002- Distância

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Kally permaneceu estática por alguns instantes após ouvir as palavras de Rachel. Não me toca. Era como se o chão tivesse desaparecido sob seus pés, deixando-a cair em um abismo de insegurança e dor. As mãos, antes estendidas para tocar a mulher que amava, agora tremiam, como se o simples gesto tivesse se transformado em algo proibido. O coração, que já galopava com intensidade, parecia ter parado, substituído por um aperto que subia até a garganta.

— Como é que é? — Kally finalmente quebrou o silêncio, a voz baixa, quase inaudível, mas carregada de incredulidade.

Rachel não respondeu imediatamente. Estava de costas, os ombros tensos e as mãos apoiadas no balcão da cozinha. Ela parecia tentar manter o controle, mas a linha firme de seus ombros revelava que também estava prestes a desmoronar.

— Você ouviu — respondeu Rachel, a voz fria e autoritária. Ela não se virou, mantendo os olhos fixos no mármore à sua frente.

Kally sentiu o rosto esquentar, mas não era mais vergonha ou confusão; era raiva. Aquilo não fazia sentido. Não podia fazer sentido. Ela deu um passo à frente, recusando-se a deixar a situação terminar assim.

— Não. Não ouvi direito, Rachel. Porque eu sei que você não pode ter dito isso — insistiu, sua voz mais firme agora, embora ainda carregada de emoção.

Rachel finalmente se virou, e Kally desejou que ela não tivesse. O olhar da mulher era gélido, uma muralha de indiferença que parecia intransponível. Aquilo não era a Rachel que Kally conhecia, a Rachel que ria das piadas sem graça dela ou que a abraçava em silêncio quando as palavras falhavam.

— O que você quer que eu diga, Kally? — A loira cruzou os braços, a postura defensiva e agressiva ao mesmo tempo. — Que está tudo bem? Que eu não estou irritada? Porque não está, e eu estou.

Kally piscou, surpresa com o tom, mas não recuou.

— Você está irritada comigo? É isso? — perguntou, a voz mais alta, tentando penetrar a frieza de Rachel. — Porque, se for, então pelo menos tenha a decência de me dizer o motivo!

Rachel riu, um som curto e vazio que só aumentou a dor no peito de Kally.

— Decência? — repetiu Rachel, balançando a cabeça. — É isso que você quer? Uma explicação?

— Sim! — gritou Kally, a frustração finalmente explodindo. — Porque eu não aguento mais, Rachel! Não aguento mais você me tratar como se eu fosse um peso, como se tudo o que fizéssemos juntas fosse uma obrigação para você.

Rachel deu um passo à frente, a postura rígida, os olhos brilhando de algo que parecia mais próximo de dor do que de raiva.

— E talvez seja, Kally! — disparou, a voz subindo de tom. — Talvez tudo isso... nós... seja demais.

O ar pareceu desaparecer da sala. Kally abriu a boca, mas nenhuma palavra saiu. Ela encarou Rachel como se tivesse levado um golpe no estômago, tentando processar o que tinha acabado de ouvir.

— O que você está dizendo? — perguntou, finalmente, a voz baixa e trêmula.

Rachel suspirou, passando as mãos pelos cabelos em um gesto que denunciava a luta interna que estava travando. Quando voltou a falar, sua voz estava mais controlada, mas ainda carregada de algo afiado.

— Estou dizendo que talvez você precise entender que eu... eu não sou tão perfeita quanto você acha que eu sou. — Ela desviou o olhar, como se a ideia de encarar Kally fosse insuportável.

— Quem disse que eu espero perfeição de você? — retrucou Kally, a mágoa evidente em cada palavra. — Eu só espero que você confie em mim.

Rachel riu novamente, mas dessa vez era uma risada amarga, quase cruel.

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