Um

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  — A gente devia ir até um bar comemorar.

A declaração enfática de meu amigo Niall Horan, com quem eu dividia um apartamento, não foi nada surpreendente. Ele estava sempre disposto a comemorar, mesmo as coisas mais insignificantes. Sempre considerei isso parte de seu charme.

— Sair pra beber um dia antes de começar num emprego novo com certeza não é uma boa ideia.

— Vamos lá, Liam.

Niall sentou no chão da sala do nosso novo apartamento, em meio à bagunça da mudança, e abriu seu sorriso irresistível. Fazia dias que só cuidávamos da arrumação, e ainda assim ele estava lindo. Com seu corpo esguio, cabelos claros e olhos azuis, Niall era o tipo de homem cuja aparência, quaisquer que fossem as circunstâncias, raramente era algo menos do que incrível. Isso me deixaria com raiva, se ele não fosse a pessoa que eu mais adorava no mundo.

— Não estou dizendo pra gente encher a cara.- Ele insistiu. — Só uma ou duas tacinhas de vinho. A gente pega o happy hour e volta pra casa lá pelas oito.

— Não sei se vou ter tempo.- Apontei para minha bermuda de ioga e minha camiseta de ginástica. — Depois que eu cronometrar a caminhada até o trabalho, vou pra academia.

— É só andar depressa e malhar mais depressa.- A expressão de Niall, com as sobrancelhas cuidadosamente curvadas em um arco perfeito, me fez rir. Nunca perdi a esperança de que seu rosto incrível aparecesse um dia em outdoors e revistas de moda do mundo inteiro. Qualquer que fosse sua expressão, ele era um arraso.

— Que tal amanhã, depois do trabalho?- Ofereci em troca. — Se eu conseguir sobreviver ao primeiro dia, aí sim vamos ter o que comemorar.

— Combinado. Hoje vou estrear a cozinha nova fazendo o jantar.

— Hã...- Cozinhar era um dos prazeres de Niall, mas não um de seus talentos. — Legal.

Afastando uma mecha de cabelo que caíra sobre seu rosto, ele me olhou com um sorriso.

— A gente tem uma cozinha de fazer inveja à maioria dos restaurantes. Não tem erro ali.

Não muito convencido, eu me despedi com um aceno, decidido a me esquivar da conversa sobre a cozinha. Desci para o térreo de elevador e sorri para o porteiro quando ele abriu a porta pra mim.
Assim que pus o pé para fora, fui envolvido pelos aromas e ruídos de Manhattan, que me convidavam a sair e explorar. Eu não estava apenas do outro lado do país em relação à minha antiga casa em San Diego — parecia estar em outro mundo. Duas metrópoles importantes — uma infinitamente amena e sensualmente preguiçosa, a outra pulsando como um organismo vivo carregado de uma energia frenética. Nos meus sonhos, eu me imaginava em um pequeno e charmoso prédio no Brooklyn, mas, por ser um bom garoto, acabei no Upper West Side. Se não fosse o Niall, eu estaria completamente sozinho em um apartamento enorme que custa por mês mais do que a maioria das pessoas ganha em um ano.

Paul, o outro porteiro, me cumprimentou tirando o quepe.

— Boa noite, senhor Payne. Vai precisar de um táxi esta noite?

— Não, obrigado, Paul.- Bati no chão com os amortecedores do meu tênis de ginástica. — Vou
sair pra caminhar.Ele sorriu.

 — Esfriou um pouquinho agora no fim da tarde. O tempo está gostoso.

— Me disseram pra aproveitar o mês de junho, antes que comece o calor de verdade.

— Um ótimo conselho, senhor Payne.

Ao me afastar da fachada envidraçada e moderna que de alguma forma não destoava da idade do edifício e da vizinhança, desfrutei da relativa tranquilidade da rua arborizada antes de chegar à agitação e ao trânsito intenso da Broadway. Eu ainda tinha esperanças de me adaptar rapidamente, mas por enquanto me sentia um falso nova—iorquino. Eu tinha um apartamento e um emprego, mas ainda não me sentia seguro o bastante para me aventurar no metrô, e não tinha me acostumado a acenar ostensivamente para os táxis. Enquanto caminhava, eu tentava não parecer impressionado e atônito, mas era difícil. Havia tanta coisa para ver e experimentar.
O estímulo sensorial era atordoante — o cheiro da fumaça dos escapamentos misturado com o da comida dos carrinhos dos ambulantes; os gritos dos camelôs se infiltrando na música dos artistas de rua; a impressionante variedade de rostos, estilos e sotaques; as maravilhas arquitetônicas... E os carros. Minha nossa. O fluxo frenético de carros, sempre grudados uns nos outros, era algo que eu nunca tinha visto na vida.
Havia sempre uma ambulância, uma viatura ou um caminhão de bombeiros tentando romper a torrente de táxis amarelos com o uivo eletrônico de sirenes ensurdecedoras. Fiquei impressionado com os ruidosos caminhões de lixo que se arremessavam em ruas estreitas de mão única e com os entregadores que encaravam a massa compacta de veículos, com prazos rigorosos a cumprir.
Os verdadeiros nova-iorquinos nem reparavam em tudo isso — a cidade para eles era familiar e confortável como um velho par de sapatos. Eles não viam as ondas de vapor escapando dos bueiros e saídas de ar com um encanto carregado de romantismo, nem pareciam notar quando o chão tremia sob seus pés com a passagem do metrô — ao contrário de mim, que sorria como um idiota e encolhia os dedos dos pés. Nova York era um caso de amor totalmente novo para mim. Eu estava embasbacado e não conseguia esconder.
Tive que me esforçar bastante para manter uma atitude indiferente enquanto me dirigia ao local em que ia trabalhar. Pelo menos em termos profissionais, as coisas estavam acontecendo da maneira como eu queria. Meu desejo era ganhar a vida com base em meus próprios méritos, o que significava começar por baixo. A partir da manhã seguinte, eu seria o assistente de Harry Styles na Waters Field & Leaman, uma das maiores agências de propaganda dos Estados Unidos. Meu padrasto, o magnata do setor financeiro Richard Stanton, não gostou nada da ideia — na opinião dele, se eu fosse menos orgulhoso, poderia trabalhar para algum amigo dele e colher os benefícios inerentes a esse tipo de proximidade.

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