Posicionada no meio da quadra, eu me alongava calmamente aproveitando os primeiros minutos da manhã. Por ser muito cedo - o sol acabara de nascer - eu estava sozinha fazendo essa atividade, todas as outras ainda dormiam. Naquele momento estar só com meus próprios pensamentos era o que eu precisava, por isso decidi acordar mais cedo e vir começar o treino sozinha.
Para qualquer um que me observasse de fora, diria que eu estava bem, no meu melhor momento profissional, portanto sem motivos para angústia ou preocupações. Em partes, era verdade. Eu estava consolidada como ponteira titular da Seleção Brasileira e do Vakif, um dos melhores times da Europa. O caminho até chegar nesse lugar não foi fácil - nunca é para ninguém - mas consegui superar os obstáculos e me consolidar.
Entretanto, nem tudo são flores. Meus pensamentos e meu coração estavam constantemente em uma batalha silenciosa, criando uma angústia em mim que tinha nome e sobrenome.
Roberta Ratzke.
Conheci Roberta a alguns anos atrás, na minha primeira convocação para a seleção. Eu ainda jogava no Brasil e ela já estava na Europa, então nunca tínhamos tido oportunidade de ser apresentadas antes. Ela já tinha anos de seleção, então foi muito receptiva e prestativa comigo nas minhas primeiras convocações, sempre me aconselhando e guiando para o caminho mais adequado. Não foi difícil criar um vínculo de amizade com ela, era muito fácil ser amiga de Roberta. Ela era doce, gentil, firme e compenetrada. E naquela época também era comprometida com a Ana Beatriz.
Roberta sempre foi dedicada a tudo que fazia, não era diferente com o namoro. Embora fosse prestativa e amigável com todos, o centro do mundo dela era a Bia, ela não media esforços para estar com ela. Por isso, embora Roberta tenha sido minha primeira amizade na seleção, acabei me aproximando de outras meninas, principalmente Gabriela, Carolana e Rosamaria.
Eu não saberia dizer se eu era muito ingênua ou simplesmente muito burra e cega, mas eu nunca tinha notado nenhuma aproximação anormal entre Ana Beatriz e Natalia. Talvez por isso tenha sido um choque quando toda a história envolvendo elas veio à tona. Eu não era muito próxima de nenhuma das duas, então acredito que esse fator interferiu diretamente para que eu ficasse perplexa ao descobrir que as duas estavam tendo um caso embaixo do nariz de Roberta.
Ainda me lembro de procurar Roberta depois de saber de tudo e encontrá-la arrasada como nunca antes eu tinha visto. Lembro do seu olhar de tristeza, dor e decepção.
― Você também sabia? ― ela perguntou com um tom de voz duro.
― O quê? ― eu perguntei confusa com a frase e com o olhar que eu estava recebendo.
― Você também sabia o que as duas estavam fazendo? ― ela repetiu a pergunta. ― Também estava acobertando elas? ― completou.
― Roberta. ― Eu falei com a testa franzida na mais completa confusão.― Eu não faço ideia do que você está falando.
Ela me encarou por longos segundos, como se me avaliasse. Por fim, pareceu acreditar nas minhas palavras e, sem dizer nada, se jogou nos meus braços me dando um abraço apertado. Mais tarde, mais calma, ela me contou que aparentemente o caso entre as duas mulheres estava rolando a um tempo e algumas meninas da seleção sabiam, inclusive Gabriela. Isso chegou a causar um abalo na minha amizade com a ponteira, na minha cabeça era inconcebível alguém fazer mal a Roberta, ou contribuir para que isso aconteça.
A partir daquele momento, minha conexão com Roberta ficou mais forte, mais sólida e real. Pouco tempo depois eu me transferi para o Vakif e ela para o Thy, jogando no mesmo país nosso laço se fortaleceu, estávamos sempre juntas, seja fazendo passeios turísticos ou fazendo coisas do cotidiano.