Capítulo 1

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Dentro do ônibus a menina conversava desbragadamente com a mãe ou com qualquer ser vivente que a ouvisse. A "viagem" era longa pois que feita por ônibus urbano, que ia de Goianira até o Terminal Padre Pelágio em Goiânia. Depois era só pegar mais um ou dois ônibus, até chegar à casa da avô no Setor Pedro Ludovico, avó que era mãe de seu pai. A garota era hiper "atenciosa", no sentido de estar extremamente atenta a tudo que acontecia ao seu redor. Qualquer coisa que a rodeasse, rápido ela já sabia e não se esquecia. Saber era com ela mesmo. Nem deixava de conversar a respeito, falava de tudo que aprendia ou que estava aprendendo. Tinha acabado de aprender os primeiros rudimentos de primeiras letras. Esse novo recurso cognitivo fornecia muito mais coisas a serem observadas e aprendidas. Quando aprendeu a ler percebeu que o mundo tinha bem mais coisas do que antes pensava.E naquela estrada, na verdade uma rodovia que "unia" as duas cidades conurbadas, além de outras coisas havia infinitas possibilidades literárias. Eram placas, out-doors, sinalizações de trânsito, fachadas de empreendimentos comerciais e industriais. Tudo que via ou lia de pronto sabia. Mas aí com o ônibus em movimento aparecia muita coisa nova que ela precisava conversar para saber por inteiro._ Fri-go-rí-fi-co! (...). Mãe!!!!_ O que foi Ana Clara?Era Ana, mais a Clara, como a dos Anjos, de Lima Barreto. Mas sem os olhos azuis. Era uma garota negra, de pele inefável. Os cabelos crespos em trancinhas iam até a altura do ombros. Feitos em tranças de tal modo que com o tempo acabavam por ceder à sua vocação de virar dreds._ O que é um fri-go-rí-fi-co?_ É o lugar onde eles matam vacas...Sua mãe achava não ser necessário colocar meios-tons, amaciar a realidade com eufemismos, dourar o bolo. A menina tinha que ter consciência da realidade perigosa em que viviam. Então, pra gente comer carne o bicho precisava ser matado. Assim é o mundo!  


A MENINA QUE APRENDIA TUDOOnde histórias criam vida. Descubra agora