“Não pense que eu fui tão bom assim para você, ninguém nunca enxergou através de mim. Eu não sorri e não me deixei chorar, mas não pense que eu não sofri por viver sem tentar mais uma vez depois daquele dia. E quando eu penso em tudo que perdi por não dizer o que eu queria, me faz querer voltar o tempo, mas não há mais volta. Pois seu mundo não é mais igual ao meu.”
Ele já estava na sua terceira garrafa de cerveja, e sua vontade de queimar a carta ainda estava em sua cabeça já tinha perdido a vontade de saber o que ela queria falar. Mas já estava tão perto do final que ele resolveu continuar.
“Te conhecendo do jeito que eu sei que te conheço, sei que está vestindo aquela blusa que eu odeio e aqueles tênis que já deveriam estar no lixo. E sua barba deve ter sido feita pela ultima vez no dia em que nos encontramos… Sei que demorou para abrir essa carta, e sei que está acompanhado por cerveja e cigarros. Sempre odiei o cheiro deles.”
Um leve sorriso apareceu em seu rosto e não era pelo fato dela o conhecer tão bem, e sim por perceber que ela odiava tudo nele. E isso para ele era algo excitante.
Ele pegou um pedaço do envelope e rasgou em várias partes. Em cada um, ele começou a escrever “Não fume, não beba, não viva, não pense em sonhar.” e os jogou em cima da mesa do bar.
Ele já havia se conformado com o final, apenas não tinha certeza se queria realmente esquecê-la.
“Me perdoe por não ter coragem de entregar essa carta em suas mãos. Não tenho coragem de te ver depois de tudo que aconteceu. Existiam mil coisas que eu gostaria de te dizer nesse momento,…”
“ENTÃO FALA, FALA TUDO QUE VOCÊ QUER” – ele pensou.
“…mas agora não vale mais a pena. Essa pequena carta é apenas um pedido de desculpas pelas coisas que eu fiz, pela aquela noite, por tudo pra falar a verdade.
Siga sua vida, Rodrigo, da maneira que você merece e precisa.”
Seria bom se ele não precisasse dela ali, seria mais fácil encontrar a si mesmo. Ele estava sem direção, não tinha mais para onde ir depois que ela resolveu o abandonar. Os dias tornaram-se curtos, sua vida virou algo monótono. Ele tinha que esquecê-la a qualquer custo. Querendo ou não. A sua real vontade era que ela voltasse, mas sabia que isso não iria acontecer.
Não sabe quanto tempo ele ficou ali esquecendo de viver, releu aquela carta mais algumas vezes.
Eram tantos anos juntos nessa estrada e era estranho para ele não saber onde ela estava naquela hora. Mais um dia e mais nada. Era apenas mais um encontro que ele queria que parece que nunca iria acontecer… Mais um dia sem ela.
Ele voltou para a ultima frase da carta.
“Ah, eu sinto muito.”
Sem se importar muito ele rasga a carta em vários pedaços e deixou jogado ali em cima da mesa. Mas ele percebeu que um pedaço havia permanecido inteiro, ele pegou para ler “Não chore, não ligue, não volte, não ouse me amar”. Ele dobrou e colocou no bolso, talvez aquilo serviria como um bilhete para não cometer nenhuma burrice de querer ligar para ela. Deixou uma nota de 50 reais sem ao menos saber quanto deu sua conta, levantou e seguiu para fora do bar, deixando ali todo o seu passado.
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Ah, eu sinto muito.
Short StoryPedaços de um coração partido em frente a uma carta de amor.