Era por volta do fim da tarde e o dia não poderia estar mais lindo: o Sol, se pondo contra os entornos da estrada, deslizava sorrateiramente entre os morros altos e repletos de relva, diluindo sua luz dourada através das folhas espessas das árvores e troncos velhos e cumpridos. O céu se tingia no horizonte com uma pigmentação parte alaranjada, parte rosada, marcando enfim o termino daquele meu longo dia de negócios, e iniciando o que seria uma maravilhosa noite curtindo o que eu mais gosto: a estrada; acelerar o máximo possível, tacando o foda-se pro limite de velocidade, enquanto sinto o vento se chocando no parabrisa e escorrendo pelos vidros abertos do meu chevrolet, invadindo o carro com força e fazendo com que meus cachos chacoalhem vorazmente e a brisa acentue a adrenalina crescente que percorre por minha veias.
É o tesão da juventude isso, poder sentir a vida palpitar no peito, sufocando a mente num sentimento puro e verdadeiro de "cara, como é bom estar aqui". A real é que a minha vida é, nesse momento, essa estrada e o que tem do outro lado dela: uma pequena cidadezinha, onde mora um pequeno rapaz, onde nós dois juntos vamos, finalmente, nos conhecer e formar (o que eu espero) um pequeno casal do qual vai passar os próximos pequenos meses ou anos juntos, até podermos formar uma pequena família, tão pacata e perfeita que o mundo pareceria um local pequeno demais para nós dois. Pelo menos ''e isso ou curtir umas fodas e o nosso tempo junto paquerando — e tanto faz pra mim; o importante é estar com ele.
Liguei o rádio e girei o sintonizador até cravar em alguma frequência que funcionava aqui, perto do meio do nada. Chiado, chiado, alguém chiando, chiado e, então, uma voz abafada, encontrando luz no meio de uma pequena cacofonia de estática. A voz de uma mulher de gogó aveludado começou a tagarelar sobre o quanto que qual tal banda fez história, dizendo que não sei qual música fez sei lá quantos discos e algum cara de não sei onde fez sei lá o quê. Eu francamente não me importava, só precisava ouvir alguém falando se não entraria num surto pensando no homem dos meus sonhos.
Ah, como é belo o amor!
Foi num fim de tarde como esse que eu, deitada na minha cama depois de um dia trabalhoso, peguei meu celular e vi sua postagem. Ele era, tipo, aquele cara amigo de um conhecido de internet que, por algum motivo que não sei, me seguia no insta. Era só um cara aí, mas deslizando o feed, cheio de tanta baboseira de gente chique, ele colocou a foto de um cachorrinho que era uma fofura que só, dizendo na legenda: "esse meu cachorro procura cadelas para procriar. Interessados mandem mensagem na dm. Ele cozinha bem, é charmoso, gosta de trocar papo, se considera bonito e até que é bom de cama. Pelo menos ninguém nunca reclamou. Ele oferece também um vale encontro gratuito com direito a pagar a conta (contanto que não extrapolem na comida, né), uma sobremesa marota, cineminha e aquele beijo no final, mas só se você quiser." Na hora eu pensei "sério, que cara bobo", mas, rindo, entrei no perfil dele pra xeretar.
Era simplesmente um compilado de piadas, flertes destinados à absolutamente qualquer um que fisgasse a ideia, uma ou outra foto de memes nada a ver e, por fim, um vídeo dele rebolando o traseiro ao som de barbie girl no topo de um palco de um cabaré enquanto, de fundo, o que eu imaginava ser os amigos deles aplaudiam e jogavam dinheiro. Ele então parou, deu uma pose extravagante de "vocês, reles mortais, até que estão me divertindo" e piscou pra câmera na maior cara de piranha possível.
Sério, que cara besta!
Eu ri em todo o processo descendo o seu perfil, e quando chegou nessa parte, nessa piscadela, nessa cara imperdoavelmente fofa, eu não consegui ter outra atitude que não seja ir até aquele primeiro post e mandar uma foto minha com filtro de cachorro; na mensagem tinha escrito: "tenho uma cachorrona aqui em casa em busca de macho reprodutor. Ela trabalha, toma banho uma vez por semana e adora filmes estúpidos e piadas sem graça. Não come o próprio cocô e só de vez em quando cheira a bunda dos outros. Se estiver interessado, ela vai estar livre no sábado." E agora eu estou aqui, dirigindo até o nosso primeiro encontro.
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HISTORIETAS DE HORROR [série de contos]
Historia CortaA cada novo dia, um novo conto escrito na hora - essa é a minha meta, pelo menos no próximo mês. Boa leitura e fique bem.