Dezoito caminhou sem ter noção de a quanto tempo andava, sentindo o sangue quente e revoltado em suas veias a cada passo. Tentou se distrair com os siris que saiam curiosos de suas tocas, às vezes carregando bitucas de cigarro que as pessoas achavam divertido ou prático jogar lá.
Sua mente, no entanto, não a deixava focar em nada senão a raiva que sentia. Lembrava-se de um menino de sua sala quando era mais nova, que uma vez aparecera com a mão engessada. Quando perguntaram o que aconteceu, ele respondeu que socara a parede num acesso de raiva. Ela o achou tão idiota, na época. Agora agradecia que não haviam paredes na praia, porque provavelmente arrebentaria todos os dedos.
"Por que estou ficando mais imatura com a idade?"
Já havia um tempo que Dezoito reparava que estava ficando mais impaciente e até mais rancorosa com as coisas que aconteciam. A mudança não começara de forma negativa, na realidade; ela foi por anos quieta e amistosa, o orgulho dos pais e dos professores. Sempre soube, no entanto, que não era por uma obediência real, e sim por falta de coragem de se impor.
Desde cerca de um ano atrás, alguma coisa havia mudado. Talvez ela tivesse se tornado mais confiante, talvez conhecido mais pessoas que pensavam como ela; talvez ambos. O ponto é que aprendia, pouco a pouco, a enfrentar e se expressar. A se colocar como adulta onde as pessoas não queriam vê-la dessa forma.
Mas isso também trouxe esses sentimentos de raiva que sentia agora. Não sabia se suas experiências podiam justificar tal atitude, ou se ela estava criando desculpas para tratar os outros mal. Essa batalha sempre se travava discreta, por debaixo de seus pensamentos mais barulhentos e carentes de atenção.
Decidiu, então, que precisava esfriar a cabeça – literalmente. Andou até o trecho da praia de onde sabia que era possível ver a ilha despontando do mar, e torceu para a maré estar baixa o suficiente. Suspirou aliviada ao perceber que sim.
A "ilha" nada mais era do que uma pedra excepcionalmente grande, que era possível alcançar a nado na maré certa. A contragosto de seus pais e tios, muitas batalhas piratas foram travadas lá entre ela e seus primos.
Braçadas rápidas ajudaram-na a vencer os metros, e a cada minuto o frio a incomodava um pouco menos. Chegando lá, teve dificuldade para passar da água para a pedra escorregadia, e cortou a mão numa parte pontuda. Não ia voltar derrotada, no entanto, e com um último impulso determinado, colocou-se em sua ilha.
Olhou para a palma da mão dolorida e viu que sangrava.
"Merda, isso vai doer na volta. Não tem paredes para eu socar aqui mas eu consigo machucar a mão numa pedra estúpida. Brilhante."
Deixando isso pra lá por um momento, Dezoito notou que a ilha estava ainda mais idêntica do que se lembrava do que a própria praia. Afinal, aqui não havia muito que os ventos e ondas pudessem alterar com o tempo. Finalmente, sentiu-se mais calma.
Algo dentro dela dizia para que não se demorasse lá – provavelmente a voz de sua mãe, que não cansava de repetir que a maré subiria e ficaria perigoso voltar – então ela aproveitou bem os minutos que tinha. Se mais tarde perguntassem a ela sobre o que havia pensado quando estava lá, provavelmente não saberia responder. Mas era o que precisava naquele momento.
Uma rajada de vento frio chamou sua atenção, e achou melhor voltar à praia. Assim que voltou para a água, sua mão ardeu horrivelmente, como que implorando para ser afastada de todo aquele sal. Dezoito grunhiu.
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Dezoito e Tantos
Teen FictionEla não sabe muito bem do que está fugindo ou o que está procurando; só sabe que não aguenta mais uma noite em que seus pensamentos agitados não a deixem dormir. Em busca de algum conforto, entra no carro sem pensar e vai para a praia onde passou se...