.

- Você não acredita que eu posso atravessar, não é? - Hope perguntou, a voz mais baixa do que ela gostaria.

Ayathzla a olhou por um momento, como se estivesse avaliando a sinceridade nas palavras de Hope.

- O abismo não é uma simples travessia. Ele não apenas desafia o corpo, mas exige mais do que você está preparada para dar. Você tem um coração forte, Hope, mas o abismo vai testar sua alma. Ele vai forçar você a olhar para as partes de si mesma que você nunca quis ver. E não sei se você está pronta para isso.

Hope olhou para o abismo à sua frente, seu estômago apertado com a sensação de um peso esmagador.

- Eu sei que vocês estão me treinando, mas eu percebo, Ayathzla... Eu sei que vocês não acreditam que eu posso atravessar. Eu não sou como vocês. Não tenho as habilidades de uma guerreira. Eu não sou forte como Valkyr, e não sou sábia como Eryka.

Ayathzla se aproximou mais de Hope, seus olhos suavemente fixos nela. Pela primeira vez, Hope sentiu uma vulnerabilidade nas palavras da guerreira, como se Ayathzla estivesse dividindo algo mais do que uma estratégia de batalha.

- Não é a força que importa, Hope. Não é o quanto você pode lutar. O abismo vai desafiar tudo o que você é. E quando ele fizer isso, você vai ter que escolher: o que você está disposta a perder? O que você está disposta a dar?

Hope olhou profundamente nos olhos de Ayathzla. Ela sabia o que a guerreira queria dizer. O abismo não se importava com a força física. O que ele queria era ver até onde você podia ir para manter sua humanidade.

- Eu não sei o que ele vai me tirar, mas eu preciso encontrar meu irmão. E vou fazer isso, não importa o que aconteça.

Ayathzla não disse mais nada, mas a maneira como olhou para Hope parecia indicar que, de alguma forma, ela havia aceitado o desafio da jovem. Talvez, no fundo, Ayathzla também acreditasse, de alguma forma, que Hope poderia atravessar. Mas, assim como todas as outras guerreiras, ela sabia que o preço a ser pago seria alto.

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