Eu tentava não surtar. Nem fazer uma expressão mesquinha diante do presente do tio Nicolau, mas estava difícil.
Ele me deu um quebra nozes? É sério?
Ele é rico, milhares de ações no banco e outros negócios que valem muito dinheiro e ele vem e me dá um Quebra Nozes...
É horrível falar mal do presente que ele escolheu com tanto carinho... Mas... Quem dá um Quebra Nozes para uma garota de 18 anos?
--- Gostou? --- Ele me perguntou e não tinha palavras para falar o que tinha na minha cabeça naquele momento. Então só acenei com a cabeça para evitar que qualquer mal-criação saísse da minha boca. --- Ainda bem, a loja não aceita devolução.
--- Obrigada, eu adorei. Vai combinar com a decoração do meu quarto. --- Eu acho. Talvez dentro do baú onde ninguém poderá ver será um lugar excelente.
Meus primos não disfarçam e riem da minha desgraça. Fui a sobrinha que ganhou o pior presente, e sou a pior sobrinha por estar pensando mal do presente que meu tio de tão longe escolheu e me deu com amor.
Tinha que pensar: O que conta é o gesto de carinho.
Isso, pense positivo e esqueça que ganhou algo meio inútil.
O Quebra Nozes não era lá essas coisas. Na verdade nem sei como ele funciona direito isso. A noz vai na boca? Onde aperta o que? Sou uma garota do século 21, não do século 18.
---- Eu te ajudo, já que não vem com manual de instrução. --- sigo o Nicolau até a cozinha. Ele pega uma noz e coloca na boca do bonequinho. --- Este boneco é muito raro e valioso.
Ah claro, vou ver quanto custa na internet. Talvez posso vendê-lo, e ficar com o dinheiro.
--- Pode deixar vou tomar cuidado. --- Ele sorri.
--- Sei que sim. --- Ele abaixa o bracinho direito do boneco e a noz é cortada. --- Viu é fácil. --- Ele me deixa sozinha na cozinha e analiso o Quebra Nozes que não será tão importante assim na minha vida. Porém o boneco pouco útil até que tem uma pintura bonita, o casaco num vermelho vivo e brilhante, calça preta e alguns detalhes em azul. Além do chapéu preto, típico de um soldado 'das antigas'.
Deixo o quebra nozes na mesa da cozinha e sigo pra sala onde está a minha família.
--- Viram que vários ratos estão na casa? Precisamos fazer uma limpeza e acabar com essa praga --- Papai comenta. Esses ratos estavam sendo uma dor de cabeça, e nunca conseguimos pegar nenhum deles com a ratoeira. Só de imaginar aqueles bichinhos asqueirosos me dá ânsia de vômito.
--- Que nojo, depois do feriado iremos arrumar alguém para dar um fim nisso --- Mamãe diz indignada. Nada era pior do que ter ratos na casa em pleno feriado.
--- Como assim? Ratos? Isso é inadmissível --- Melina falou descrente e horrizada.
Não queria participar do assunto rato na casa, por isso peguei meu irmão no colo, Philip tem 3 anos e já é bem espertinho pra idade dele, e o levei para outro lugar.
--- Quero doce, Clara... -- Coloquei cuidadosamente ele sentado na mesa.
Me virei e fui pegar os doces no pote para meu pestinha favorito. Eu só ouvi um "crac"... Me virei, tomara que Philip não tenha tenha quebrado um copo ou algo pior, mamãe ficaria brava. Quando eu vi, o braço do meu quebra nozes estava quebrado e no chão.
Merda, Tio Nicolau ficaria triste.
--- Ele é meio feio --- meu irmão disse, eu estava furiosa com ele por ter quebrado algo que eu ganhei.
--- Por fora ele é feio, mas dentro sei que bate o coração de um Príncipe. --- peguei as peças e coloquei em cima do balcão.
--- Eu só tentei quebrar uma noz ---- para variar ele tinha escolhido a maior noz do cesto. E quebrou meu presente.
Eu só estava triste por não ter quebrado nem uma noz com o soldado que só tinha essa função e agora não a praticava direito.
--- Tudo bem, esqueça. --- tirei ele da mesa e dei uma bengala açucarada para ele.
Não queria brigar com ninguém na época de Natal. Devemos ficar calmos e perdoar, mas se fosse outra época do ano eu juro que esganaria meu pequeno e lindinho irmãozinho.
Fui com ele para a sala de estar onde minha família está reunida, comentando do que gostaram no Natal. Eu estava chateada demais, aquilo podia ser inútil mas eu ganhei e de acordo com o Nicolau era um presente bem caro.
--- Boa noite, pessoal. Bom Natal para vocês --- O relógio de pêndulo marcava 02:30. Estava tarde demais e meus olhos já estavam pesando, a cada piscada era um sonho diferente.
Vários "Boa noite, Clara", "Durma com Deus" e "Bom Natal para você também" foram ditos assim que fui para ir embora.
Voltei pra cozinha e peguei os restos mortais" do meu Quebra Nozes. Tentaria consertar ou vender as peças na internet.
--- O que vou fazer com você? --- Falei para o quebra nozes nas minhas mãos.
O que eu estou fazendo? Conversando com um brinquedo de madeira quebrado. Isso soou louco e esquisito.
Subi as escadas para me deitar, como eu estava cansada de ajudar a minha mãe a preparar as comidas e arrumar a casa para o Natal.
Cai na cama e fechei meus olhos. Estava cansada da mesmice de tudo, sempre o mesmo Natal, com as mesmas pessoas, com as mesmas comidas, mesmas piadas sem graça que os tios contavam, mesmas tias que te perguntavam: "E os namoradinhos?". Natal era para ser uma época de boas ações e alegria, mas para mim era mais um fardo que tinha que aguentar.
Eu queria aventuras no meu Natal.
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Quebra Nozes
FantasyUm clássico conto de Natal adaptado para o século 21. Mesmo Natal, mesmas pessoas, por que aquele ano seria diferente para Clara que sempre tem as mesmas expetativas e monotonia dos outros anos? Talvez porque seu tio a iria visitar. É aí que avent...