Capítulo 1

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- Como e que pôde fazer isto? - perguntou a mulher, com os nervos completamente descontrolados.

O cabelo encaracolado batia-lhe pelos ombros e os óculos escorregavam-lhe constantemente do nariz proeminente. A barriga empinava para a frente, fazendo com que a saia de fazenda, demasiado curta, para pernas tão gordas, levantasse, mostrando as rótulas vermelhas e ásperas.

- Mas eu não fiz nada! - replicou Sofia, já com o desespero a sacudir-lhe o corpo.

- A menina pôs a minha filha na polícia! E, ela só tem dezassete anos! É uma menor! - argumentou Antonieta, puxando os óculos para cima e apertando o xaile contra o peito volumoso.

Sofia deu dois passos para trás e levou uma mão ao rosto suado. Sacudiu o cabelo para trás e suspirou fundo. Sentiu um cansaço profundo tomar conta do seu ser. Parecia-lhe impossível que a mulher não acreditasse no que ela dizia. Ainda por cima, pelo facto ainda mais doloroso de estar a falar a verdade.

- Marta, arruma as coisas e vamos embora! Não precisas do dinheiro! Se precisares e alguma coisa a mãe dá-te! - disse a outra, virando-se para a filha que estava por detrás do balcão.

Marta tinha a tristeza estampada no rosto. Toda ela tremia de comoção e devagar, muito devagar, começou por ir buscar o casaco, a seguir a mala e por fim, passou por Sofia e miseravelmente apertou-lhe o antebraço.

- Oh, Antonieta, pense bem! - pediu,ainda, numa última tentativa, Sofia.

- Maldita a hora em que a minha filha veio trabalhar para esta... merda! - rematou a mulher, saindo do café, e encetando caminho através da rua molhada pela chuva, com os chinelos a arrastar e a saia a baloiçar.

Marta seguiu-a, tristemente, com a mala pendurada pelo ombro e as mãos metidas nos bolsos.

Sofia voltou para dentro do café, onde tinha um cliente muito confuso à espera da chávena de café que tinha pedido há dez minutos atrás, mas que ao mesmo tempo estava perdido de curiosidade. As únicas palavras que teve para Sofia, quando finalmente, levou a chávena aos labios, foram as seguintes:

- Não ligue,menina! Aquela família é do pior!

- Eu nem acredito que isto possa estar a acontecer! Como é que alguém pode fazer tanta confusão? Como é que alguém pode ser tão burro? - inquiriu Sofia, levando as mãos à cabeça e puxando os cabelos para trás até sentir dor.

- Mas, afinal o que é que aconteceu?

- Durante está semana que passou, recebemos uma nota falsa de cinquenta euros e para ser franca, nem eu, nem a Marta, sabemos qual de nós a recebeu... Só ontem, ao fazer a caixa, é que dei com ela e esta manhã, fui ao posto da polícia e entreguei a maldita nota. Disse-lhes que não fazia a mínima ideia qual de nós a tinha recebido e eles, para o auto, teriam que falar com a Marta e foi só isso! Disseram-me que passariam mais tarde, para falar com ela e foi somente isso que aconteceu... Mas, a mãe, está convencida que eu fiz queixa da filha e que eles querem-na prender...E, por mais que eu tentasse explicar, a burra não percebia nada, nem sequer deixava-me acabar de falar...Nunca pensei que pudessem existir pessoas assim!

- Mas elas são mesmo estúpidas! A senhora é que não sendo da terra, ainda não sabe com o que está a lidar! Aquela família é do pior! Por causa delas é que o marido saiu de casa! Também quem é que queria estar casado com um barril daqueles?! Tenha calma e se eu fosse a senhora, saía daqui e ia já ao Posto, perguntar realmente o que se passou! Olhe que também, aqueles lá em cima não são a esperteza em pessoa! Se calhar, falaram de um modo completamente diferente do que falaram com a senhora! É preciso ter isso em conta! Olhe que eles também não são de fiar...cada um puxa por si...

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