cap 5

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0Pov's Mia

3 dias depois do acidente'

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O som era agudo, insistente, como um bipe metálico no fundo da mente. Aos poucos, os sentidos voltavam. Primeiro o cheiro de álcool — hospitalar, forte. Depois, o peso nos olhos, como se estivessem colados. A luz invadia por entre as pálpebras, e, por fim, a dor. Uma dor surda na cabeça, no peito, no corpo inteiro.

Mia tentou se mover, mas os músculos estavam pesados, como se estivessem submersos em areia.

— Mia…? — uma voz sussurrou ao lado da cama. — Filha… está me ouvindo?

Ela virou o rosto lentamente.
Os olhos ainda turvos encontraram um homem sentado ao lado da cama.
Sorridente. Chorando de alívio.
Com a mão sobre a dela.

— Quem…? — a voz saiu fraca, quase inaudível.

Ele apertou de leve a mão dela.

— Sou eu, minha filha… sou seu pai. Está tudo bem agora. Você está segura.

Ela tentou se afastar instintivamente, mas o corpo não respondeu. O coração acelerou sem saber por quê.

Pai?
A palavra soava estranha.
Como se carregasse algo pesado por trás.
Mas ela não conseguia lembrar.

— O que… aconteceu? — perguntou, ainda sem entender.

O homem sorriu, mas os olhos dele estavam intensos demais.
Doces… mas em excesso. Como açúcar que enjoa.

— Você sofreu um acidente de carro. Foi grave. Mas graças a Deus, você sobreviveu. Ficou inconsciente por três dias, mas os médicos dizem que vai se recuperar completamente.

Ela piscou, confusa.
Tentou lembrar.
Um carro…
Sim.
A estrada.
A noite.
Alguém… ligando.
Alguém esperando por ela.

Mas a mente dela era um campo vazio.

— Eu… não lembro de nada — disse, assustada.

Ele se inclinou e segurou o rosto dela com as duas mãos, com um carinho quase teatral.

— Isso é normal, meu anjo. Os médicos chamaram de amnésia dissociativa. Pode ter sido o trauma, o impacto. Mas está tudo bem. Eu estou aqui. E vou cuidar de você.

Ela o encarou, tentando entender.
O rosto dele era familiar.
Mas havia algo estranho naquele sorriso.
Algo que não se encaixava com o calor forçado das palavras.

— A gente… mora junto?

Ele hesitou por um segundo, rápido demais. Mas logo respondeu com naturalidade:

— Sim, claro. Voltamos a morar juntos há alguns meses. Você estava passando por uma fase difícil, e achei melhor trazê-la pra casa. Está tudo bem agora, viu?

Ela assentiu, mas algo dentro dela gritava o contrário.

As memórias estavam bloqueadas, mas o corpo… o corpo ainda lembrava.

Sentia um frio subir pela espinha ao ouvir a voz dele.
Uma rigidez involuntária nos ombros cada vez que ele a tocava.
Uma sensação de alarme, de perigo.

Mas não conseguia entender por quê.

— E… minha mãe?

— Sua mãe… — ele suspirou. — Bom, você sabe que ela nos deixou há muitos anos. Mas eu estive aqui o tempo todo. Sempre estive por você, Mia. Desde o início.

Ela olhou para a janela do quarto. O céu estava pálido, cinza.
Alguma coisa estava fora do lugar.

— Alguém… mais perguntou por mim?

-𝑂𝐵𝑆𝐸𝑆𝑆𝐸𝐷-  𝗧𝗼𝗺 𝗞𝗮𝘂𝗹𝗶𝘁𝘇Onde histórias criam vida. Descubra agora