Capítulo II

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Primeiramente, Harry iria seguir o caminho de casa. Mas a última coisa que ele queria era encontrar o pai, sentado na entrada de casa, uma garrafa de bebida pela metade em sua mão e os olhos perdidos. E, se ele fosse para casa, seria mais fácil para Louis encontrá-lo. Então, na primeira curva, ele virou para o outro lado.

Ele correu até sentir os músculos da perna queimarem, até sentir que seus pulmões estavam se comprimindo com tão pouco ar. Ele correu sem rumo, mas quando parou, não podia acreditar em onde ele estava.

Ele estava numa pequena pracinha que não era muito visitada pelo resto da cidade, mas sempre muito visitada por ele e por Louis quando eles eram bem mais novos. Quando eles ainda compartilhavam todos os segredos. Quando eles ficavam a tarde inteira em cima de uma daquelas árvores, comandando aquele pequeno mundinho só deles e depois iam para casa, jogar videogame, e continuar naquele mundo. Era só deles, mas eles pertenciam àquele mundo.

Quando eles pararam de contar tudo um pro outro? Quando Harry começou a sentir essas coisas por Louis? Isso era errado, era muito errado. Ele não poderia sentir nada disso.

Ele passava a maior parte do tempo na casa do amigo porque tinha medo de ficar na sua, desde que sua mãe havia morrido e seu pai, virado um louco.

Nos últimos tempos, ele mal havia ido à casa dos Tomlinson. Ele tinha vergonha de entrar lá, de ver Louis, de estar com ele e ficar babando pelo melhor amigo.

Ele tentava se convencer de que aquilo era errado. De que ele só estava confuso.

Ele estava muito confuso.

Ele queria gritar, ele queria quebrar algo.

Ele caminhou até a árvore em que ele e Louis costumavam ficar e escalou até o galho mais resistente, onde se sentou e começou a chorar copiosamente.

Pelo amor de Deus, Harold! Ele escutou a voz do amigo na sua cabeça. Você não está louco, você só está confuso. Você não ama o Louis. Não desse jeito. Você vai descer daí e vai até a casa dele se desculpar com a pouca dignidade que você ainda tem, e vai fazer as coisas voltarem ao normal.

Quando ele chegou à casa de Louis se surpreendeu ao saber que o garoto não estava lá. Mas se surpreendeu mais ainda ao chegar em casa e encontrar o amigo sentado em sua cama.

"Oi." Louis disse, sentado no colchão, mexendo inquieto na barra da camiseta.

"Olha, Lou. Me desculpa."

"Tá tudo bem, Harry, eu juro." Ele deu alguns toquinhos na cama pra sinalizar que Harry deveria se sentar lá também. "Deita aqui no meu colo, eu lembro que você gostava quando eu fazia cafuné."

"Não!" Harry gritou, o que fez Louis pular no colchão. "Não toca em mim! Nunca mais! A gente é amigo e só isso!"

"Harry, para!" Louis disse se levantando da cama. "Para, Harry! Seu pai vai escutar!"

"Eu não to nem aí!" Harry gritou de volta, as lágrimas descendo pelo rosto. Ele tentava se desviar de Louis enquanto este tentava o abraçar. "Vai embora!"

Louis caminhou insistentemente, tentando segurar o amigo pelos ombros; seus próprios olhos azuis cheios de lágrimas, mas ele não podia chorar, ele tinha que se mostrar forte.

"Eu não vou embora, Hazzy."

"NÃO ME CHAMA ASSIM!"

"Harry!" Louis tentou segurar o outro, que se jogou no chão, socando o piso enquanto afundava em lágrimas. Ele estava desesperado, e Louis queria ajudá-lo. Era tudo o que ele mais queria. "Harry! Para de gritar! Seu pai vai--"

Mas, antes que ele pudesse acabar a frase, o pai de Harry abriu a porta com um estrondo, tacando uma garrafa vazia na parede oposta, o que espalhou cacos de vidro por todo o quarto.

Ele já foi um homem bonito e arrumado, Louis se recordava. Mas agora ele estava acabado, tinha olheiras  negras debaixo dos olhos, cabelo desgrenhado e a barba por fazer.

"Vocês querem parar com essa gritaria por favor? Seus idiotas." O homem avançou até Harry, que ainda estava no chão e o puxou pela gola da camiseta, estapeando-o. "Quantas vezes eu já disse para você não andar com esse veado, Harold!"

"Para!" Louis tentou intervir na briga, mas foi empurrado, caindo no chão, poucos centímetros perto de um caco de vidro da garrafa. "Harry!"

"NÃO FALA ASSIM DELE!" Louis percebeu que Harry não chorava mais, ele foi tomado por uma força repentina e socou a cara do pai, que pareceu surpreso com o menino que havia crescido. "ELE QUE TEM CUIDADO DE MIM! NÃO VOCÊ! ELE QUE DEVERIA ME DIZER PRA NÃO ANDAR COM VOCÊ!"

"Você não fala comigo desse jeito, filho de uma puta!" O pai de Harry apontou o dedo na cara do filho, tremendo de fúria. "Quero ver se ele vai te dar comida, casa, uma cama pra dormir. Hã?! Vai lá morar com ele então. Veado não mora comigo. Eu não quero mais você aqui."

Louis não sabia o que fazer. Ele queria agir, queria dizer alguma coisa, mas ele não conseguia abrir a boca. Ele sentia o suor descendo seu rosto e seu corpo tremendo, mas não conseguia se mover.

"Eu não quero mais morar aqui também." Harry se abaixou para puxar Louis do chão. "Ele pode não me dar casa e comida, mas ele me dá amor."

Ele puxou o amigo e os dois pularam a janela, montando na bicicleta de Louis que os esperava lá embaixo e pedalando até a casa dos Tomlinson.

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