Minha barriga solta um ronco. Eu estava com fome, mas disfarcei para que ele não notasse. Aposto que ele não percebeu; acho que só eu escutei. Ele vira os olhos para mim e diz: _Vamos arranjar alguma coisa para comer._ Concordo com a cabeça. Deve haver frutas pelas árvores.
_— Não, não, tá tudo bem. Cuida dos outros, pode deixar isso comigo, Haruka,_ diz Tamuro, com um sorriso confiante.
_— Ok, tudo bem,_ respondo, embora me sinta desconfortável. Afinal, eu sou a líder aqui! Quem disse que esse garoto pode me dar ordens? Uma expressão furiosa se instala em meu rosto. Sento na pedra mais alta da cachoeira, pego um pedaço de graveto e começo a desenhar. Não sei por que, mas sou sempre tão distraída com tudo que toco. O tempo passa e minha concentração se prende àquilo que estou fazendo.
_Haruka,_ uma voz suave, com um eco lento, surge pela esquerda, acompanhada pelos ventos gelados da cachoeira. Me assusto e me pergunto: _O que é isso?_ Respondo à voz misteriosa: _Quem está aí?_ Olho para todos os lados, mas não vejo nada. O que está acontecendo?
Os dois saem pela cortina d'água. _Oi, Haruka,_ diz o menino que conheci mais cedo. A pequena Hana segura a mão desse menino. Da pedra, o encaro fixamente.
_— Qual seu nome, garoto?_
_— Takeshi, tenho 10 anos,_ ele responde, com um brilho nos olhos.
_— Tá bom,_ digo. _E qual sua idade, Haruka?_
_— Tenho 8 anos,_ respondo, olhando com um olhar sério em sua direção. Ele me olha com um sorriso sem graça, e em meus pensamentos, digo: _Posso estar em desvantagem, mas não vou perder para vocês garotos. Eu sou a líder aqui e a responsável por vocês._
Takeshi olha para mim e pergunta: _Tá tudo bem, Haruka? Você está me olhando com essa cara feia. Falei alguma coisa que te deixou chateada?_
_Viro meu rosto, seguindo em direção à mata._ _Cuida da Hana, tá bom?_ afirma ele, com um tom de preocupação.
Na floresta, os sons de pequenos grilos e sapos ecoam ao nosso redor. Dou um grito, um pouco mais alto do que o normal: _Tamuro, cadê você?_
Um vento gelado cobre meu corpo, arrepiando meus braços. _Tamuro, cadê você?_ Uma voz surge, mas é profunda, vinda do fundo da floresta. _Para de gritar, garota, eu tô vivo,_ diz ele, com um tom de certeza que me acalma um pouco.
_— Eu não quero saber sobre isso! Quero saber se você já conseguiu a comida!_
_— Só espera lá com eles, menina! Já falei,_ responde ele, e sua voz é firme.
Fico bem furiosa com a resposta dele. _Garoto abusado! Fique sabendo que eu conseguiria pegar mais frutas que você se eu fosse aí sozinha,_ murmuro, baixinho, mas com determinação. Ao me virar, meu corpo se arrepia. Meu coração gela ao ver uma criatura esquelética, como se seu corpo estivesse carbonizado pelas chamas, me abraçando forte, emanando uma aura sombria.
_Filhaaa, que bom que está segura,_ diz uma voz com um tom calmo e rouco. Outra criatura aparece atrás de mim, me abraçando com toda a força. Eu não sei o que fazer e como me livrar; meu corpo fica paralisado e eu não consigo me mexer, apenas os encaro. _Será que vão me matar?_
Meu corpo se arrepia. De repente, a pele da criatura descasca, mostrando uma camada dourada. A pele cai no chão e se transforma em fumaça cinza. Ao olhar novamente para esse ser, o rosto de minha mãe se revela. Ela está tão jovem e tão linda. Olho para trás e vejo meu pai, chorando. As gotas de lágrimas dele são douradas e brilhantes. Não consigo suportar.
_— Mãe, pai, que bom que vocês estão vivos! Eu pensei que tivessem morrido._ Eles não falam comigo. Tento novamente me comunicar com eles. _Mãe, por favor, pai, me respondam!_ O desespero toma conta de mim. Eles começam a brilhar fortemente, como os raios de sol.
_— Filha, viva por nós,_ foram as últimas palavras de meus pais.
_— Mãe, pai, por favor, voltem aqui! Mãe, pai, eu não aguento a dor!_ Choro sem parar. Meus gritos de tristeza fazem Takeshi e Tamuro correrem desesperados atrás de mim.
_— O que aconteceu, Haruka?_ pergunta Takeshi, com uma expressão preocupada. _O que aconteceu, garota? Por que você está chorando?_
_Vozes surgem por todos os cantos._ _Tamuro,_ grita, _pai!_ Takeshi clama: _Mãe!_ O desespero deles e de Hana cresce a cada instante. Eles choram sem pensar. Todos aparecem em volta de nós, com a pele dourada, e abraçam seus filhos com toda a paixão e amor que sempre tiveram. O pai da pequena Hana a pega no colo, beijando sua testa, enquanto lágrimas escorrem de seus olhos.
As lágrimas de ouro e o choro deles de desespero se repetem como um eco do que acabei de fazer. _Por que?..._
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Cicatrizes de Vingança
AcciónEm um mundo sombrio e impiedoso, onde o país de Hanamori é dominado por um cruel general, encontramos Haruka, uma jovem camponesa que viu sua vila ser varrida impiedosamente por Shougon, o sanguinário líder do exército do general. Haruka cresceu na...