Dia 9

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Sofia Fernandes

  Faz onze anos que sou professora de português em Atlanta. Vivo nos Estados Unidos desde os meus 16 anos, sem perder a fluência na minha língua materna, o português. Divorciei-me recentemente e, como tenho uma filha pequena a meu cuidado, fi-lo o mais calmamente possível.

  Não me divorciei por o meu marido ter um caso, ser indelicado para mim ou para a nossa filha, mas sim porque percebemos que já não sentíamos o que outrora sentimos e, por isso, apenas possuímos uma relação amigável.

  Hoje, sábado, é o dia da semana em que ele fica com a nossa filha. Ainda não apareceu, nem telefonou a avisar que não vinha. Quando já passa da uma da tarde, decido telefonar-lhe. Depois de três tentativas, consigo que me atenda.

     - Está? Sofia? – sobressalto-me com o seu tom de voz alarmado – Desculpa, hoje não posso ir buscar a Joana. Estou com alguns problemas na clínica. Existe um grave surto de Sarampo no hospital! Tens os cartões de cidadão em dia? Talvez fosse melhor tu e a Joana irem uns dias a Paris... como lhe prometeste!

     - Peter! Está tudo bem?

     - Pode não ser nada, mas, pela tua filha e por ti, tira uns dias e diverte-te. – Ele desliga a chamada. Do outro lado da linha, ouço gritarem pelo nome dele.

  Ele desliga a chamada.

  Eu sei que o Peter não inventaria aquilo, muito menos colocando a filha em risco. A semana que aí vem é a semana dos exames finais e eu, como professora, não posso faltar. Ainda por cima, sou a única professora de português do meu liceu.

     Porém, a minha Joana não tem grandes responsabilidades escolares. Acabou de fazer 6 anos! Por isso, decido enviá-la numas férias antecipadas para casa dos meus pais no Alabama, mesmo sabendo que temos a vacina do sarampo em dia. 

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