CAPÍTULO 2

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Eu não sei se gosto ou detesto essa avó de Hafiq.

Acho que definitivamente não gosto dela ou seu jeito me incomoda de uma forma estranha.

Entretanto, há uma aura nessa mulher, algo ao seu redor, que eu me identifico.

Ela é firme e dura, uma rocha impenetrável, eu agora percebo de onde vem toda a altivez e a voz de comando de Hafiq.

Farah, apesar da falsa simpatia, quase dá pra ver o veneno escorrendo de seus lábios. Eu não sei os reais motivos de Hafiq odiá-la, mas concordo plenamente, ela é perniciosa, eu sinto isso até nos ossos.

Durante esse jantar imbecil eu não tenho com quem falar, Anusha conversa baixinho com Hafiq sobre conspirações políticas, golpes de estado e retaliações a grupos esquerdistas.

Farah insiste em me deixar fora de qualquer assunto e eu sinceramente não pretendo fazer a social com essa mulher.

Só me restaria conversar com a irmã de Hafiq, mas Malika me parece muito insegura e frívola para perceber que há vida humana ao redor dela, então, nem pensar em ser gentil comigo.

Posso dizer que ela é uma mulher bonita, a pele morena cremosa, grandes olhos castanhos, nariz aquilino e lábios cheios, uma beleza exótica, interessante.

Porém, apesar de toda a beleza milimetricamente construída pela natureza e uma boa carga de cosméticos caros, noto que ela esconde em si um desconforto que eu não sei de onde vem, só sei dizer que ela não faz parte desse cenário familiar e político. Assim como Hafiq, é mais uma pária dentro da própria família.

Percebo que o fato dela ser mais velha que Hafiq a incomoda, pois, apesar de ser a filha do meio, ela nunca sucederá o trono do pai, pelo simples fato de ter nascido mulher.

Até que as minhas suspeitas se confirmam, quando ela chama a atenção pra si, com a voz impostada de um modo nervoso e vacilante.

- Acho tolo de sua parte, minha avó, não aceitar ajuda nesse momento de conflito. O meu Farid é muito influente no norte do país, poderia ajudá-los em articular algumas alianças nesse momento de crise.

Hafiq para de falar alguns instantes com Anusha e seu olhar finge interesse no apoio do marido de Malika.

A avó de Hafiq estuda em silêncio a figura de Malika por alguns segundos e depois, indaga-a.

- Ele é mais influente com as lideranças do norte do que eu que fui Rainha desse Emirado por décadas, Malika? Muito obrigada, mas deixe os problemas políticos Qataris com Hafiq, eu já tenho tudo articulado, problemas da família serão resolvidos pela família.

De repente, os pratos na mesa estremeceram, Malika esmurrou a mesa furiosa com o afronta de Anusha e começa a destilar raiva e rancor, vociferando mágoas do passado.

- Pois nem Aziz e nem seu amado Hafiq estavam aqui esses anos todos para carregar esse país nas costas, me diga onde eles estavam? Eu posso responder, eles estavam preocupados com seus umbigos, fazendo suas próprias fortunas e divertindo-se com esses tipos de mulheres disponíveis. É graças a mim e ao meu Farid que papai ainda não foi arrancado a pontapés desse governo.

Hafiq do outro lado da mesa encara Malika com os olhos injetados de raiva e eu vejo logo que isso não vai terminar bem, faço mentalmente uma contagem regressiva, aguardando o exato momento para o meu "Califa cachorro louco", voar no belo pescoço de Malika.

- Que tipo de mulher Malika? O tipo minha esposa? Ou o tipo feliz, bem amada, que tem um herdeiro, é sobre esse tipo de mulher que você tá falando? Repita o que disse, se você tem coragem.

Os véus de Antônia - Livro 2 : A flor do deserto (Degustação)Onde histórias criam vida. Descubra agora