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No pequeno refeitório, o grupo de Mon tinha um ritual: dividir sempre a mesma mesa, como se aquele pedaço de madeira fosse um território sagrado. Mon, com sua posição de líder, usava sua influência para garantir que as amigas tivessem o mesmo horário de intervalo. Isso causava certa inveja entre as outras colegas, principalmente as mais jovens.
Mas Mon não se importava com os olhares atravessados. Sua verdadeira preocupação era outra: o grupo estava desfalcado.
Bunny, a alma apocalíptica da turma, havia sido transferida temporariamente para o turno da manhã para cobrir uma ausência. O refeitório, sem sua energia contagiante, parecia mais silencioso, quase sem graça.
Um mês se passou até que Bunny retornou – e não voltou sozinha.
Durante sua ausência, Bunny havia encontrado um novo eixo gravitacional: Sam.
Desde o primeiro encontro, parecia que os neurônios das duas haviam se conectado como peças de um quebra-cabeça.
Sam logo apelidou Bunny de “Revolucionária” por conta de suas ideias grandiosas e quase utópicas sobre a vida. Bunny, por sua vez, descrevia Sam como uma “Marginal” – um termo que parecia mais elogio do que crítica.
Lucky, com seu olhar analítico e sempre pronta para colocar apelidos precisos, apelidou Sam de “Garota Bad Boy”. O apelido surgiu no dia em que viu Sam chegar antes do expediente, vestindo um boné de aba reta, jeans rasgados e tênis surrados, como se tivesse acabado de sair de uma pista de skate.
Sam tinha um carisma natural, quase magnético. Seu estilo despojado e atitude ousada cativavam quem cruzasse seu caminho – ou pelo menos quase todos.
Para Mon, Sam era apenas uma sombra incômoda na troca de turnos. As duas mal trocavam olhares e, de longe, pareciam incapazes de se cruzar sem alguma faísca.
Bunny, no entanto, mergulhou de cabeça na amizade com Sam. As duas passaram um mês inseparáveis no turno da manhã. E quando finalmente voltaram para o turno da tarde, Sam veio como um “brinde”, agora parte oficial do grupo. Para o desgosto de Mon.
Mon era pacífica, educada e devota seguidora das regras. Sam era seu oposto: desafiadora, destemida e com uma língua afiada que não poupava ninguém. Sam não tardou a apelidá-la de “Madre Teresa”, um apelido que pegou rápido no grupo. Já Mon, sempre que mencionava Sam, fazia questão de chamá-la de “Marginal”.
A primeira interação real entre as duas foi, ironicamente, no estacionamento da loja – o campo de batalhas verbais mais comum do grupo.
Sam falava em gírias, soltava um palavrão ou outro, sempre com uma postura que Mon considerava irritantemente masculina. Era como se a presença de Mon a provocasse ainda mais. Mon começou a evitá-la, mas parecia que o universo conspirava para colocá-las lado a lado, como um jogo cruel.
Lucky, sempre mediadora, defendia Sam:
— Você se irrita à toa. Ela só gosta de te provocar porque acha graça no seu jeito certinho.Mon não admitia, mas talvez Lucky estivesse certa.
Então, um dia, o destino deu seu golpe mais certeiro. No refeitório, todas as mesas estavam ocupadas, exceto uma única cadeira. Ao lado de Sam.
Mon segurava a bandeja com uma expressão de derrota. Respirou fundo, como quem marcha para um campo de guerra, e se sentou ao lado de sua "rival".
O silêncio reinou por alguns minutos, mas o clima era tenso. Mon mantinha os olhos baixos, mas era como se pudesse sentir o olhar de Sam queimando em sua direção.
— Eu não mordo, sabia? — Sam começou, mastigando com um sorriso cínico enquanto olhava para o próprio prato. — A menos que você peça, claro. Aí eu posso pensar no caso.
Mon arregalou os olhos, sentindo o rosto esquentar instantaneamente. Tentou se concentrar na comida, mas parecia que o garfo pesava uma tonelada em sua mão.
— Eu... Eu não pedi nada — murmurou, a voz baixa e quase engasgada, evitando olhar para Sam.Sam riu, aquele riso rouco e provocador que parecia ecoar mais alto do que deveria.
— Relaxa, Madre Teresa. Tá escrito na sua testa. "Por favor, me provoque".Mon levantou os olhos, encarando Sam por um instante, mas logo desviou, fingindo ajustar o cabelo.
— Você tem mania de interpretar o que as pessoas não dizem?— Só quando é divertido — Sam retrucou, inclinando-se ligeiramente na direção dela, como se quisesse diminuir a distância entre as duas. — E, no seu caso, é mais do que divertido. É irresistível.
Mon engoliu seco, tentando manter a compostura.
— Talvez você devesse tentar ser menos... irritante.Sam arqueou uma sobrancelha, claramente se divertindo.
— E talvez você devesse tentar ser menos certinha. Quem sabe até deixa de ser tão previsível.— Previsível? — Mon retrucou, cruzando os braços e esquecendo momentaneamente da comida. — E o que exatamente você acha que sabe sobre mim, sua...marginal?
— Mais do que você gostaria que eu soubesse — Sam disse com um sorriso lento e malicioso. — Tipo, como você fica tentando parecer indiferente, mas está morrendo de curiosidade sobre mim.
— Curiosidade?! — Mon soltou uma risada nervosa, sentindo o calor subir novamente pelo pescoço. — Você se acha demais.
— Não é questão de me achar, é questão de perceber. — Sam apoiou o cotovelo na mesa e o queixo na mão, observando Mon como se estivesse decifrando um enigma. — Você cora cada vez que eu chego perto.
Mon se irritou, pegando o garfo novamente e espetando a comida com mais força do que o necessário.
— Eu só coro porque você fala coisas absurdas.— Ah, claro — respondeu Sam, rindo baixo. — Deve ser isso.
O silêncio pairou por um momento, mas Sam o quebrou novamente, dessa vez com um tom mais suave:
— Relaxa, Mon. Eu só gosto de mexer com você porque você é... diferente.Mon ergueu os olhos dessa vez, surpresa com a mudança de tom.
— Diferente como?Sam deu de ombros, mas seus olhos estavam fixos em Mon.
— Diferente de todo mundo aqui. Você leva tudo tão a sério. E isso me deixa... curiosa.Mon não soube o que dizer. Sentiu um misto de irritação e algo que não conseguia nomear. Apenas voltou a olhar para o prato, enquanto Sam voltava a mastigar tranquilamente, mas com um sorriso que Mon podia sentir mesmo sem encarar diretamente
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Second Chance - MonSam
FanfictionO que você faria se tivesse uma segunda chance? Faria tudo diferente? Mudaria algumas coisas? Ou só aproveitaria cada momento com mais intensidade?