Sou feliz agora

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Hoje eu acordei feliz. Feliz por estar viva, por não ter de sair correndo para o trabalho, por ter uma família deliciosa e por ter um dia inteiro ainda pela frente para continuar a tirar o mato do meu corpo.... É isso mesmo... Vocês não conhecem aquele ditado que diz " a pessoa sai do mato mas o mato não sai da pessoa? " Pois é, é assim que eu me sinto. Ou talvez poderia me comparar a um alcóolatra que, a cada dia, comemora por não ter bebido, por ter vencido mais uma batalha.

Vou explicar melhor. O meu mato é um modo de viver, cheio de regras, rígido, tudo planejado, nada por acaso ou sem intenção. Tudo dentro do plano, nos mínimos detalhes, dinheiro contado, férias marcadas, filhos com babás, cursos programados... tudo, tudo certo. Errado!

Esta semana encontrei um boletim de notas escolares de quando eu tinha treze anos: A, A, A, A... tudo A. Orgulho dos meus pais. Fiz faculdade, consegui pagar sozinha trabalhando como professora de inglês. Acreditam? Pois é. Fui trabalhar em multinacional e acabei ganhando cargo de liderança antes dos 30. Legal, né? Salarião....roupas elegantes, bolsa de marca, happy hour com os amigos, status... Como era bom...

Mas eu tive filhos ! Bom, aí já não dava para trabalhar até a noite. Tinha de buscar o filho, dar comida, colocar na cama.. coisas de mãe. Tive o segundo filho. Pirei !! Literalmente ! Pedi demissão, larguei tudo. Fui ser dona-de-casa, mãe, esposa e amante...

Mas eu achei que ia ser fácil.... Dó de mim!! Olhava para os meus filhos pela manhã e não sabia o que fazer com eles. Mas se eu era tão boa em planejamento estratégico, inovação, gerenciamento de projetos e mais alguma coisa desse tipo, como é que eu não sabia o que fazer com os meus filhos no dia-a-dia? Tive de aprender.

Chamaram-me de louca na empresa, minhas vizinhas me olhavam com desprezo por eu ter largado o trabalho. Mas eu não liguei, continuei firme. Precisava mudar de vida, algo dentro de mim doía muito, sentia muita falta dos meus filhos, de cuidar deles, educá-los, sentir suas necessidades mais íntimas e ampará-los quando precisassem. Queria ter mais tempo com meu marido, tempo de qualidade, tempo em família, com um " algo mais" em nós. Acho que existe um ser dentro de nós, uma essência, que hora ou outra, clama por espaço. Isso aconteceu comigo. E tive de decidir entre deixar essa essência se manifestar ou trancá-la mais um tempo e acabar adoecendo de tristeza.

No início da minha nova vida, sofri muito tentando colocar tudo no seu devido lugar, casa, filhos, horários, regras, educação, dinheiro, tudo. Mas não dava certo. E aos poucos fui percebendo que eu havia deixado um emprego mas continuava me comportando como se ainda estive na empresa. O ritmo era o mesmo: horários, regras, cobranças pessoais, ter de fazer isso, ter de fazer aquilo. Eu havia saído do mato, mas o mato continuava em mim... Eu estava impregnada por um modo de vida que era contrário a uma rotina feminina. E eu sofri muito ao perceber isso.

Aos poucos comecei a tirar o mato. Chega de horários rígidos, de ter de cumprir o programa para o dia e de atender a todas as expectativas. Uma vida em casa com filhos é tão cheia de imprevistos que não dá para cumprir metas. Lembro-me do dia em que meu filho mais velho me disse que gostaria muito de ter uma fantasia do homem aranha, mas poderia ser outro dia, quando eu tivesse dinheiro. Ele estava na fase de se vestir de super heróis e correr pela casa se sentindo o tal. Percebi então que a minha rigidez não permitia que eu atendesse meus filhos em desejos únicos de cada fase porque eu ainda achava que presente tinha de ser apenas em datas comemorativas. É claro que eu tinha dinheiro para comprar a fantasia e por que não comprá-la naquele momento? A alegria do meu filho com a fantasia naquele dia foi algo inesquecível.

Passar mais tempo com meus filhos tem sido uma escola para mim. Percebi que, para ter uma convivência gostosa e íntima com eles muitas vezes tenho de quebrar regras e fazer coisas que antes não faria. Todos os dias, um pouquinho daquele mato vai saindo.

O difícil é que aquele mato está em todo lugar. Costumo dizer que existem duas formas de conduzir a vida, o masculino e o feminino. O mato é o masculino. E não precisa ser mulher para usar o jeitinho feminino. Os homens também podem, e devem, se apropriar de um pouco desse olhar feminino para viverem melhor. Quem não gosta de um homem com um toque de sensibilidade, carinhoso e que te surpreende quando você menos espera? Que colabora com os colegas ao invés de apenas competir? Que vive a vida com prazer e bem estar? Ou que pensa no equilíbrio da economia com a preservação da Natureza?

Esse jeito feminino de conduzir a vida tem feito falta em todo lugar, e principalmente às mulheres. Apesar de tantas conquistas (masculinas!), as mulheres tem se sentido cada vez mais tristes e angustiadas. Assim como eu. Está na hora de olharmos para dentro de nós e refletirmos sobre o que queremos para nossa vida. E como poderíamos torná -la cada dia melhor. Aliás essa é a única meta que tenho diariamente: " o que eu preciso fazer para o meu dia ser maravilhoso hoje" . O futuro se faz sozinho.

Histórias que curam... a alma feminina.Where stories live. Discover now