Capítulo 02 - Daniel

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Porra! Eu não esperava vê-la aqui, hoje. Não assim, nessa loucura e... Bêbado. Droga! Pensei que levaríamos mais tempo até nos encontrarmos. Eu até faltei à aula inaugural de português para não encontrá-la em um lugar onde não pudéssemos conversar com calma. Não passou pela minha cabeça que ela viria à festa. Depois de tantos anos num colégio interno na Suíça, ela deve ter um bom motivo para ter aparecido aqui já que nas férias, enquanto todas as alunas iam visitar a família, ela preferia ficar lá. Sozinha.

Talvez tenha sido aquela amiga que a convenceu. Não! Marina não se deixa convencer a fazer o que não quer, é algo maior. De que problemas elas estavam falando? Eu preciso descobrir! Foi isso que me trouxe ao Rio. Foi por isso que desisti de Nova York.

Vou até a geladeira e pego outra cerveja. Nem me afasto, pois a bebo rapidamente e já pego mais uma.

Ela não foi até sua mãe. Ela não superou o que aconteceu.

Depois de quase um ano recebendo as visitas de Marina, eu já a conhecia como ninguém, mesmo que não conversássemos muito (quase nunca, na verdade). Tá! Isso é meio constrangedor, mas eu confesso: eu não tinha sossego quando ela estava em casa. A presença dela tomava conta de tudo, o perfume, a música que ela costumava ouvir e deixava a minha mãe louca (e era exatamente por isso que a ouvia), as conversas intermináveis com os amigos de Goiânia ao telefone. Eu estava ciente de tudo o que ela fazia, dizia e até pensava.

Para mim, ela é completamente transparente. Eu sei quando está irritada, porque o rosto fica vermelho e ela fecha os olhos com força para se controlar. Quando o cabelo está preso no topo da cabeça, com uma caneta ou qualquer outro objeto pontudo, é porque algo a preocupa profundamente. Ela odeia prender o cabelo, então só algo muito sério para fazê-la não se dar conta do que fez. Se ela estiver mordendo o lábio inferior, significa que quer sorrir, mas não quer que percebam.

Não era para menos, eu era um adolescente que, do dia para noite, passou a ter uma garota no quarto ao lado. Qualquer um ficaria maluco com a presença dela. Todos os meus amigos, por exemplo, não suportavam as próprias irmãs. Diziam que elas os deixavam loucos. É a mesma coisa, só que eu não tive a infância toda para me adaptar.

Marina não estava feliz com o casamento dos nossos pais e nunca conseguiu disfarçar isso. E eu não posso culpá-la, já que era óbvio para todos que minha mãe estava envolvida com Luiz Carlos antes da sua separação, e isso não me deixa nem um pouco confortável até hoje. As discussões com a minha mãe, que nunca facilitou para o lado de Marina, eram constantes, e acho que a raiva que ela sentia respingava em mim. Eu também não me esforcei em me aproximar dela. Caramba! Eu era apenas um moleque no meio de uma crise familiar, que não tinha ideia do que fazer. Queria ajudá-la, mas não vou mentir ― Eu tinha medo da Marina. E tinha medo de enfrentar a minha mãe também.

Me lembro, entretanto, quando tudo mudou. Era o fim de semana do meu aniversário de dezoito anos. O fim de semana que mudou a vida de nós dois.

Marina já não ia com tanta frequência a São Paulo. Sempre inventava uma desculpa e minha mãe adorava isso, pois não teria que cruzar com a cópia fiel da sua adversária. Marina era a cara da mãe, e isso irritava a minha. Não a conheci pessoalmente, mas mesmo em fotos, era evidente a semelhança, com exceção dos olhos azuis, que foram herdados do pai. Marina é loira, de estatura mediana, com curvas nos lugares certos e elegante como poucas mulheres conseguem ser. Uma elegância difícil de descrever, porque está no andar, no modo de agir e até no olhar. Eu sabia que a mãe dela também era assim, e sabia que era exatamente isso que fazia a minha própria mãe sentir-se ameaçada.

Infelizmente, mamãe não permitiu que Marina estivesse ausente na festa do meu aniversário, e infernizou o pai dela para que a forçasse a vir. Talvez as coisas tivessem acontecido de outra maneira se ela nunca tivesse viajado até São Paulo. Minha mãe não queria a família reunida ou algo do tipo. Eu a amo, mas não posso negar que imagem é tudo na sua vida. Mostrar uma família perfeita era o que importava, e ela não suportaria imaginar os comentários das pessoas sobre a filha de Luiz Carlos Alcântara não aceitar sua nova esposa.

Marina veio com tanta raiva de Goiânia que, pela primeira vez em mais de um ano, resolveu expor seus sentimentos para o pai. E eles brigaram feio. Ela gritou, chorou e chegou a esmurrá-lo quando percebeu que ele não cederia. Luiz não conseguia ver o sofrimento de Marina como eu via. Sem forças para continuar, ela saiu correndo do escritório e foi para o seu quarto. Pude ouvi-la implorar à sua mãe para vir buscá-la. Nunca vi Marina daquele jeito, tão desesperada. E acredito que nem a sua mãe, porque duas horas depois, quando Marina já dormia exausta de tanto chorar, recebemos aquela ligação, que fez desaparecer a Marina que eu conheci.

A Dra. Maria Júlia Paz, mãe de Marina, havia sofrido um acidente fatal enquanto se dirigia ao aeroporto de Goiânia, onde pegaria um voo para São Paulo.

O próximo avião para Goiânia só sairia às seis da manhã. Nessa época, o Luiz ainda não tinha um jatinho. Enquanto isso, Marina chorava sozinha no seu quarto. Aquilo era insuportável para mim, e fiz algo que já devia ter feito há muito tempo. Entrei no seu quarto sem bater na porta nem dizer qualquer coisa. Enquanto chorava, Marina me olhava do sofá-cama, surpresa. Fui até ela e a abracei. Até aquele dia, nunca havíamos nos tocado, e isso só voltou a acontecer hoje, quando nos chocamos nos degraus da escada do apartamento que o Luiz Carlos comprou. Ele ficou tão feliz quando disse que finalmente seguiria seus planos para mim, que fez questão de me presentear com o loft e um Range Rover. O que ele não sabe é que não fiz isso por mim, muito menos por ele.

Marina chorou pelo que pareceram horas nos meus braços. E então ela parou, se afastou e me olhou nos olhos. Desesperança era tudo o que eu podia ver nela.

― Estou sozinha, não tenho mais ninguém. Meu Deus! Eu matei a minha mãe e estou sozinha no mundo. Não tenho para onde ir. Eu não...

Segurei seu rosto com as duas mãos e a interrompi.

― Foi um acidente! Ouviu bem? Um acidente! E você não está sozinha, eu estou aqui com você, entendeu?! Eu sempre estarei com você. Vou ser o irmão que você precisa e que nunca fui.

Eu não sabia se poderia ser o que estava garantindo, mas eu queria e faria tudo para não quebrar a minha promessa. Eu faria tudo por ela naquele momento e ainda farei.

― Irmão? ― Seu olhar perdeu um pouco o desespero, mas perdeu um pouco de intensidade também. ― Você não vai me deixar sozinha?

― Nunca, Marina.

Conversamos por horas naquela noite, sentados no chão, sob a luz da lua que entrava pela janela. Conversamos sobre tudo: minha paixão por música, nossos planos para faculdade. Tudo, exceto sobre o assunto que não deixou as nossas mentes um segundo sequer: Marina perdera a mãe e se sentia responsável por isso. Nós dormimos abraçados, a cabeça de Marina apoiada no meu peito. No entanto, quando acordei, ela já tinha ido embora e nós nunca mais nos vimos. Até hoje.

Eu preciso de outra cerveja.

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Boa noite, meus amores! Eu estava super ansiosa para postar, por isso mal deixei o Sábado chegar e já estou postando.  O retorno que tenho recebido pelo número de leituras e o recadinhos tem sido maravilhoso e eu só quero retribuir o carinho. Lembrem de me deixar a opinião de vocês e estrelas!

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É lindo e com ele não precisa esperar! Beijos

ImperfeitosOnde histórias criam vida. Descubra agora