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Trancafiada na copa de uma árvore em uma cela feita de mithril que magia nenhuma no mundo poderia abrir, ela aguardou dias e noites em solidão pelo dia do julgamento. Nenhuma de suas irmãs veio visitá-la. Ninguém veio prestar-lhe o menor dos consolos.

Após dias que se arrastaram feito semanas, sua cela foi finalmente aberta e a fada cinza, conduzida ao tribunal. De cada galho espreitavam as fadas com olhares acusatórios e hostilidade velada. Um pensamento reconfortante a acometeu ao se dar conta de que a árvore era a mesma onde ela costumava meditar.

Ela se deparou com os membros do Conselho Jurídico e teve um momento de dúvida; teriam as Fadas Superioras escolhido aquela árvore por saber que era seu esconderijo favorito? Se sim, Luminäe não podia deixar de comparar tamanha crueldade à perversidade que elas acusavam o pior dos humanos de cometer.

A Fada Mestre se pronunciou, fitando Luminäe com ar acusatório.

— Na terceira passagem da lua minguante pelos céus deste fim de outono, o Conselho se reúne para julgar as ações de Luminäe, acusada de transgredir as três leis sagradas da ordem das fadas.

A Fada Mestre então enumerou os crimes para os presentes, e suas palavras causaram consternação geral. Luminäe mantinha os olhos baixos, sentindo aquele olhar acusatório penetrar-lhe o campo astral feito uma agulha, que se multiplicava pelos rostos da multidão sentada nos galhos e a alvejava de todas as direções.

— Partiste ao mundo dos mortais e conversaste com um humano, fazendo-lhe promessas que não lhe cabiam fazer. Induziste mais humanos em seguida para tomar ações que os colocaria em perigo e usaste tua magia para seguir adiante com teus planos. Ainda sem medir as consequências de teus atos, interferiste em um conflito entre mortais do qual tu era a causa principal e incitaste a matança de inocentes sob o pretexto de ajudá-los.

Um burburinho correu entre a multidão e Luminäe sentiu pela segunda vez a indignação crescer dentro de si, convertendo-se em revolta e depois em raiva. Mas ela nada declarou.

A Fada Mestre prosseguiu seu relato.

—E como se não bastasse, te voltaste contra a Grande Fada quando ela tentou apaziguar um derramamento de sangue. Teus atos foram impensados, tuas ações contradisseram os princípios de toda a filosofia de nosso mundo. Luminäe, o que tens a dizer sobre isso?

A fada mal conteve um tremor involuntário quando ergueu o rosto em desafio. Suas mandíbulas pareciam coladas, de tão difícil que era falar sob intenso escrutínio. O milagre de palavras saírem de seus lábios se deu graças ao seu coração revoltoso.

— Eu visitei o mundo mortal; não nego. Venho fazendo-o há muitas noites, como forma de fugir da luz ofuscante do nosso mundo. Pois é nesses momentos de solidão que consigo escutar minha consciência e adquirir um pouco de sabedoria, o que me é impossível nas conversas com minhas irmãs. – ela começou, admitindo seus hábitos reclusos.

— Mas eu nunca interferi no mundo dos mortais. Quando segui a Grande Fada, não sabia o que encontraria. A visão de uma fada conversando com um humano atiçou minha curiosidade... e preocupação.

— Eu...ouvi o diálogo. Eu ouvi a Grande Fada ignorar seu clamor por ajuda. E a visão daquele homem aos prantos por seu filho, certo de que o perderia na guerra... ele estava sozinho. O duque havia levado seu filho. Ele não tinha mais ninguém a quem recorrer. Eu não podia abandoná-lo.

O Conselho ouvira tudo no mais absoluto silêncio.

— Por que você não retornou e trouxe o problema ao Conselho? Por que agiu sozinha?

Luminäe encarou a Grande Fada, por quem ela nutria pouca simpatia após o episódio sangrento.

— Porque você havia recusado o pedido do homem. Você escolheu dar as costas ao problema dele.

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⏰ Última atualização: Aug 26, 2015 ⏰

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