Cidade dos sonhos.

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Conheci Olívia pela internet quando eu tinha 16 anos. Não era sempre que conversávamos, confesso. Ela sempre me chamava no chat em uma das minhas redes sociais e falávamos de como nos sentíamos e como havia sido o nosso dia. Conversa vai, conversa vem e viramos bons amigos. Hoje em dia, quando penso que nunca percebi que ela estava se apaixonando por mim, tenho vontade de voltar no passado e me dá umas belas tapas por ser tão lerdo.

Acho que uma das coisas que eu mais me arrependo é de não ter dado muita importância pra sua amizade no começo. Liv sempre mostrou que se importava comigo, ela sempre escutou todas as minhas trapalhadas amorosas, medos e anseios. Ela era incrível e eu nunca tinha percebido isso. Lembro-me a primeira vez que nos vimos. 

Depois de marcarmos e desmarcarmos várias vezes por conta do meu trabalho e ela com sua faculdade, nós marcamos um almoço em Nova York no restaurante do Cray. Eu estava ansioso o dia todo e sorria nervoso para as pessoas que eu conhecia enquanto cumprimentava-os na rua.   

Ao entrar no restaurante, vi-a no canto olhando pela janela e batendo o pé tão nervosamente que por um momento achei que a sola de sua bota iria quebrar. Ela não parecia real. Lembro de ter começado a rir quando pensei isso, mas ela não parecia a garota que eu via no Skype, ela parecia mais viva, mais sorridente. 

— Olá, Ben. – Ela sorriu e apoiou os cotovelos na mesa segurando seu rosto com as mãos. 

— Oi, Liv. — Sorri automaticamente e tudo a minha volta pareceu parar.

Foi como se tudo que havia planejado fazer depois tivesse evacuado de minha mente e ela fosse a única coisa que precisava da minha atenção. 

Aquele dia foi tão especial pra mim quanto pra ela. Nós andamos pelas ruas principais da cidade enquanto eu apresentava New York, já que ela nunca tinha conhecido a cidade dos sonhos. 

– Daqui a algumas quadras podemos chegar no Madison Square e... - Quando eu percebi que falava sozinho olhei pra trás e a vi com o rosto grudado na vidraça da famosa livraria da Susan. 

– Isso é um paraíso... Saiu o novo livro de Josh McDowell... – Ela sussurrou mais pra si mesma. Vi seus olhos brilharem e sorri; percebi que era difícil ler seus olhos naquela mesma hora, eles estavam escuros e misteriosos, um belo contraste com o castanho que ela costumava carregar olhar. 

– Quer entrar? - Perguntei ficando do lado dela. 

– Oh, não, não. - Ela voltou para a realidade - Estou sem grana pra livro. - Deu os ombros. 

– Ah, qual é. - Reclamei - Vamos, eu compro pra você! - Antes que ela falasse algo entrelacei nossos dedos e a puxei para dentro do estabelecimento. 

– Oi, Susan - Sorri para a ruiva do balcão e percebi que Liv estava encolhida mexendo os seus dedos em minha mão. 

– Em que posso ajudá-los? - Perguntou ela simpaticamente. Soltei a mão dela e apontei para o livro na estante. 

– Aquele dali. - Falei e olhei pra ela para que confirmasse, ela apenas concordou com a cabeça. 

– Vou pegar. - Susan falou enquanto virava. 

Liv abraçou seus braços e olhou para algum ponto neutro desviando do meu olhar. 

– Tudo bem? - Franzi o cenho com a mudança repentina de humor. 

– Nada. Não é nada. - Ela respondeu e foi andando para ver os outros livros.  

Susan logo veio e paguei o livro, antes que eu pudesse chamá-la ela apareceu do meu lado. 

– Vamos? - Ela suspirou. 

– Sim. - Concordei e coloquei minha mão em seu ombro e a abracei de lado. 

Conforme andávamos pelas ruas que ficavam cada vez mais movimentadas, percebi que ela estava estranhamente calada e olhava todos os prédios ao redor com  atenção enquanto segurava meu braço com as suas duas mãos. 

– I'm lost in the city of angels... -  Ouvi a cantarolar. 

– Acho que aqui é a cidade dos sonhos - Comentei e ela riu mostrando as covinhas que havia em seu rosto.

– Eu queria dizer isso pra você em outra hora, mas quanto mais rápido eu falar melhor... - Suspirei e Liv me olhou atentamente. Foi naquele momento que eu fiz a maior burrada da minha vida - Eu convidei a Jéssica pra sair.

Liv sempre foi uma péssima mentirosa quando se retratava em esconder algo dos outros, mas escondia muito bem quando era sobre seus sentimentos. Porém, as vezes esquecia que ela teve problemas emocionais no começo da adolescência e que sempre soube fingir muito bem seus sentimentos. 

Olívia não conseguia esconder os segredos de ninguém além do seus.

– Sério? — Ela sorriu largamente — Que bom! — Ela me abraçou forte. — Muito bom mesmo. Espero que vocês dois... - Ela desviou  olhar como se procurasse as palavras. — Deem certo! 

— Obrigado, Liv — Eu a apertei mais forte — Sempre soube que você me apoiaria. 

Sinto meu coração se apertar no peito ao lembrar que eu disse essas palavras a ela. Pra mim, Liv foi uma garota forte por ter sofrido muita coisa e segurado a barra, porém sempre terei desejo de protegê-la. Mas nunca vai ter chance, acusa minha mente e sinto uma jorrada de lágrimas descerem outra vez. Queria tanto voltar atrás e fazer tudo de novo, eu faria tudo certo dessa vez. 

Antes do meu encontro com Jéssica nos despedimos e ela voltou para Harrisburg, na Pensilvânia. Depois daquele dia nossas conversas foram cada vez mais diminuindo, conversávamos uma vez por dia, depois passou a ser uma vez por semana depois a cada mês. Foi quando comecei a sentir algo estranho por ela. Seis meses depois de nosso casual encontro, quando eu abri o Facebook, a primeira postagem foi que Liv estaria namorando sério com Jace Summers. Se isso tivesse acontecido há alguns anos atrás eu até a parabenizaria por finalmente ter seu primeiro namorado, mas a única coisa que eu senti naquele momento foi repulsa por aquele magrelo, loiro dos olhos azuis que a abraçava na foto.  

Eu nunca fui de discutir com Liv, por mais que sempre fomos de opiniões diferentes, eu evitava o máximo porque nunca dava em nada, éramos dois teimosos defendendo sua opinião como a própria vida. 

Naquele dia, entretanto, eu não pude evitar. 

Foi uma discussão besta, na verdade, eu reclamei que ela estava mais sumida e que não se mostrava a mesma de antes, - as pessoas ficam realmente idiotas quando estão com ciúmes - ela contrapôs dizendo que eu falava isso só porque ela finalmente começou a namorar e que eu fazia a mesma coisa com ela. Saímos brigados e eu senti como se estivesse quebrado. Nunca me ocorreu ficar tão deprimido por causa de uma amizade, mas ela era importante pra mim. 

Santo Deus, ela ainda é importante pra mim! 

Abri uma das gavetas que havia em meu escritório e encontrei a única foto juntos que eu tinha. Na verdade, essa foto foi tirada no casamento de um casal amigo meu, Joseph e Alyna, que por coincidência era amiga de infância de Liv. Na foto, estávamos todos juntos com seus pares ao lado do casal de noivos e eu segurava Olívia pela cintura enquanto sorriamos. Eu nunca vou esquecer aquele sorriso. 

Fico pensando, a vida é tão frágil não é? Nós agimos como se fôssemos imbatíveis a maior parte das nossas vidas, dizemos "quem manda na minha vida sou eu!" mas no final não é assim. Nós não mandamos na morte, a qual pode influenciar nossas vidas. 

Se Arrependimento MatasseOnde histórias criam vida. Descubra agora