Dia 2: O Despertar

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NÃO! - Eu poderia ter falado.
DE JEITO NENHUM! - Também é uma ótima opção. Mas como este é meu emprego, não posso recusar, a não ser que eu queira ser demitida. Margô se aprofundou muito nessa história e quer que eu vá até Nova Orleans e conhecer canto a canto dos lugares que "hospedam o mal" como ela mesma disse.

Me entregando as pastas com informações dos lugares, antigas lendas e no envelope havia cerca de quinhentos dólares. Ela se encarregou de tudo e me entregou tudo em mãos. De lugares para visitar, instruções para abordar pessoas e como conseguir devidas informações. Geralmente, Margô tem o hábito de nos deixar trabalhar por conta própria e seguir nosso instinto. Tenho a sensação de que ela está elucubrando Nova Orleans.

- Tenho um dia pra arrumar minhas coisas. - Sigo dizendo a Lucas enquanto dirijo até minha casa. - Ela realmente está disposta a tudo por alguma coisa exclusiva.

- Obcecada, você quer dizer ?

- Quase isso.

- Só acho um pouco medonho ela te mandar até lá. Quero dizer, o que ganharemos com isso... São apenas lendas, contos que são passados apenas pra chamar a devida atenção. - Era exatamente isso que martelava em minha mente.

- De todo modo, terei férias.

Com o despertador gritando, irritando-me logo de manhã, levanto-me e vejo: são oito e quarenta. Tenho quatro horas, até ir trabalhar, para arrumar minhas coisas, colocar as roupas na mala é a parte maçante de tudo isso. Não sei quanto tempo ficarei lá e nem que tipo de lugares terei de ir. Na verdade, estou um pouco nervosa com isso. É a primeira vez que viajo a trabalho sozinha. E é a primeira vez que procurarei por coisas do tipo. Contos, lendas, historias antigas que passam de geração pra geração. De qualquer via, terei de corresponder às exigências de Margô, que não aceitará qualquer matéria.

Chegando ao jornal, fui diretamente falar com Tess, nossa editora de fotografia. Lhe pedi ajuda com o material que irei ter. Assim, eu poderei entregar o trabalho completo. E pedi a Lucas, que além de morar comigo, é estagiário no real life que fique ao meu dispor nas pesquisas mais extensas.

Ao fim do dia, estou pronta para ir. Me certifico de não estar esquecendo nada, terminando de colocar as coisas no carro, me despeço de Lucas e enfim estou na estrada. Serão mais de dez horas de Arkansas até Nova Orleans. Seria uma longa pensativa viagem.

Pelo caminho fiz apenas duas paradas, assim que cheguei na interestadual 70, desviei para uma cidade de Oklahoma para comprar água e algo para comer. Horas depois, parei em Baton Rouge para dormir, já se passou das duas da manha, chegarei em Nova Orleans amanhã bem cedo. Assim aproveito para já começou meu trabalho. Parei em um posto para abastecer, logo percebi que havia uma conveniência aberta decidi entrar e comprar algo para comer antes de dormir. O lugar era frio e se ouvia apenas o som do noticiário. Perto do caixa, vejo alguns mini potes de batatas e vou direto neles. Então vejo a moça girando lentamente sua cadeira para me atender. Seus olhos e cabelos claros chamaram minha atenção.

- Longa viagem ? - Perguntou.

- Nem faz ideia. Ainda tenho muito que andar amanhã.

- Pra onde ?

- Nova Orleans. - Assim que respondi, a moça apertou os lábios como se estivesse incomodada com algo. - Ah... Sabe de algum lugar que eu possa passar a noite por aqui, um hostel... talvez ?

- Não temos hosteis por aqui, e o único hotel por perto está em reforma.

- Ah, não...

Não posso dirigir até uma próxima cidade, estou morta de sono. Entregando-lhe o dinheiro, percebo uma viatura do lado de fora, um policial se aproximava de meu carro e verifica a placa, logo entra na loja.

- Boa noite, senhoritas. - Disse ele, retirando do bolso alguns papéis. - Tudo em ordem por aqui ?

- Poderia estar pior. - Brincou a moça. Pego meu troco, meu potinho de batatas e saio do local. Terei que passar a noite no meu carro. Volto até a loja e pergunto a moça:

- Ah... Se importa de me deixar estacionar meu carro aqui do lado ?

- Sem problemas.

O policial me olhava como se estivesse me analisando, fico um pouco tensa com o olhar fixo em mim.

- Vai passar a noite no carro ?

- Pois é, não tenho muita escolha...

Assim que me afastei da loja, olho distraidamente para trás e vejo o policial ainda me olhando enquanto fala alguma coisa com a moça. Ambos com um rosto desanimado.

No carro, tento ligar para Lucas, mas meu celular está sem bateria. Aproveito para preparar o roteiro de amanhã. Tenho vários lugares listados por Margô e terei de conferir todos. Marcando os que chamam mais a atenção para visitar primeiro.


Estava frio.

Me lembro de fechar todas as janelas do carro quando já começará a chover. O vento assoviava lá fora. As luzes da loja estavam falhas, como se estivessem ligadas faz muito tempo. Não há nenhum movimento lá dentro. Fico ansiosa a cada respiração, não acho uma boa ideia sair do carro. A chuva estava minimizando mas o vento se agravava. Não dá pra saber quantas horas são. Sinto a presença de alguém se aproximando, olho ao redor e não vejo ninguém. Tento limpar meus vidros embaçados para continuar observando, quando algo bate em meu carro. O impacto me fez bater no volante e ficar zonza. Levo minhas mãos para abrir a porta do carro e com muito custo consigo sair. O ar frio impactando meu rosto, volto meus olhos para meu carro, quando algo estranho me deixa confusa... Não há nada. Nada bateu em meu carro, ele nem se quer saiu do lugar.

Atordoada, sigo até a loja. Há neblina por todo o lugar e o zumbido em meu ouvido não me deixa ouvir o noticiário. Um rapaz estava desesperado, ele me lembra alguém. Havia sangue em suas roupas e ao fundo, algo em chamas. Desvio o olhar e tento procurar a moça, mas ela não está. Sinto a presença novamente, procuro pelo pequeno lugar mas nada encontro. Não há ninguém ali. Mas posso ouvir uma respiração. O calor em meus ombros me faz pular e a estática da tv prende minha atenção. Algo está tocando minhas mãos. Mas não vejo nada!

Acorde...

Posso ouvir isso.

Seja forte, acorde...

Eu conheço essa voz, mas não me lembro de quem seja... Por que eu não consigo me lembrar ? Por que isso é tão maçante ? Corro até meu carro, que agora está todo destruído...

Ela pode nos ouvir...

Continuo ouvindo.

Acordo ofegante quando o policial bate no vidro de meu carro. O sol já alcançava meu painel.

- Bom dia. - Disse ele, assim que sai do carro. Assenti com a cabeça. - Acho melhor a moça comer algo antes de partir. - Continuou, me entregando um pequeno saco de biscoitos e um copo de café.

- Obrigada. - Ele sorriu e logo se afastou, entrando em sua viatura. O dia estava começando e me sinto totalmente leve. Coloco as coisas em meu painel e estou pronta pra chegar em Nova Orleans. Já tenho meus primeiros destinos em mãos.

Antes que eu pudesse ao menos sair do local, como se em câmera lenta, eu pudesse vê-lo se aproximando. Não sabia o que fazer, se eu tentava sair do carro ou me se segurar em algo, se gritava ou rezava. Sem muito tempo para pensar, o caminhão se choca com meu carro.


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