Parte 5 - Encontro

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O pavor se apoderou do meu corpo no momento em que a carruagem cruzou os portões, mostrando o Distrito 3 para a Capital. Tudo era muito lindo nas arquibancadas. As pessoas aplaudiam felizes e entusiasmadas, quase me fez acreditar que aquele era um momento feliz. Posso confessar que uma súbita onda de orgulho invadiu meu coração, oras, não pude me conter, eles estavam gritando o meu nome, mas logo me veio a sanidade e percebi que eles esperavam pela minha morte.

Ao fim do desfile, certifiquei-me de não olhar nos olhos de Ária, ela não merecia. Ficamos no salão onde guardam os cavalos esperando pelo nosso mentor. O lugar tinha cheiro de madeira. Me lembrava uns passeios com Oliver e seu pai quando tínhamos folga. Daria qualquer coisa pra voltar naquela casinha de madeira abandonada onde nos escondemos de ursos selvagens quando pescávamos... O ar parecia pesado, com uma atmosfera densa, e o silencio reinava entre os tributos. Todos se encaravam com um misto de ódio mortal e curiosidade, as vezes até, compaixão. Olhares solidários raramente aconteciam, mas não era difícil de se ver, estávamos todos no mesmo barco. Todos teriam o mesmo destino, a morte. 

Na minha frente, uma figura de cabelos curtos da cor de cimento e olhos verdes, vinha em minha direção. Não esperava que viesse falar comigo, ou com Ária. Mas ele não parava de se mover, lenta e graciosamente. Fiquei sem graça por já ter olhado em seus olhos e desviado como se não tivesse percebido que ela estava chegando, então comecei a brincar com os óculos no jaleco tentando disfarçar. Mesmo olhando para baixo percebia que ele se aproximara, não pude evitar mais e levantei os olhos.

- Olá, tributo - Ele falou amigável, muito amigável. 

- Olá... ahmmm...

- Tiles - Claramente percebendo minha duvida de como chama-lo ele esticou a mão sorrindo. Não podia simplesmente o chamar de tributo, não seria original da minha parte  - Muito prazer.

O cumprimentei de mesma forma que faria com um amigo. Não via motivos pra tentar inimizades nesse lugar. Não tenho nada a ganhar com isso, muito pelo contrario. Fiquei perdido com a beleza dele. Ele era um pouco mais baixo que eu, mas era visivelmente mais musculoso. Tinha a pele bronzeada, o que destacava mais ainda seus olhos verdes. Poderia presumir que la fora ele levara uma vida de Alfa. Pena que não conseguímos mais identificar. Pena não, na verdade isso é muito bom, se não já estaria me derretendo por ele e obedecendo todas as suas ordens, o jogo seria injusto. E ele já é bem o tipo que faz qualquer um derreter...

- O seu nome é Tommy, certe? Tommy Merlin? - perguntou arrancando-me do devaneio.

- Ah, Sim.. é - Eu não estava parecendo uma pessoa muito interessante. A qualquer momento ele poderia sair e eu me sentiria como um idiota por não ter mantido a conversa. Ter uma amigo aqui seria bom, pra variar. - Você veio de qual distrito? 

Sinto que essa não foi a melhor pergunta, pois a cara dele fechou um pouquinho, mas logo antes de responder ele voltou ao sorriso fixante. Talvez relembrar o seu Distrito, sua família ou sua vida fora da Capital, não devesse render bons frutos.

- Eu vim do 4 - Falou Tiles - Estava bem atrás de vocês, vi como estava inseguro na carruagem - Disse rindo um pouco, fui obrigado a rir também pra não parece ofendido. Claramente a capital toda percebeu o quanto eu estava nervoso.

- Não está sendo um dos meu melhores dias - Falei brincando, ainda sorrindo.

- Nem pra mim - Tiles abaixa a cabeça. E pela primeira vez ele pareceu realmente triste.

Foi um choque muito grande. Não esperava ninguém triste na minha frente esperando por afago enquanto eu mesmo estava precisando de um alguém pra me consolar. Evitei o pensamento egoísta. Talvez esse seja o principal motivo para um clima tão pesado entre os tributos. Ninguém quer dar o braço a torcer e ouvir os problemas dos outros. Todos esperam a mesma oportunidade de desabar em cima de alguém. 

- Ei! Não fique assim. - Meu tom de voz era paternal - Quem está fazendo isso com a gente. Com todos nós. Uma hora vai pagar. Existem crenças que confirmam isso. Eles vão pagar. 

- Você é do Distrito 3, não é? - Ele levanta o olhos e percebo que estava prestes a chorar. Concordei com a cabeça.

- Parece que alguém me estudou direitinho - Digo dando risada e jogando meus ombros contra os deles da maneira que só os amigos fazem.

- Sim - Ele deu boas risadas um pouco envergonhado - Só queria me certificar se estava certo. - deu de ombros. A pergunta pareceu meio boba, então não quis continuar nesse assunto.

Apesar da conversa estar muito boa, noto que já se passou um bom tempo e que a maioria dos tributos já deixou o local. Provavelmente, já estão dormindo. Olho para Tiles, só um menino com os cabelos grisalhos caídos pelo rosto. Tão doce, tão gentil e tão bonito. Poucas pessoas me deixavam tão confortável como estou agora. Uma dela era Oliver, sempre acabo me lembrando dele. É por conta dele que estou aqui, vim pra morrer no lugar dele. Para que ele pudesse viver a vida do lado de quem sempre amou e poder criar o filho como um verdadeiro pai deve criar. E sei que Oliver fará isso da melhor forma possível, ele é bom em tudo... Muito mais justo eu estar aqui, já que meu amor nunca foi correspondido, era melhor que ele acabasse mesmo. Quanto mais teatral e dramático, melhor. Tem coisa mais dramática que a morte? 

A temperatura começa a abaixar e percebo que estou com os braços atados atras do corpo e encolhido para frente, bem próximo de Tiles. Ária estava no canto oposto do salão junto com mais 3 pessoas mal encaradas conversando baixo e soltando umas risadas altas de vez em quando. Nem pareciam notar nossa presença. 

Ouço o barulho de salto batendo no chão e cortando o silencio que reinava. Olho na direção do elevador e Phoenx está parada de braços cruzados como uma mãe brava faz a espera de uma explicação do filho.

- Achei que Derik viria nos buscar - Ária se pronuncia indo pra perto de Phoenx sem se despedir dos novos amigos.

- Então, Tiles, tenho que ir - Digo virando para encarar seus olhos verdes. - Mas antes tenho que te fazer uma pergunta, posso?

- Claro - ele responde daquele jeito tão amigável que chegava a ser estranho, porém, admirável.

- Por que você sabia tanto sobre mim e veio falar comigo? - Não fui discreto, até porque nem tinha tempo pra isso. Phoenx me encarava como se fosse me matar.

- Porque eu sei tudo sobre todos os tributos - Ele respondeu como se fosse a coisa mais obvia do mundo - E vim falar com você pois te achei muito bonitinho.

Muito Bonitinho?

Muito Bonitinho .

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