27 de setembro de 2015.
― Foi aqui que pediram um Eclipse? - a voz de Ramona ecoou pela cozinha do apartamento quando ela enfiou a cabeça para dentro do cômodo. - Sabia que te encontraria aqui.
Lá estava ele. Isaac Verucca. Ocupado com a mão na massa de alguma receita maluca, inclinado sobre a pia da cozinha, usando sua bermuda de correr preferida. Não era difícil de imaginar que ele estivesse na cozinha, já que passava mais tempo ali do que no próprio quarto. Isaac sempre teve muita energia acumulada dentro do seu corpo e, enquanto ia crescendo, encontrou maneiras diferentes de canalizá-la em atividades úteis.
Ele virou a cabeça para encarar a irmã, mas ela já estava caminhando em sua direção com um sorriso enorme no rosto. Não existia dia ruim no vocabulário de Ramona e, aquele, definitivamente era o contrário disso.
Eclipses totais da lua atraíam coisas boas. Ninguém nunca disse isso de verdade, mas Ramona achava que poderia muito bem ser a primeira e inventar as suas próprias superstições. Ela espiou o conteúdo da tigela que Isaac mexia com a colher de pau e torceu o nariz.
― O que é isso que você tá fazendo?
― Me passa o fermento - ele pediu, concentrado, estendendo a mão para ela. A garota entregou o potinho de fermento aberto em cima da pia, esperando para ser usado, e Isaac adicionou à mistura. - São os pães-de-mel da Ju pra hoje à noite. As esfihas já estão no forno.
Ramona assentiu, tentada a enfiar o dedo na maçaroca marrom e provar, mas sabia que o irmão ia começar a reclamar sobre como ela "não podia fazer isso" e blábláblá. Ela sempre ficava curiosa para experimentar as comidas da nova dieta da Julieta, até porque não conseguia acreditar que qualquer coisa pudesse ficar saborosa sem leite, sem ovos, sem porcaria nenhuma que fazia as coisas serem boas.
Ramona precisava de provas.
― Tem certeza que isso não vai ficar uma droga?
Isaac tentou não levar o ceticismo da irmã para o lado pessoal e apenas deu de ombros.
― Da última vez que eu fiz, ela gostou. De qualquer maneira, ela precisa comer na festa.
Havia apenas dois meses que Julieta descobrira ser alérgica à proteína do leite e, por causa disso, teve que mudar drasticamente seus hábitos alimentares. Agora ela passava um tempão lendo os rótulos dos produtos nos supermercados e ficava irritada por muitos deles não deixarem claro se continham ou não a "proteína maldita" na sua composição. Porque se tivesse e ela comesse, bem, certamente passaria mal de jeitos nem um pouco agradáveis.
― Deve ser uma merda não poder comer o que todo mundo come, ter que levar marmita pra todos os lugares - Ramona comentou, sempre sincera.
Isaac não poderia discordar disso. Até porque, além de todos os alimentos que eles sabiam que continham a proteína do leite, havia aqueles que podiam ou não contê-la, era sempre uma surpresa. Tipo a sardinha. E a salsicha. O que não faz o mínimo sentido, mas esse é o mundo em que vivemos.
Isaac gostava de cozinhar. Gostava muito de cozinhar. Então não era nenhum problema achar receitas na internet e montar o cardápio restrito da sua irmã de modo que ela não passasse o resto da vida só comendo alface.
Não que isso fosse um problema muito grande para Julieta. Digo, o alface.
― Vocês dois estão assim ainda? - Laura entrou na cozinha tentando prender um cordão no seu pescoço. Ela estava arrumada para sair (o que para Laura não deixava de significar simples), com o cabelo loiro preso em um rabo de cavalo. - O eclipse não pode simplesmente ser adiado porque vocês se atrasaram.
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Platônico
Ficção AdolescenteIsaac Verucca sempre esteve acostumado a dividir as coisas. Sendo o único homem de quadrigêmeos, lidar com as mulheres nunca foi um problema para ele - embora às vezes fique farto das suas irmãs intrometidas. Ele acabou de tirar a carteira de mo...