2015

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Entrei na cafeteria a passos lentos vasculhando o local com o olhar, não era nada muito grande, mas sua decoração sutil e confortável com aquele cheirinho de café ao fundo dava a vontade de entrar e nunca mais sair, me dirigi até uma mesa mais afastada ao fundo, que dava um que de privacidade, até meus olhos pararem em uma mulher que lá estava, parecia concentrada em seu celular e deduzi ser Sophie, a moça com quem conversara no telefone mais cedo, me aproximei hesitante e sem saber bem o que fazer pigarrei para chamar sua atenção. Ela calmamente ergueu o olhar e analisou meu rosto até me reconhecer, para então ficar em pé e estender a mão em um comprimento educado, fiz o mesmo, lhe estendendo a mão.
- Sophie, certo? Foi com você que falei no telefone mais cedo?
- Sim, isso mesmo. -Ela sorria, mas dava para notar que era mais uma questão de educação do que real simpatia. Ela remexeu alguns papéis em cima da mesa e pude ver uma foto pequena minha em uma delas, ela provavelmente estava usando para lembrar meu nome, entre outras folhas, e outras fotos de garotas com minha faixa de idade ou pouco mais velhas, suspirei, segurando minhas mãos, tentando manter a calma.- Então... Mareena, porque não nos sentamos e conversamos um pouco?
- Pode me chamar de Mare, se quiser. -Correspondi seu sorriso educado, mas era quase inevitável não sorrir com a felicidade de estar tendo essa chance. Sophie era muito educada, e passava a impressão de ser confiante, muito madura e responsável, mesmo que aparentemente não parecia ser do tipo que se abre fácil, com a maquiagem leve e o cabelo castanho de dar inveja me fazia pensar que trabalhar me faria parecer mais acabada do que já era, considerando que sem trabalho eu já nem conseguia me cuidar. Espantei a inveja pela organização de tempo que ela deveria ter e me concentrei na entrevista, precisava desse emprego.
- Bem, Mare, aqui diz que você faz faculdade de moda. - Concordei com a cabeça.- Estuda no período da manhã. - Ela mais lia o papel confirmando o que estava ali, do que me perguntando, passei apenas a seguir seus movimentos com os olhos. - Tem muita experiência com crianças? - Ela olhava nos meus olhos, odiava isso, tentei segura ao máximo, mas desviei os olhos para suas mãos que ainda segurava o papel com minhas informações básicas.
- Sim, eu trabalhava em uma creche pública na época do colegial. - Respondi imaginando se aquilo duraria muito mais.
- E porque saiu?
- O governo parou de financiar, então fecharam-na e bem, eu precisava estudar para conseguir entrar na faculdade. - Dei de ombros olhando sua expressão. Indiferente com o que eu dizia, mas por algum motivo uma certa curiosidade vagava em seu olhar, o que me obrigou, a manter o olhar em seu rosto.
- Entendo, e quem te indicou a esse trabalho?
- Na verdade ninguém... - Torci o nariz, tentando evitar um careta, mas ela parou qualquer movimento e ficou me encarando com um ponto de interrogação estampado na face, obviamente eu não teria como ter deduzido sobre essa vaga.- Quer dizer, eu... - Adeus, emprego.- Eu... Ouvi por aí que precisavam e bem, é uma família bem conhecida e... - Ela me interrompeu erguendo o dedo indicador.
- Também diz aqui que você luta. - Isso era uma pergunta? Por via das duvidas confirmei com a cabeça.- Há quanto tempo?
- Desde os meus 8 anos.
Ela confirmou com a cabeça como quem já sabia... Porque sabia, e não escondeu o tédio na sua postura, ela com certeza sabia o resultado dessa entrevista, de repente se tornou visível, aquilo tudo era mera formalidade, só não sabia dizer se eu estava ali por pena, ou com a chance de ser escolhida, mas com minhas respostas... Suspirei e esperei pela próxima pergunta. Esperei em vão. Sophie se levantou e organizou os poucos papéis em uma pequena pilha organizada, esperei alguma ordem, sorrisinho, desfecho, mas nada. Já estava sentindo certo desconforto quando por fim ela sorriu, colocando o papéis em uma pequena pasta de couro marrom, que só então notei.
- Por hora eu poderia dizer que a senhorita pode ficar feliz, mas antes de oficializar qualquer coisa o Sr. e a Sra. Abramovitch gostariam de conhece-la pessoalmente. - Levei um segundo para digerir as palavras, só então me levantei tetando conter confusão.
- Eu? Mas eu nem... Quer dizer, eu...
- O seu currículo de certa forma os despertou algum interesse e eu apenas marquei esse encontro para conferir se não estávamos lhe dando com algum psicopata. - Sorriso educado. Ela estava falando sério. - De qualquer forma, eles não querem os filhos nas mãos de qualquer um, querem te conhecer e ver como as crianças reagem a você. - Confirmei com a cabeça tentando não deixar nenhuma palavra do que ela dizia passar. - Entrarei em contato o mais rápido possível. - Ela piscou com um olho, como se aquilo fosse um segredo, e bem, talvez fosse, mas eu ainda não conseguia entender exatamente o que estava acontecendo, definitivamente aquela tinha sido a entrevista de emprego mais rápida da minha vida. E mais decepcionante também. Ou mais feliz.
Quando Sophie foi embora senti como se o peso do mundo tivesse saído das minhas costas, se eu realmente conseguisse esse emprego, conseguiria continuar pagando minha faculdade e talvez, finalmente, as coisas começariam a dar certo para mim. É claro que não era lá um dos melhores empregos do mundo, babá? Mas não tinha como negar que o salário era ótimo! Além dos benefícios... Suspirei indo para a fila do café, na minha vez pedindo um bom café da manhã para dois, qualquer mínima alegria merecia ser comemorada.

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